Capítulo 2: Caçada

            - É enorme...
            Um grupo constituído pelos Inner Dragon Kishi, Tuxedo Kamen e Sailor V se voluntariou para tentar recuperar o mais precioso tesouro que os últimos selenitas vivos tinham. O Ginzuishou. Esse mesmo cristal, porém, era a fonte de energia que Dark Angel, uma versão distorcida de Lucifer que viera de um universo onde o Reino Negro venceu a batalha contra o Milênio de Prata, escolhera para sustentar o portal que ligava o mundo das Senshi àquele de onde Dark Angel veio. Youmas já tinham invadido Tóquio, mas graças ao sacrifício de Sailor Pluto, eles não podiam deixar o Japão.
            Nenhum dos acompanhantes de Sailor V discordou do comentário dela. Diante deles, uma enorme estrutura formada, aparentemente, por um tipo de cristal negro protegia o portal que eles procuravam. O Ginzuishou estaria lá.
            - Se nós conseguirmos o Ginzuishou em pouco tempo, ainda poderemos alcançar o "Gin no Umi". - Ken informou.
            - Tentar entrar aí?!? - perguntou Sailor V. - Você tá louco?
            - Não é impossível. - Ryu falou, olhando para o cristal. - A minha    já achou o lugar menos reforçado da barreira.
            - Onde? - Akai perguntou.
            Ryu mexeu os ombros, e começou a caminhar junto à barreira, aproveitando-
se da destruição que ela causara aos prédios que estavam a menos de dez metros dela.
            Os outros começaram a seguí-lo, olhando cautelosamente ao redor.
            - Não é estranho? - perguntou Mamoru. - Eu achei que teríamos muito mais oponentes.
            - Mamoru-san tem certa razão, Ryu-kun. - falou Kyoko. - Nós cruzamos com menos de cinco patrulhas. Nenhuma delas perto do nível dos youmas que nos enfrentaram antes do portal se abrir.
            - Pra que questionar boa sorte? - perguntou Kitty. - Nós devíamos aproveitar a folga para acabar de uma vez com a missão.
            - É aqui. - Ryu falou, olhando para a barreira de cristal. Ele franziu a testa e se aproximou da estrutura.
            - Não parece diferente. - Ken falou, também se aproximando. O Kishi da Terra tocou o cristal com sua mão direita, cuidadosamente sentindo a superfície.
            Ryu fez o mesmo, fechando seus olhos para facilitar seu trabalho. Havia algo que estava deixando-o inquieto. Ele não conseguia isolar o que estava provocando o sentimento, mas ele não gostava nem um pouco. Especialmente porque ele normalmente estava certo quanto às suas intuições.
            Ele abriu os olhos de novo, agora mais intrigado que antes. O cristal era, sem dúvida, menos espesso e menos denso nesse local, mas a sensação de... erro que ele estava tendo graças à sua    estava maior que nunca.
            Então, os olhos dele se arregalaram.
            - Armadilha. - Ryu rosnou.
            Ken olhou para o kalyriano, surpreso. Então, a parede de cristal brilhou brevemente, depois começou a fluir para os lados, como se fosse água, abrindo um portal no meio da barreira.
            - O que...? - perguntou Ken, mas Ryu agarrou-o pelo braço e puxou-o, recuando até onde os outros heróis estavam. Quatro espadas, dois cajados e uma bengala foram colocados em guarda, e Sailor V se concentrou brevemente, formando uma luz na ponta do seu indicador direito.
            O cristal continuou se separando, até formar uma abertura grande o suficiente para um caminhão passar. No lado de dentro da barreira, um grupo enorme de youmas esperava.
            - Dragon Kishi. - um dos youmas falou, dando um passo para frente. - Mestre está convidando-os para uma visita.
            - Diga para ele pegar o convite dele e enfiar na porta dos fundos. - Kitsune respondeu, sorrindo.
            O youma rosnou algo incoerente, e saltou para cima de Kitty. A Dragon Kishi sorriu friamente, e cortou o ar na sua frente. O seu atacante caiu no chão com um corte fundo no peito.
            - Eu acho que Mercury Dragon já colocou nossa posição no assunto. - Ryu observou.
            A horda inteira de youmas avançou, gritando descontroladamente.
            Ryu saltou, mergulhando no meio dos atacantes, já golpeando com sua espada, e derrubando quase cinco dos monstros. Ele se abaixou em seguida, já sabendo que qualquer golpe que fosse direcionado para suas costas seria alto, provavelmente tentando acertar sua nuca. Olhando para cima, ele confirmou suas suspeitas ao ver o braço de um youma. Enfiando sua espada no que quer que estivesse atrás dele, o Dragon Kishi ficou satisfeito ao ouvir o urro de dor de mais um inimigo. Um dos seus oponentes, porém, teve a idéia de usar as garras do pé para atingi-lo, e Ryu xingou ao sentir um corte se formar nas suas costas. Sem pensar, ele girou, erguendo-se novamente, e cortou o youma que feriu-o, simultaneamente esmagando o pescoço de outro com um chute bem direcionado. Os youmas estavam se espalhando, e ele podia se mover mais livremente.
            Ken e Kyoko, os dois alvos mais fáceis do grupo mantinham suas costas encostadas uma na outra, de tal forma que nenhum dos dois ficaria vulnerável a ataques por atrás. Os youmas, porém, eram desorganizados, e facilmente derrotados com um ou dois golpes.
            Kitty, como Ryu, estava no meio da horda de ataque, movendo-se como uma dançarina. Para cada giro que ela dava, porém, um oponente caía. A espada dela estava coberta de sangue youma, e a Dragon Kishi já tinha vários ferimentos nos seus braços e pernas, mas não mostrava sinal de cansaço.
            Akai e Sailor V formavam outra pequena ilha no mar de youmas, a ruiva derrubando aqueles que se aproximavam demais, enquanto Sailor V soltava seus ataques naqueles mais distantes, algumas vezes ajudando Akai com os que estavam próximos. Os ataques de ambas eram eficientes e econômicos, mas era evidente que eram elas que estavam enfrentando as maiores dificuldades dentre todos os membros do grupo. Minako já não sentia mais seu braço esquerdo, enquanto os dois braços de Akai estavam banhados com o sangue da própria Dragon Kishi.
            Mamoru, por sua vez, estava se provando quase tão eficiente quanto Ryu ou Kitsune, também derrubando youmas com cada movimento que executava. Estranhamente, ele estava favorecendo o uso da sua bengala, tendo arremessado poucas rosas.
            Ao lado de Tuxedo Kamen, Ship também dava o melhor de si no combate, usando sua espada com eficiência. Era claro para um observador casual que ele não fora treinado com uma lâmina, mas a cada instante que passava, os movimentos dele se tornavam mais naturais. Dada a chance, Ship podia se tornar um dos melhores espadachins entre os selenitas.
            Pouco a pouco, porém, os oito guerreiros estavam perdendo terreno para os youmas, e o resultado da batalha estava se tornando claro. Tomando uma decisão, Ryu saltou e deu um chute giratório, acertando a face de um youma. Usando-a como apoio, o Dragon Kishi saltou por cima dos monstros que o cercavam, e gritou:
            - RECUEM!
            Ele caiu em cima de um dos oponentes de Akai e Minako, rapidamente ajudando-as a ganhar o espaço necessário para escapar. Os três foram os primeiros a correr, rumando para o meio dos prédios.
            Ship, Mamoru e Kitty começaram a correr numa rota paralela à barreira, olhando para trás algumas vezes até se certificarem que estavam mantendo uma certa distância dos seus oponentes.
            Kyoko e Ken correram na direção oposta àquela que Ship, Mamoru e Kitty tomaram, cientes que isso dividiria os youmas mais ainda.
            Ao invés de perseguir os heróis, porém, os youmas ficaram parados, como se esperando por algo. Então, três figuras saíram de dentro da barreira, que se fechou em seguida.
            Os três pareciam ser youmas mais poderosos que os outros, tendo feições humanas, mas, ainda assim, confiança nos olhos. Eles pareciam saber que podiam enfrentar qualquer coisa, e possuíam a certeza de que venceriam qualquer batalha.
            O primeiro deles deu um passo a frente, e falou, sua voz alta e forte:
            - Eu quero um terço das tropas comigo. - o youma parecia um homem comum, talvez um pouco mais alto que a média, exceto pelo seu cabelo curto e roxo e seus olhos amarelos. - Eu cuidarei de Endymion.
            - Como quiser, Amber. Eu cuido dos que foram para a esquerda. - falou a segunda youma, com cabelos ondulados brancos, que alcançavam até sua cintura, e olhos prateados. Ela, em seguida, começou a caminhar na direção que Kyoko e Ken foram, seguida por mais um terço das tropas presentes.
            - Ultima sempre foi arrogante. - Amber comentou, olhando para o último de seus companheiros. - Boa sorte, Stalker.
            - Não sou eu quem vai precisar de sorte. - falou o terceiro, que poderia se passar por um humano comum, com cabelo curto e escuro e olhos cinzentos, se não fosse pela sua pele azulada. - Mesmo que um kalyriano possa vir a ser uma boa presa.
            Sem dizer mais nada, Stalker começou a caminhar para a cidade, os youmas que não se agruparam nem com Amber nem com Ultima seguindo-o. Amber suspirou, e começou a caminhar na direção que Ship, Mamoru e Kitty foram.

            ****

            Ami respirou fundo, criando coragem para fazer o que não conseguiu pelos últimos dez minutos. Ela estava em pé na frente da porta da sala de jantar, onde sabia que as Senshi e os Kishi restantes estavam. Os "convidados" tinham sido direcionados por Haruka e Michiru para seus quartos, e Ami tinha certeza que eles não estariam ali.
            Respirando fundo novamente, ela abriu a porta, e entrou.
            Usagi e Makoto foram as primeiras a perceberem a presença da Senshi de Mercúrio, e ficaram em silêncio. Em pouco tempo, todos tinham notado Ami, e também pararam de falar, esperando pela notícia que sabiam que ela traria.
            Ami suspirou, e falou, sua voz alta o suficiente para todos ouvirem, pois ela duvidava que conseguiria repetir a si mesma:
            - Maury morreu.
            Makoto soltou um grito, e saltou na direção de Ami, parecendo que ia atacá-la. A Senshi de Mercúrio fechou os olhos, preparada para a dor que ela tinha certeza que viria... Ao invés disso, porém, ela sentiu os braços de Makoto envolvendo-a, enquanto a Senshi de Júpiter chorava no seu ombro, soluços causando convulsões no seu corpo. Os olhos azuis de Ami se abriram de novo, e ela suspirou, murmurando algo para sua amiga.
            - Minha culpa... - Usagi falou, antes de fechar os olhos, tentando conter as lágrimas que escorriam. Michiru e Hotaru imediatamente estavam perto dela, tentando consolá-la.
            A pior de todas reações, porém, foi a de Chris. Ele correu para fora, habilmente evitando Makoto e Ami, que ainda estavam na porta. Rei e Andrea perguntaram-se por um instante se deviam seguí-lo, até ouvi-lo gritar. Qualquer dúvida que as duas tivessem desapareceu, e elas correram atrás de Chris, seguidas por Haruka.
            O Kishi de Saturno estava ajoelhado ao lado do corpo de Maury, gritando para que ele levantasse. Andrea ficou com os olhos fixos no corpo do Kishi de Urano, enquanto Rei correu para perto de Chris, tentando acalmá-lo.
            Mizuno-sensei, sem aguentar a cena que estava presenciando, virou-se para a cidade de Tóquio. Ela vagamente notou que a cidade estava longe o suficiente para que os monstros... youmas, como as Senshi chamavam, não causassem problemas.
            A médica jogou um rápido olhar na direção do corpo de Maury, e viu que mais membros do grupo de heróis tinham vindo para conferir o estado de Maury. A garota mais alta, Makoto, parecia desesperada. Não podia ser fácil, Mizuno-
sensei percebeu. As Senshi, as grandes heroínas que salvaram a Terra inúmeras vezes, não passavam, na verdade, de garotas que deviam estar se preocupando com estudos e namorados. Os Kishi, pelo que ela via, eram a mesma coisa, e ela não duvidava que a grande maioria dos aliados das Senshi estivessem na mesma situação. Mesmo já tendo visto uma pessoa perder sua vida inúmeras vezes, Mizuno-sensei tinha certeza que não era justo que um daqueles que fizeram tanto pelas pessoas morresse.
            - Não é fácil, é?
            Mizuno-sensei olhou para o lado, vendo que Ten'ou Haruka, ou Sailor Uranus, estava ao seu lado, também olhando para a distante cidade de Tóquio. Ela parecia, a médica admitiria, um homem. Cabelo curto, num loiro escuro, olhos verdes e mais alta que a maioria das garotas do mundo, Haruka facilmente era confundida com um garoto. O relacionamento entre ela e Michiru apenas ajudava a ocultar seu gênero verdadeiro, assim como o prazer que ser confundida com um homem trazia para à loira.
            - Não, não é. - Mizuno respondeu, balançando a cabeça.
            - Eu sei como é não servir para a tarefa que lhe foi designada. - Haruka comentou, suspirando.
            - Como assim?
            - Quase dois anos atrás, eu e Michiru recebemos a missão de encontrar os três Talismãs e formar o Graal, com o objetivo de impedir que o mundo acabasse. Os Talismãs estava presos ao Heart Crystal de pessoas com alma pura. O problema, sensei, era que quando o Heart Crystal é retirado de alguém, essa pessoa morre.
            - Vocês tinham que matar três pessoas de coração puro.
            - Un. - Haruka fez que sim. - Usagi e as Inner Senshi não concordavam com a nossa estratégia. Elas nos confrontaram para que não matássemos as pessoas. No final... - ela suspirou. - No final, dois Talismãs estavam comigo e com Michiru, e o terceiro, com Setsuna.
            - Setsuna?
            - Sailor Pluto. - Haruka esclareceu. - Ela era a Guardiã do Tempo... e morreu na batalha que abriu aquele portal. - a Senshi apontou para Tóquio.
            - So ka.
            - De qualquer jeito, nossos Heart Crystals foram arrancados de nós, e os Talismãs, liberados. Só que as pessoas não tinham que morrer para conseguir os Talismãs. Usagi estava certa o tempo todo.
            Mizuno-sensei ficou em silêncio, sem ter certeza de como devia responder.
            - Mais tarde, Sailor Saturn acordou. - Haruka falou. - Eu e Michiru queríamos matá-la para impedir o Silêncio, mas Usagi conseguiu vencê-la sem sequer feri-la. Ainda depois disso, quando Galaxia atacou, eu e Michiru matamos Pluto e Saturn para conseguir pegar Galaxia de surpresa... e não funcionou. Usagi, que a enfrentou de frente, venceu. Eu e Michiru nunca estivemos realmente certas quando lutamos. Nós sempre falhamos... felizmente, suponho.
            - Acho que eu entendo. - Mizuno falou.
            - Me preocupa, sensei, que Usagi não estará lá para vencer a batalha dessa vez. - Haruka desabafou. - Me preocupa muito. Mas não podemos fazer nada em relação a isso. - ela sorriu um pouco. - Usagi-chan parece confiar em Ryu e no seu grupo. Acho que eles serão o suficiente.
            - Eles têm que ser.
            Haruka e Mizuno-sensei viraram para a fonte da voz.
            - Usagi-chan?!? - as duas perguntaram ao mesmo tempo.
            - Ryu-kun, Mamo-chan e os outros TÊM que ser o suficiente. - a loira reafirmou, olhando para Tóquio. - Ou nós realmente seremos derrotados.
            Haruka fez que sim, suspirando.

            ****

            Ken olhou para trás, e xingou alto. Kyoko, ouvindo a profanidade que seu companheiro falou, também arriscou uma rápida olhada para trás. Um xingamento idêntico ao do Dragon Kishi da Terra saiu dos lábios da loira quando ela viu o grupo de youmas que estava perseguindo-os.
            Os perseguidores corriam desorganizados, e os dois Dragon Kishi, acostumados com o tipo de perseguição em que estavam, rapidamente identificaram-
nos como bucha de canhão. Mesmo assim, apenas a bucha de canhão seria o suficiente para subjulgá-los.
            - Sem poderes, - Ken falou. - nós não temos chance contra aquele bando.
            - O que fazemos? - perguntou Kyoko.
            - Eu acho que eu tenho uma idéia. - Ken comentou, olhando para sua esquerda. A cidade que estava naquela direção era, claramente, um distrito comercial.
            - Diga.
            - Num minuto. - Ken falou. - Quanto nós temos de vantagem nos youmas?
            - Uns trezentos metros. - Kyoko aproximou, olhando para trás.
            Ken sorriu. Em seguida, ele fez uma curva, começando a correr para dentro da cidade.
            - EI! - Kyoko gritou. - Ryu já foi para a cidade! A idéia é espalhar, lembra?!?
            - Nós já estamos longe o suficiente. - Ken falou. - Vamos!
            Kyoko suspirou, e começou a correr atrás do seu companheiro.
            - QUAL é a idéia?!? - ela perguntou de novo.
            Kazeno Ken apenas sorriu, e apontou para frente. Kyoko olhou naquela direção, e viu que ele estava indicando... um posto de gasolina?!? Então, um sorriso apareceu no rosto dela.
            - Ahhh... So ka... - ela falou.
            Sem precisar conversar nem combinar nada, os dois aumentaram a sua velocidade, querendo tornar ainda maior a distância entre eles e os youmas.
            Pouco depois, eles tinham alcançado o posto. Sem falar nada, Ken apontou para a pequena loja de conveniências que ficava no fundo do posto. Kyoko fez que sim, e correu para dentro, enquanto o Kishi da Terra começou a bater nas bombas de gasolina com seu cajado.
            Quando Kyoko saiu da loja, carregando uma caixa de fósforos, o Kishi já tinha quebrado duas bombas, que estavam deixando a gasolina jorrar numa velocidade maior que seria possível para as mangueiras. Vendo a intenção de Ken, Kyoko começou a atacar as bombas restantes.
            - Acho que chega. - Ken falou, notando que o combustível estava alcançando a rua. - Vamos.
            Os dois correram para fora do posto, Ken já preparado para acender os fósforos. Eles pararam logo fora do alcance da gasolina, respirando pesado. Então, Ken olhou para Kyoko, e falou:
            - Corre.
            - Não.
            - Eles não podem suspeitar da armadilha. - Ken elaborou. - Corre pra eles pisarem na gasolina.
            Kyoko se preparou para discordar, mas Ken interrompeu-a:
            - É uma ordem.
            A loira suspirou. Ryu tinha, durante a viagem para derrotar Garot, estabelecido uma cadeia de comando nos Dragon Kishi, se baseando, principalmente, na experiência pessoal de cada um deles. Ken era o segundo no comando, logo depois de Ryu. Depois dele, era Akai, seguida por Kyoko, Ship e Kitsune. Kitty, Ryu explicara, era boa lutadora, mas não sabia tomar decisões para o grupo inteiro. Xingando mentalmente, ela fez que sim:
            - Hai. - e correu.
            Ken observou por alguns segundos, depois caminhou até a parede do prédio vizinho ao posto, tentando manter-se fora do arco de visão dos youmas. Ele começou a ouvir gritos e rugidos, e sabia que os youmas estavam se aproximando. O que ele tinha que fazer, ele sabia, era soltar um fósforo quando o maior número possível de youmas estivesse na gasolina. Felizmente, eles estavam desorganizados, numa corrida entre eles mesmos para ver quem alcançaria Kyoko e Ken antes. Sem dúvida, estariam num grande grupo.
            Então, o primeiro youma entrou na gasolina. Ele piscou, e olhou para o chão, confuso. Menos de dois segundos depois, quase todos estavam lá. Ken sorriu malignamente, e acendeu um fósforo, largando-o na trilha de combustível que terminava perto do seu pé. E ele correu.
            Os youmas olharam para ele, surpresos com a proximidade de uma de suas vítimas. Antes, porém, que eles pudesse pensar em correr atrás dele, o chão sob seus pés pegou fogo, e o posto explodiu, envolvendo-os em chamas.
            Os gritos, antes brados de guerra, se tornaram urros de dor, enquanto inúmeros youmas morriam sob a ação das chamas.
            Kyoko, que estava esperando por Ken a menos de uma quadra dali, olhava para a cena com satisfação. Ela e o Kishi da Terra só teriam que terminar com os sobreviventes, depois ir para o templo Hikawa, que era o que Ryu chamava de "último ponto de encontro", ou seja, era o local onde eles se encontrariam se o grupo se separasse.
            - Não disse que eu tinha uma idéia? - perguntou Ken, se aproximando.
            - Eu tenho que admitir, Kazeno, essa idéia funcionou. - Kyoko falou, ainda observando as chamas. Aparentemente, não haviam sobreviventes. - Perda total por parte deles. Agora, ISSO é incrível. - ela comentou.
            - Eu sou obrigado a discordar. - Ken falou, apontando. - Olhe.
            No meio das chamas, uma... garota?! Não, pensou Kyoko, o cabelo dela não está pegando fogo, mesmo no meio das chamas. Na verdade, parecia haver uma AURA de fogo ao redor dela...
            - Ela controla o fogo. - Ken observou, ecoando os pensamentos de Kyoko. Ele pegou o cajado das suas costas, onde ele amarrara no posto, e se colocou em guarda. Sem saber o que fazer, Kyoko imitou os movimentos do seu companheiro.
            - Não seria melhor correr? - a loira perguntou.
            - Seria, mas nós temos que tirá-la do nosso rastro mais cedo ou mais tarde. Não há nada como o presente, ne?
            Kyoko, ainda com algumas dúvidas assombrando sua mente, fez que sim.
            A youma saiu do meio das chamas, mas ainda tinham uma aura flamejante envolvendo-a. Ela caminhava lentamente, com uma confiança nos seus movimentos que quase fez com que Kyoko mudasse de idéia quanto à sua decisão de enfrentá-
la.
            Ela parou a menos de quinze metros dos dois Kishi, sorrindo friamente.
            - Eu sou Ultima. - ela declarou, deixando que sua aura desaparecesse. Contrastando com a aura flamejante que estivera envolvendo-a pouco antes, Ken notou que ela tinha olhos prateados e cabelos brancos, que alcançavam até sua cintura. Ela estava vestindo uma versão mais prática do uniforme que os generais do Reino Negro usavam, mesmo que os dois Kishi soubessem disso apenas pelas descrições das Senshi. O uniforme não tinha mangas nem luvas, e era negro ao invés de cinza, com detalhes em vermelho. - E eu estou aqui para levá-los como prisioneiros para a representante de Dark Angel-sama.
            - O quê? - perguntou Ken, sorrindo sarcasticamente. - Não vai dizer para nos rendermos.
            A youma apontou para trás:
            - Eu suponho que aquilo seja um sinal da sua opinião nesse assunto.
            - Então, Ultima-chan, o que está esperando? - perguntou Kyoko, se afastando de Ken. Se mantivessem-se distantes um do outro, Ultima não arriscaria mandar tudo que tinha num só ataque.
            - Curioso. - Ultima comentou. - Eu não creio que os Dragon Kishi do meu universo lutariam sem poderes.
            - Bem vinda ao nosso mundo. - Ken e Kyoko responderam ao mesmo tempo.
            Ultima soltou uma risada sinistra, depois ergueu sua mão direita, que pegou fogo em seguida. Sem dizer nada, ela arremessou a bola de fogo em Ken.
            O Dragon Kishi saltou para o lado, lembrando-se das sessões de treino contra Akai. Outro treinamento que Ryu gostava era fazer com que os Dragon Kishi lutassem entre si, tanto em grupos quanto individualmente. Houve uma vez onde ele até fez com que cada um lutasse sozinho contra o resto do grupo. Nenhum dos Dragon Kishi conseguiu durar mais que vinte minutos no combate, o recorde sendo do líder dos Dragon Kishi.
            Ken voltou sua atenção para a realidade no exato momento que Ultima disparou outro ataque na direção dele. Ele deu dois passos para o lado, e resistiu à tentação de seguir o ataque flamejante com os olhos enquanto este passava pela sua esquerda.
            Ultima soltou um grito, e Ken sorriu de leve. A youma obviamente tinha se esquecido de Kyoko. Mesmo assim, a surpresa dela durou pouco. Quase imediatamente, ela virou-se para a Dragon Kishi, e apontou sua mão para ela. Kyoko mal conseguiu se esquivar da rajada de fogo que saltou da palma de Ultima.
            Ken correu e atacou com seu cajado, acertando Ultima. Dessa vez, porém, ela estava preparada, e virou-se numa velocidade que surpreendeu-o, agarrando a arma do Dragon Kishi.
            Agindo por puro instinto, Ken largou seu cajado, que pegou fogo no instante seguinte:
            - Kuso! - o Dragon Kishi exclamou.
            - Eu acredito, - falou Ultima. - que talvez eu não devesse me controlar tanto.
            O ar ao redor de Ken explodiu em chamas, e ele gritou. Os olhos de Kyoko se arregalaram, e ela saltou em cima dele, derrubando-o no chão. O fogo, aparentemente, não estava nele, mas sim, no ar ao redor dele. Kyoko enfiou a mão num dos bolsos da sua calça, e tirou um canivete, a lâmina saltando para fora.
            - Kyoko...? - Ken perguntou, confuso. A loira, então, agarrou o rabo-de-
cavalo dele e cortou fora. - QUE VOCÊ...?!? - ele olhou para o que antes era seu rabo-de-cavalo. Estava pegando fogo. - Oh.
            Então, ele pegou Kyoko pelo braço e saltou. Ela soltou um grito surpreso, até ver mais uma rajada de fogo destruindo o asfalto onde eles estava sentados pouco antes.
            - Estranho. - Ken comentou, brevemente passando a mão na sua cabeça. A falta do peso do rabo fez que o que sobrou do seu cabelo arrepiasse um pouco.
            - Talvez você deva pensar nisso mais tarde. - Kyoko sugeriu, saltando para longe do seu companheiro de equipe.
            - OUSAM ME IGNORAR?!? - Ultima urrou, atacando novamente.
            Ken fechou os olhos brevemente, respirou fundo, sua mente voltando para o Milênio de Prata, quando Silver derrotou Kasei. Os olhos verdes do Dragon Kishi se fixaram na youma, considerando se o plano funcionaria. Moon Dragon usou seus próprios poderes para se proteger naquele dia...
            Então, a decisão foi tomada por ele. Ultima soltou uma rajada de fogo maior que as anteriores, larga demais para que ele pudesse se esquivar. Ken respirou fundo, e correu para dentro das chamas, erguendo sua camiseta sobre sua cabeça, e cobrindo o rosto com seus braços.
            - KEN! - Kyoko gritou.
            Os olhos de Ultima se arregalaram quando ela viu o Dragon Kishi sair do meio das chamas, sua camiseta já tendo sido desintegrada enquanto ele estava no fogo. Ken acertou um soco com toda sua força, atingindo a youma no nariz. Ultima caiu para trás, suas mãos cobrindo seu rosto. Ken caiu de joelhos no chão, respirando pesado.
            Kyoko viu a oportunidade surgir, e saltou, erguendo seu cajado. Ela girou a arma duas vezes, depois golpeou num arco direcionado para o crânio de Ultima. Ela sentiu a madeira acertar alguma coisa, e respirou aliviada, fechando os olhos.
            Então, a dor veio.
            - KYOKO! - Ken gritou.

            Ultima sorriu malignamente, ainda segurando o cajado de Kyoko um pouco acima do seu rosto. A madeira estava queimando, e chamas cobriam o corpo da Dragon Kishi de Vênus, que gritava de dor.
            Então, a youma soltou o cajado, e as chamas sumiram. Kyoko caiu no chão, mal respirando, sua pele coberta de queimaduras.
            Ken correu para perto de Kyoko, gritando o nome dela. Então, ele percebeu seu erro. Antes que ele pudesse fugir, porém, ele sentiu um golpe acertando suas costelas esquerdas. Segurando um gemido, ele rolou para o lado, instintivamente levando suas mãos para o ferimento.
            E sentiu uma mão agarrá-lo no pescoço. Ele abriu os olhos a tempo de ver chamas envolverem Ultima. Futilmente, ele agarrou o punho da youma com suas mãos, tentando forçá-la a largá-lo.
            Cinco longos segundos de dor se passaram, e depois, nada.

            ****

            - Por aqui, por AQUI! - gritou Kitsune, subitamente dobrando outra esquina. Silenciosamente, Ship e Mamoru seguiram-na, esperando ter tomado a decisão certa.
            Eles correram por quase meia hora ao redor da barreira de cristal antes de entrar na cidade. A tropa youma seguia-os sem hesitar, e os três heróis tinham menos que quinhentos metros de vantagem sobre seus perseguidores.
            A idéia inicial, a de fugir até que os youmas desistissem da perseguição, logo se provou ineficiente. As criaturas, aparentemente, podiam perseguí-los por dias sem parar.
            - Eu não me lembro de youmas sendo tão insistentes! - rosnou Mamoru, olhando para trás brevemente, e confirmando que seus inimigos não tinham sido despistados pelas muitas curvas que o grupo fez.
            - Acredito que a motivação seja forte! - Ship respondeu, ainda tentando dominar a arte do correr com uma espada presa às suas costas. Ryu e Kitsune faziam parecer tão fácil, ele pensou.
            Kitty sorriu friamente quando a sua meta alcançou seu campo de visão. Ela olhou para as janelas dos prédios, confirmando que a eletricidade ainda funcionava.
            - Vamos pra lá! - ela gritou, apontando.
            Mamoru e Shippu olharam para a direção apontada, e piscaram surpresos:
            - O metrô?!? - questionou Mamoru.
            - So ka... - Ship falou, descendo as escadas que levaria para a estação de metrô. - A eletricidade ainda está funcionando...
            - Uma volta no metrô deve ser o suficiente para despistá-los. - observou Kitsune, saltando por cima da roleta. Mamoru e Ship fizeram o mesmo, e o trio desceu mais escadas, finalmente chegando à linha.
            Kitty olhou para o relógio na parede, depois para os horários apresentados num pôster.
            - Três minutos. - ela informou. - Com sorte, os youmas vão demorar para perceber onde estamos...
            O som de algo quebrando chamou a atenção dos três, que viraram-se para as escadas a tempo de ver a roleta que eles evitaram sendo arremessada na direção deles. Sem falar nada, eles se espalharam um pouco, deixando que o projétil passasse pelo meio deles, acertando a parede do túnel.
            - Ou não. - Mamoru comentou, se preparando para lutar.
            Kitsune olhou novamente para o relógio, depois para o grande grupo de youmas que descia as escadas. Eles poderiam até vencer, mas as chances eram remotas demais...
            - Por aqui! - Ship falou, agarrando o braço de Kitty, e saltando para os trilhos do metrô.
            - SHIP! - Kitty gritou, surpresa. Sem dar atenção ao grito, o Kishi de Júpiter começou a correr pelo túnel do trem.
            Kitsune hesitou, mas começou a seguir seu companheiro de equipe ao ver que Tuxedo Kamen estava acompanhando-o. Xingando para si mesma, a Kishi alcançou Shippu:
            - O trem vai passar em dois minutos!
            - Eu SEI! - ele falou. - Essa é a idéia!
            Ao dizer isso, ele mudou sua direção sutilmente, passando a correr próximo à parede do túnel. Sem saber o que fazer, os outros dois seguiram-no, constantemente olhando para trás, procurando youmas ou o trem que iria atropelá-
los.
            Os rugidos dos youmas gradualmente foram engolidos pelo som do trem que se aproximava. Ship respirou fundo, e aumentou sua velocidade o máximo que podia. Kitty e Mamoru acompanhavam-no sem problemas, ambos estando em melhor forma que o Kishi de Júpiter.
            Então, urros de dor ecoaram pelo túnel.
            - Os youmas...! - Mamoru gritou, para que pudesse ser ouvido.
            - Hai! - Shippu fez que sim, sem se virar. - Aposto que boa parte foi atropelada pelo trem!
            O túnel ficou claro, e Ship olhou para trás para confirmar: O trem se aproximava, seu farol iluminando os três heróis.
            - Saltem assim que puderem! - Ship gritou.
            Os seus dois companheiros gritaram algo afirmativo, e o trem passou por eles, quase levando-os consigo.
            Kitsune foi a primeira a saltar, seu treinamento permitindo que ela se agarrasse em uma janela aberta no primeiro vagão. Ela gemeu um pouco com o esforço, mas conseguiu puxar-se para dentro da janela, rolando no chão imundo do trem.
            Mamoru foi pouco depois, conseguindo pular para o teto de um dos últimos vagões, onde ele se segurou. Ele olhou para trás, preocupado com Ship, e seu chapéu e máscara foram levados pelo vento. Ignorando isso, Tuxedo Kamen começou a rastejar para o fim do trem, rezando para que Shippu tivesse conseguido entrar no veículo.
            - ME AJUDE!
            Ele piscou, e olhou para a lateral direita do trem. Ali, pendurado por uma só mão em uma das portas do vagão, estava Ship, olhando desesperadamente para cima.
            Suspirando aliviado, o príncipe alcançou o outro braço do Kishi de Júpiter, e puxou-o para cima do trem com relativa facilidade. Shippu respirou fundo algumas vezes, aparentemente para se acalmar, depois olhou para Mamoru:
            - Arigato.
            O príncipe apenas fez que sim, olhando para trás. Qualquer youma que tivesse sobrevivido estaria quilômetros atrás deles, agora.
            Respirando aliviado, Ship relaxou um pouco, procurando por um jeito de entrar no vagão. Depois de alguns segundos de busca, ele avistou uma pequena escotilha, que estivera cuidadosamente disfarçada como parte do teto metálico.
            Ele cuidadosamente rastejou até ela, e examinou-a. Ship finalmente encontrou o lacre que procurava, e abriu-o. A tampa de metal caiu para dentro, deixando um buraco no teto do vagão.
            - Mamoru! - ele chamou, sorrindo. - Achei um jeito de... - o Kishi de Júpiter nunca terminou sua frase, seu corpo sendo arremessado para frente com a parada brusca do trem.
            Ele ouviu Mamoru xingar alto, antes que seu corpo atingisse algo duro e afiado. Involuntariamente, um grito escapou da sua boca. Ignorando os protestos do seu corpo, Ship abriu seus olhos, vendo que tinha acertado uma parte do asfalto que afundara no exato momento em que o trem estivera passando. O primeiro vagão tinha sido completamente destruído, toneladas de concreto tendo caído sobre ele.
            O Kishi tossiu, e não ficou surpreso ao ver sangue pintar o metal que estava a poucos metros da sua boca. Respirando fundo, ele rolou para a beira do teto, e deixou-se cair, desajeitadamente aterrissando de costas. Ele fechou os olhos, e ficou ali, parado, por alguns segundos, tentando recobrar seu fôlego.
            Então, Shippu abriu os olhos. A primeira coisa que ele viu, foi uma mão. Uma mão de mulher, ele logo concluiu, julgando pelo tamanho. Rolando, ele ficou debruçado no chão, e lentamente se ergueu com seus próprios braços.
            A mão, ele notou, não se mexia. E estava conectada a um braço.
            Estava ficando difícil pensar, Ship percebeu. Ele estava entrando em choque. Os seus olhos seguiram o braço, chegando a um corpo. Uma camisa de seda azul vestia o corpo, que estava soterrado do peito para baixo. O Kishi piscou algumas vezes, e olhou para o pescoço e a cabeça que estavam ligados ao tórax... O cabelo da garota era longo e azul. A boca dela estava aberta, com sangue escorrendo pelo canto esquerdo do lábio, descendo pela sua face... A cabeça da garota estava caída, sem apoio para mantê-la no mesmo nível que o resto do corpo. Os olhos dela eram azuis, e estava olhando sem vida para uma das paredes do túnel...
            A mente de Ship vagamente reconheceu a garota como sendo Tatsumaki Kitsune, a Mercury Dragon. Ele franziu a testa. O que Kitty estava achando de tão interessante na parede? Ship olhou para a mesma direção que a Dragon Kishi parecia estar olhando, mas não viu nada de especial.
            - Acorda, Kitty. - ele tentou falar, mas saiu como um suspiro. A garota não respondeu.
            - Ship? - chamou Mamoru, que se aproximava cambaleando. Aparentemente, ele caiu para fora do trem com o impacto. O príncipe notou os dois, e gritou. - KITTY! SHIP! - ele correu até eles, e checou o pulso de Ship, suspirando aliviado.
            - Ela não quer acordar... - Ship murmurou, não olhando para nada em particular. Ele sequer se lembrava o que ele fazia deitado no chão de um túnel, olhando para Kitty.
            Os olhos de Mamoru se arregalaram, e ele colocou dois dedos contra o pescoço de Kitsune, procurando por um pulso. Em seguida, ele balançou-a algumas vezes, depois recuou dois passos, horrorizado. Ship, por sua vez, franziu a testa. Mamoru-san devia ajudar Kitsune... Afinal, um cavalheiro tinha que ajudar uma dama ferida, não? Quer dizer, Kitty estava sangrando, então ela estava ferida... A mente de Shippu ficou debatendo a veracidade dessa afirmação por alguns segundos, sem prestar atenção em mais nada.
            De repente, o chão pareceu ficar vivo, avançando sobre Mamoru como uma onda. O príncipe gritou, mas não conseguiu se esquivar. Ele foi prensado contra a parede, e seus olhos se arregalaram por um instante, antes de se fecharem.
            A montanha de concreto que soterrava o trem se abriu, permitindo a passagem de uma figura com olhos amarelos e cabelos roxos. Ele fez um gesto com sua mão direita, e as pedras que prendiam Tuxedo Kamen contra a parede caíram no chão, novamente inanimadas.
            Amber olhou para os três heróis presentes, seu olhar terminando em Kitty. Ele suspirou:
            - Parece que os cientistas terão mais um corpo de Dragon Kishi para brincar...
            A mente cansada de Ship finalmente entendeu o que acontecera, mas ele desmaiou antes que pudesse gritar.

            ****

            Kano Akai era a Dragon Kishi de Marte, mesmo que, no momento, ela não tivesse os poderes que vinham com o título. As responsabilidades que acompanhavam seu alter ego, porém, estavam presentes, e, não pela primeira vez nem pela última, ela se perguntou por que estava fazendo o que fazia. Sem poderes, ela tinha a perfeita desculpa para não participar de confronto algum. Porém, ao invés de escapar com a maioria dos habitantes do Japão, ela estava sentada contra uma parede, rezando para que seus perseguidores não encontrassem ela ou seus dois companheiros.
            Olhando pela única janela presente no minúsculo apartamento que os três invadiram, Satori Ryu procurava por sinais da aproximação dos seus inimigos. Ele não estava acostumado a ser caçado, normalmente sendo o caçador, mas Ryu ainda tinha experiência suficiente para saber que qualquer esconderijo, por mais perfeito que fosse, não duraria para sempre.
            A única dos três fugitivos que não conseguia ficar parada por mais que cinco minutos era Aino Minako, conhecida tanto como Sailor V quanto como Sailor Venus. Ryu tinha dito para ela reverter sua transformação, sem se incomodar em explicar porque. Ela, é claro, sabia a razão: Senshi eram mais fáceis de serem rastreadas que humanas. Mesmo assim, a loira pensou, ele podia ter dito isso.
            - Por que mesmo nós estamos fugindo? - Akai perguntou, quebrando um silêncio que durara quase trinta minutos.
            - Porque nós precisamos de um plano para enfrentar aquele número de youmas. - Ryu respondeu, sem desviar seus olhos da janela. - E porque nós precisamos estar no templo Hikawa em algumas horas, e o descanso será bom. - para reforçar seu argumento, ele apontou para o relógio na parede do apartamento. Eram dez horas da noite.
            - Mas... - Minako começou, mas Ryu interrompeu-a:
            - Eles nos acharam.
            As duas guerreiras caminharam até a janela onde Ryu estava, e olharam por ela. Um grupo de youmas estava lentamento se aproximando pelas ruas, com um único humanóide de pele azul alguns passos à sua frente.
            - Qual é o plano? - perguntou Minako, olhando para seu... ela fez o equivalente mental de mexer os ombros, e continuou... seu namorado.
            - Não tenho idéia. - Ryu admitiu.
            Minako suspirou, e alcançou a caneta que permitira que ela se tornasse Sailor V.
            - Não. - Akai murmurou. A loira, que já tinha erguido sua caneta, piscou:
            - Nani?
            - Não se transforme. - Akai elaborou. - Enquanto nenhum líder youma te ver transformada, eles acreditarão que você não tem seus poderes.
            - Akai tem razão. - Ryu concordou.
            Minako abriu a boca para responder, mas desistiu, suspirando e guardando sua caneta em seguida. Ela olhou para a janela novamente, e perguntou:
            - O que vamos fazer?
            - Nosso tempo de planos está acabando. - Ryu comentou. - Estou aberto a sugestões.
            - Eu - Akai falou repentinamente. - tenho um plano.

            ****

            Stalker olhou para cima, franzindo a testa. A noite estava estrelada, uma vez que as nuvens que haviam coberto a cidade durante o dia tinham ido embora. Mesmo assim, chovia.
            Intrigado, ele acelerou o passo, se distanciando dos youmas que estavam acompanhando-o. A chuva parou. Seus olhos se arregalaram, e ele se virou para gritar um aviso para os outros youmas, quando um vulto saltou de uma das janelas do primeiro andar. A figura tinha algo em suas mãos que refletia a luz da Lua, provavelmente metálico.
            O objeto metálico moveu-se bruscamente, partindo alguns dos cabos metálicos que ficavam sustentados por pilares de concreto, mas acompanhavam as ruas.
            A figura, Stalker finalmente notou, era um garoto. Ele tocou o chão antes que os cabos metálicos, e saltou novamente, dessa vez para fora da larga poça que havia se formado sob a tropa youma.
            Pouco depois, os cabos partidos tocaram o chão molhado, e os youmas gritaram, eletricidade correndo por eles. Apenas três das muitas criaturas sobreviveram, todas ligadas ao controle e manipulação da eletricidade.
            - Impressionante. - Stalker disse, olhando para o garoto. Ele podia vê-lo agora, e imediatamente reconheceu as feições de Silver. Exceto por uma cicatriz na sua face e o cabelo comprido, amarrado num rabo-de-cavalo, aquele era o mais jovem Dragon Kishi da Lua. Os olhos vermelhos e a expressão fria não podiam pertencer a mais ninguém. - Você é Silver, não?
            - Eu fui Silver. - Ryu respondeu neutramente. - Hoje, eu sou Ryu. Satori Ryu.
            Stalker fez que sim:
            - Eu sou conhecido como Stalker. Meu nome verdadeiro... - o youma riu. - Meu nome verdadeiro só será dado para aquele que me matar.
            - Um youma que se incomoda em parar para conversar. - Ryu observou. - Isso é raro.
            - Eu não sou apenas youma. - Stalker explicou. - Sangue de inúmeras raças corre em minhas veias.
            Ryu fez que sim.
            Naquele momento, Minako e Akai saíram correndo pela porta do prédio onde estavam se escondendo:
            - Pegamos eles?!?
            - Quase todos. - Ryu respondeu, colocando sua espada em guarda. - Tentem derrubar aqueles três. Eu cuido de Stalker.
            - Confiante, não? - o youma perguntou, abrindo sua mão direita. Uma espada cristalina se formou lá, com um brilho.
            - Não é uma qualidade ruim. - Ryu retrucou, sorrindo cruelmente.

            ****

            Minako olhou por um momento para Ryu e Stalker, e hesitou, mas Akai agarrou seu braço, e puxou-a na direção dos outros três youmas. A ruiva não falou nada, mas claramente confiava no líder dos Dragon Kishi.
            Dois dos youmas eram idênticos. Pareciam gatos crescidos, exceto por andarem apenas com as duas patas traseiras e possuírem mãos nas dianteiras. Os olhos deles, dourados, brilhavam, como se relâmpagos estivessem sendo refletidos lá. A terceira youma era completamente humana, exceto pelas asas em suas costas e garras metálicas onde deveriam haver unhas. As asas dela lembravam àquelas de um corvo, completamente negras.
            Nenhum dos três parecia interessado em apresentar-se.
            Akai foi a primeira a agir, jogando seu corpo contra um dos dois youmas felinos, e derrubando-o no processo. A ruiva usou o corpo do youma para amortecer seu impacto, e rapidamente rolou de cima dele, virando-se com um chute na direção do outro felinóide.
            Minako, surpresa com a habilidade de Akai, não percebeu a outra youma se aproximando. As garras metálicas fizeram cinco cortes nas costas dela, o sangue da Senshi manchando a camiseta branca que ela usava. Mentalmente xingando a si mesma, a loira mergulhou para frente, rolando com o impulso, e virou-se para a youma, que novamente voava em sua direção. Minako virou seu corpo sutilmente quando a criatura se aproximou, agarrando o braço dela e jogando-a contra o chão, rapidamente pisando no cotovelo da youma e puxando seu braço. Um alto estalo seguido de um grito indicou que o braço tinha se quebrado. A dor, porém, providenciou o incentivo necessário para a youma colocar mais força em seus movimentos, e antes que Minako percebesse, ela tinha sido arremessada na direção da larga poça onde os outros youmas morreram.
            Akai olhou para Minako assim que o segundo felino caiu, querendo ver como a loira estava indo em sua própria luta. Ao invés de um combate, ela viu Minako sendo arremessada para a poça que significaria uma morte certa para a Senshi. Akai deu dois largos passos e saltou, acertando Minako em pleno ar, e desviando-
a da água. As duas guerreiras caíram desajeitadamente no chão.
            Os dois youmas felinos se aproveitaram da oportunidade, agarrando e imobilizando as duas garotas enquanto elas estavam atordoadas. A terceira youma começou a voar na direção do grupo, pronta para vingar-se de Minako pelo seu ferimento, com um sorriso sádico no seu rosto.
            - Kuso! - Akai xingou, tentando escapar dos braços do youma. Ela olhou para o youma brevemente, e notou um pouco de apreensão nos olhos dele. Sorrindo para si mesma, ela gritou. - MARS SUPERNOVA EXPLOSION!
            O youma deu um grito, e largou-a antes que o grito tivesse terminado, esperando as chamas que ele sabia que viriam. Elas não vieram. Quando o felinóide abriu os olhos novamente, Akai tinha sacado sua katana, e a lâmina da espada estava aproximando-se da cabeça dele numa velocidade alarmante. Pouco depois, o youma caiu morto no chão, um corte fundo no meio do seu crânio.
            O outro felinóide, aquele que estava segurando Minako, soltou um rugido quando viu o seu companheiro cair, e a loira aproveitou-se da distração dele para afundar seu cotovelo no estômago do youma. Akai arremessou a espada na direção da Senshi, que abaixou-se a tempo de deixar a lâmina atravessar o coração do segundo youma-gato.
            - Arigato. - Minako agradeceu, esquivando-se de um ataque da última youma.
            Akai apenas fez que sim, também ocupada colocando-se fora do alcance das investidas da sua oponente.
            Minako começou a procurar por uma falha no padrão de movimentos da youma, sem perceber que os olhos da criatura tinham começado a brilhar um forte branco.
            - CUIDADO! - Akai gritou, finalmente notando a concentração de poder da youma.
            Antes que qualquer uma das duas pudesse reagir, elas e a youma foram envoltas numa explosão de eletricidade.
            Quando a energia se dissipou, as três estavam caídas no chão. Akai e Minako estavam inconscientes, enquanto a youma começou a se desfazer em pó, do mesmo jeito que todos os outros de sua raça faziam ao morrer.

            ****

            Ryu ignorou a explosão de eletricidade causada pela oponente de Minako e Akai, e concentrou sua atenção na luta em que se encontrava.
            Seu oponente, Stalker, era habilidoso. Na verdade, ele era o oponente mais habilidoso que Ryu enfrentara desde Eclypse.
            O youma parou sua arma no meio de um ataque, girou o pulso, e habilmente continuou o movimento interrompido por outra direção. O Dragon Kishi virou sua lâmina para bloquear a investida, e chutou na direção do tórax de Stalker. O youma deu um passo para trás, colocando-se fora do alcance de Ryu.
            Stalker não previu, porém, o chute que o kalyriano lançou com sua outra perna, e sentiu o calcanhar de Ryu acertar seu rosto, tirando seu equilíbrio. Ele ergueu sua espada para proteger-se de um possível ataque de espada, mas não
previu o terceiro chute do Dragon Kishi, que arrancou a espada cristalina das suas mãos azuis.
            - Você é bom, garoto. - Stalker murmurou, se esquivando da lâmina de Ryu, que cortou o ar verticalmente logo ao lado do youma.
            O Dragon Kishi da Lua não respondeu, preferindo virar sua espada, e transformar o golpe vertical em um corte diagonal ascendente. Dessa vez, um corte apareceu tanto na vestimenta de Stalker quanto no seu peito.
            O youma recuou um passo, e estreitou seus olhos. Ele se abaixou, desviando-se de um golpe horizontal de Ryu, e subiu seu pé, acertando o queixo do Dragon Kishi.
            Ryu perdeu o equilíbrio, e cambaleou para trás. Stalker aproveitou-se disso, e girou seu corpo, pegando impulso para desferir um soco que tirou o ar dos pulmões de Ryu.
            Stalker agarrou a camiseta do kalyriano, e virou-o um pouco, enfiando o rosto do herói no chão. Ele ergueu seu pé, pronto para acertar Ryu novamente, mas o Dragon Kishi tinha outros planos. Ele rolou para o lado, o suficiente para escapar do pé de seu oponente, e apoiou suas mãos no chão, passando uma rasteira no youma. Stalker, pensando que tinha ganho a luta, foi pêgo de surpresa, e caiu no chão.
            Ryu ergueu-se com um salto, pegando sua katana do chão, e desceu a lâmina na direção da face do seu oponente. Os olhos de Stalker brilharam, e Ryu mal teve tempo de proteger seu rosto antes que um mar de pequenos cristais atingisse-o. Os projéteis desapareciam assim que faziam contato, e não chegaram a fazer ferimentos profundos, mas o tórax e braços do Dragon Kishi ficaram cobertos de pequenos cortes. Ryu recuou alguns passos, atordoado. Quando ele ergueu os olhos, só chegou a ver o pé de Stalker se aproximando, seguido de outro chute e um soco.
            Ele estava inconsciente antes de tocar o chão.

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