Biografia

Como nasce uma Crossdresser

Se eu deitasse no diva do psicanalista ele me diria: "Conte-me tudo desde o inicio"

Bem, as primeiras lembrancas que tenho do meu "crossdressing" vem da infancia. Lembro-me que com 5 ou 7 anos eu ja "pegava emprestado" as calcinhas da minha irma mais velha. Tudo muito bem escondido e camuflado. Eu procurava deixar a gaveta e as roupas dela do mesmo modo que estavam antes de eu mexer, era um tremendo exercicio de memoria...

O tempo foi passando e eu entrei no "esquema do mundo" de viver, lutando sempre mais e mais contra a Betina, que a cada dia mostrava uma nova faceta. Lembro-me de, aos 14 anos, ficar me barbeando para forcar o crescimento da barba, que nunca foi farta.

Tive uma criacao muito rigida. Meu pai era um espanhol militar, catolico e reacionario linha dura. Era super preconceituoso. Sofri muito psicologicamente por causa dos comentarios maldosos dele em relacao ao homossexualismo em geral.

Na adolescencia, quando eu vestia as calcinhas da minha irma, o prazer era tao grande que eu chegava a ter orgasmo so em me olhar no espelho... Entao vinha a culpa: "Por que eu fiz isso? Eu sou homem, poxa vida... Sera que sou doente, ta faltando uns parafusos, ou sou bicha?" Me questionava assim pois sempre gostei de mulheres. Era e sou  um apaixonado pelo sexo feminino e pela feminilidade em geral e sabia disso... Ainda na puberdade descobri que  gostava tanto do sexo feminino que queria sentir o que elas sentiam - pelo menos essa foi a desculpa mais aceitavel que encontrei para mim mesmo.

Quando comecei a trabalhar, aos 16 anos, montei minha primeira malinha so com lingeries, que foi parar no Rio Tiete, num impeto de virilidade...  Explico: com vinte e poucos anos conheci uma alema e me apaixonei loucamente por ela. Era meu terceiro grande amor... Decidi entao "largar essa vida" e ser homem de verdade. Peguei meu carro e minha malinha, dirigi ate a Av. Ricardo Jafet (aquela que vai dar na Imigrantes), parei o carro no acostamento, atravessei-a e joguei minha malinha no rio... Me sentia aliviado, contudo o alivio durou muito pouco...

Em 95, aos 26 anos, fui viver com essa garota na Alemanha e passei uns bons meses sem que meu lado feminino se manifestasse. Mas em uma tarde, quando ela estava trabalhando e eu so em casa, de repente abri sua gaveta de lingeries e cheirei aquelas roupas... Que sensacao... Quase cai de quatro... Entao comecei a experimentar febrilmente uma e outra peca... Ela e quase do meu tamanho, tudo servia direitinho... Foi ai que, pela primeira vez, experimentei um par de sapatos dela. O salto era baixinho, mas lembro-me que eu ficava me equilibrando neles... hehehe... De repente a Betina tinha ressuscitado... ainda meio moribunda e parcialmente, mas estava la. Agora as condicoes eram propicias, pois nao havia mais familia por perto para eu ter de me esconder. Tinha que contar para a minha namorada, mesmo pondo em risco o nosso relacionamento...

Entao comecei jogando um verdinho aqui, outro ali (usando a perspicacia feminina...) e quando achei que o "bife ja estava amaciado", contei... Tinhamos ido visitar uma amiga dela em Dortmund, perto de onde moravamos e eu fui com uma calcinha dela... No meio do transito da Autobahn pedi para ela colocar a mao dentro do meu ziper e adivinhar o que eu estava usando... Ela disse: calcinha?! Perdi o folego e o rebolado, mas via a surpresa agradavel estampada no rosto dela, entao abri o jogo... Ela ia aceitando tudo muito bem...

Eu usava as roupas dela em casa e na frente dela. Aos poucos ia me livrando do complexo de culpa, na medida em que ia ficando mais velho. Comecei a adquirir minhas primeiras pecas...

Ela trabalhava como "vendedora de cosmeticos" e comecou a experimentar em mim diversos tipos de maquiagem: eu era o laboratorio dela. Em um determinado momento eu ja existia fisicamente e nos modos, ela dizia: "Nao fale assim, pois uma mulher nao age dessa forma..."

Com mais algum tempo ela disse: "Precisamos arranjar um nome para voce!" E depois de pensar um pouco disse que Betina tinha tudo a ver comigo. Entao era Betina pra ca, Betina pra la...

Entao brigamos, ou melhor, com o passar do tempo percebi que nao teriamos um futuro juntos, pois eramos muito diferentes. Nao combinavamos mesmo. Decidimos nos separar, eu passei a me produzir e a sair sozinha pelas ruas de Colonia, uma cidade enorme, maravilhosa e vizinha a nossa. Nesta cidade nao seriareconhecida. Na Alemanha pode-se ir a qualquer lugar "montada". Se voce for maltratada e chamar a policia, a pessoa que te maltratou e fichada como racista... (igual ao Brasil, ne?)

Entao mandei bala, contei, pouco-a-pouco, para meus amigos que gostava de me vestir de mulher e eles, um apos outro, (ao contrario das minhas expectativas) foram aceitando sem problemas...

Segunda parte da Biografia