Profetas de Israel
Comunais, Acratas e Anticlericais


CAPITULO V


A PALAVRA PROFÉTICA


Os profetas eram homens da Palavra de Javé. Suas extraordinárias experiências religiosas não eram apenas emocionais, tinham um conteúdo como o de linguagem inteligível. Eles sentiam uma irresistível compulsão para comunicar a mensagem que tivessem recebido, e a Palavra e a incumbência de falá-la eram partes da mesma experiência fundamental e característica: «Vai, e dize a este povo. . . » (1) ; «Javé me disse: Vai, e profetiza. Ora, pois, ouve a palavra de Javé» (2); «A quem eu te enviar, irás; e tudo quanto eu te mandar, falarás... Depois estendeu Javé a mão, tocou-me na boca, e me disse: Eis que ponho na tua boca as minhas palavras» (3).

É evidente, dessas e de muitas passagens, e o assunto tem sido já enfatizado nesta discussão, que profecia é muito direrente de adivinhação e vidência. É igualmente claro que os profetas eram algo diferente dos mestres de moral, pregadores ou teólogos. Possuíam e eram possuídos por uma mensagem definida e urgente, que não derivava da tradição nem era produzida pela reflexão sôbre um corpo existente de crença religiosa. Ela vinha-lhes como uma ordem divina imediata. Eles eram os intérpretes e embaixadores plenipotenciarios
da mente de Javé, de sua presente vontade e de seu propósito final para seu povo e para o mundo. Eram homens enviados com uma missão; «Ouvi a voz de Javé, que dizia: quem enviarei, e quem há de ir por nós? Disse eu: eis-me aqui, envia-me a mim» (4). Como emissários pessoais eram dotados de autoridade adequada: «Olha que hoje te constituo sôbre as nações e sôbre os reinos, para arran-

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cares e deribares, para destruíres e arruinares e também para edificares e para plantares» (5).


O Dom Profético

Mowinckel demonstrou convincentemente que os profetas da época clássica rejeitam a idéia de possessão pelo espírito para explicar seus podêres e atribuem-nos antes à possessão pela Palavra de Javé. Fazendo isso, eles distinguiam-se de seus precursores, os profetas extáticos dos tempos de Samuel e Eliseu e, ao mesmo tempo, de seus contemporâneos «loucos», nos quais persistia a velha tradição (7). Era crença popular de que um homem que se comportava anormalmente estava sob influência de um espírito que, de fora, descera sôbre ele. Essa foi a explicação dada da sabedoria de José, da capacidade artística de Bezaleel, da coragem de Gideão, da fôrça bruta de Sansão, do frenesi de Saul e de sua melancolia posterior, da traição dos siquemitas, dos desaparecimentos de Elias e da mentira dos profetas de Acabe (8). Na maioria dos casos, diz-se que o espírito é de Deus ou de Javé, mas em I Reis 22.19-23, o «espírito mentiroso» que Javé põe na boca dos falsos profetas é descrito também, no mesmo contexto, como membro das hostes celestes, distintas de Javé, embora sob seu contrôle.

É interessante, nessa passagem, que Micaías não atribui seu próprio conhecimento do propósito de Javé a um espírito «verdadeiro» enviado por Javé, mas à sua própria apreensão imediata, pela «visão profética» do que tinha acontecido na côrte celeste e do que estava para acontecer a Israel no campo de batalha.

Essa penetração nas realidades morais e espirituais de uma dada situação, aliada a uma completa certeza de que Javé queria que ele as declarasse em termos inconfundíveis, distinguia um profeta, como Amós ou Jeremias, de seus predecessores e contemporâneos extáticos. Suas declarações tinham substância intelectual que faltava na fala espiritual destes, descontrolada e incoerente: «O seu profeta (comum) é um insensato, o homem de espírito é um louco», diz Oséias, e Jeremias acrescenta: «Até os profetas não passam de vento, porque a palavra está com eles» (9). Os extáticos eram

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possuídos por um vago e inidentificável espírito ou poder supranormal. Os grandes Profetas eram possuídos pela mente e vontade de Javé. O que eles falavam era a Palavra dele, a expressão de sua personalidade moral. O conteúdo da palavra era definido, relevante e urgente.

É significativo que o tipo do verdadeiro profeta, segundo a passagem de Deuteronômio, já citada, e que data do período dos grandes profetas (10), é Moisés, a quem Javé «falava boca à boca». De tal profeta se diz: «Porei minhas palavras na sua boca». A autorevelação de Deus não era em sons misteriosos e truncados, ou em visão simbólica, que devessem ser interpretados posteriormente. Era, antes, um contacto direto de uma mente com outra, que assumia a forma da linguagem inteligível. Ao profeta falava uma voz que ele era capaz de compreender (11), e cuja mensagem ele repetia com este prefácio: «Assim diz Javé».

A audição era, de certo, uma experiência íntima do profeta, e pode receber uma explicação psicológica. O importante é que aquilo que ele percebia ser uma manifestação divina tinha sentido articulado. Era uma Palavra. Algumas vezes, devido à nitidez impressionante com que essa se apresenta à consciência do profeta, é chamada uma visão. Mas o que era visto, falando em termos gerais, era antes um oráculo ou mensagem verbal; não simplesmente um acontecimento figurado em forma natural ou simbólica (12). Há expressões, como as visões de Amós e de Isaías (13), mas essas fornecem apenas o contexto para a Palavra divina em que culminam.

Essa consciência de possessão pela Palavra de Javé é ainda sinal de um estado extático, mas de tipo muito diferente do frenesi de dervixes dos níveis inferiores da profecia. O profeta sente a presença de uma luz em sua mente, luz que eleva a um novo nível sua percepção e seu entendimento. Diz Isaías: «Assim me falou Javé com irresistível poder» (literalmente, «tendo forte a mão»). Diz Amós: «O Senhor Javé me mostrou». Diz Jeremias: «Depois estendeu Javé a mão, e tocou-me na boca, e me disse: Eis que ponho na tua boca as minhas palavras». E ainda: «Meu coração deutro de mim está quebrantado, todos os meus ossos perdem

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sua fôrça... por causa de Javé, e por causa de suas santas palavras». Mas o resultado é que o profeta se torna «cheio do poder do juízo e da fôrça para declarar a Jacó sua transgressão» (14). Sua consciência profética tem grande intensidade: Elias era «em extremo zeloso por Javé» (15).

Essa intensidade e exaltação de espírito, que resultava de um impulso reconhecidamente divino, é um novo tipo de êxtase profético, relacionado com a concentração e absorção do místico, do artista e do gênio, mas diferente por causa de seu elemento de ação. Como diz Rufus Jones, falando da experiência mística: «Quando os podêres mentais são fundidos e unificados, transbordados e revitalizados pela intensa concentração e unificação mística, todo o eu interior se torna um órgão imensamente delicado de apreensão espiritual em correspondência com o mundo real a que pertence». (16). Diz Mowinckel: «É absolutamente claro que os profetas falam e agem num estado de elevada tensão mental... (em que) as idéias, pensamentos, etc., que de um modo ou de outro foram criados numa pessoa, se elevarão acima do limiar da consciência e, de súbito, atingirão repentina clareza» (17). Não há aqui nada dos confusos transbordamentos da mente subsconsciente, liberados pelo frenesi religioso, como nada há também de um misticismo de sentimento simplesmente passivo. A experiência mística dos profetas era um misticismo de fé, de entendimento e de ação. Eles estavam supremamente cônscios das realidades morais da situação concreta, humana e social; não eram alheios a elas, como os místicos tendem a ser. Continuavam intensamente conscientes de que eles mesmos eram participes do drama, enquanto ao mesmo tempo percebiam que eram portadores da mente de Deus para o drama. Diz Jeremias: «Estou quebrantado pela ferida da filha do meu povo; estou de luto; o espanto se apoderou de mim» (18).

O novo tipo de êxtase profético expressava-se em nova forma de linguagem extática, claramente inteligível, direta e radical, e carregada de forte poder emocional. Clareza de percepção e seriedade moral combinavam com um domínio imaginativo e artístico da língua. O caráter concreto e vívido

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da língua hebraica fornece pronta matéria para uma expressão de apêlo direto e urgente. A dignidade e importância da mensagem elevavam as formas de expressão a um nível artístico inédito até então. Algumas vezes o profeta sentia estar repetindo as próprias palavras de Javé, como em Jeremias 3.11, 12; outras vezes sentia que Javé estava realmente usando sua boca e sua língua para falar, como em Jeremias 2.9 e Isaías 6.7. Em todos os casos o profeta devia falar como compete a um embaixador.


O Chamado e a Investidura de um Profeta

A certeza de ter um chamado e investidura divinos era um elemento primordial na consciência profética. Amós, o boieiro, protestava e profetizava não por sua própria escolha, mas por uma ordem divina irresistível que, por assim dizer, o erradicara fisicamente de seu costumeiro estilo de vida. Isaías, o aristocrata, ouviu a voz do soberano chama do divino à procura de um mensageiro e conheceu que aquêle chamado se dirigia a ele. Oséias, o amoroso, percebeu, na imperiosidade de um amor que torturava sua mente e atassalhava seu coração, um chamado para falar de um amor divino que nenhum mal poderia extinguir. Miquéias, o camponês, foi possuído por sua mensagem e pelo poder de entregá-la. Jeremias, jovem retraído e resguardado, viu-se arrastado para a vanguarda de grandes acontecimentos e revestido com uma autoridade que a ele mesmo causava terror (19).

Associado a esse sentimento de irresistível compulsão pela vontade divina e pela escolha divina, estava o reconhecimento do profeta de que tinha sido apartado dos outros homens e consagrado a uma tarefa de que não poderia escapar.

Ser santificado era ser apartado para o uso de Javé, como uma oferenda no templo. Javé declara a Jeremias: «Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te conheci, e antes que saísses da madre, te consagrei e te constituí profeta às nações» (20). Isaías, que se reconhecia homem de lábios impuros, vivendo no meio de um povo de impuros lábios, foi purificado, vivendo apartado do povo que não que-

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ria voltar-se de novo para Deus e ser curado. Oséias apartou-se a si mesmo, pela escolha que fêz, dos seus vizinhos. Amós abandonou repentinamente o lar e a profissão.

O chamado parece que vinha a cada profeta num período de tensão intelectual e emocional. «O ano da morte de Uzias» mareou o fim de uma época. As tensões sociais que se seguiram às guerras de Jeroboão Il e a uma série de calamidades naturais aparecem nas páginas de Amós como afetando a todos, exceto os muito ricos. Oséias falava do meio de um tumulto de vício e confusão, que chegava quase à anarquia. Miquéias clamava que as cidades estavam sugando o sangue da zona rural, e que uma invasão estrangeira deveria em breve vir completar a destruição. Jeremias e Sofonias começaram a profetizar quando o império mundial dos assírios estava vacilando sob o ataque feroz das hordas bárbaras, que logo haveriam de aparecer em o Norte da Palestina. Naum gritava que Nínive estava para cair com um estrondo que abalaria o mundo.

Em épocas assim, de excitação geral, compreende-se prontamente que homens de dotes espirituais acima do comum tenham experiências religiosas críticas. Onde a história do chamado de um profeta é contada minuciosamente, como no caso de Isaías e de Jeremias, essa experiência parece ter sido marcada por certo grau de arrebatamento extático não repetido posteriormente, e de certo modo não característico da comunhão diária posterior do profeta com Javé. A coisa importante é que essa experiência original inicia o profeta numa nova relação permanente com seu Deus. Os oráculos posteriores que, de tempo em tempo, ele pronuncia, não são, necessariamente, dependentes de uma repetição dessa experiência original, mas são derivados de seu permanente conhecimento da natureza e vontade de Javé e de sua percepção da constante presença de Javé. Isso tudo integrava com o êxtase inicial numa experiência pessoal total que é em si mesma extática, no sentido novo já discutido.

Com a contínua relação especial do profeta com Deus está vinculada sua reconhecida responsabilidade como intercessor. Sua investidura impõe-lhe uma medida direta de res-

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ponsabilidade pela condição e destino de seu povo. Embora apartado para sua tarefa e muitas vezes forçado a permanecer sozinho, o profeta, ao se aproximar de Deus, fala pelo povo a que pertence, e que não pode ou não quer reconhecer sua necessidade espiritual. Em sua pessoa mesma ele sente o pêso dos próprios juizos divinos que encontram expressão através de seus lábios. Amós intercedeu pelo povo dizendo: «Senhor Javé, perdoa, rogo-te; como subsistirá Jacó?» O poder de intercessão era reconhecido como parte da investidura de um verdadeiro profeta: «Porém, se não são profetas, e a palavra de Javé está com eles, que orem a Javé dos Exércitos». Tanto Jeremias como Isaías receberam apelos de reis para intercederem pela nação em tempos de aflição extrema (21). Exemplos da linguagem de tal intercessão profética encontram-se em Jeremias 14.79, 19-22.

Fazia-se oração a Javé também para pedir uma palavra ou um oráculo, quando uma situação especial parecia exigi-lo e ele não tivesse sido concedido espontâneamente. Assim clamava Jeremias: «Eis que eles me dizem: Onde está a palavra do Senhor? Que venha agora» (22). O dar oráculos em resposta a um pedido especial está registrado, por exemplo, em II Reis 19.14-34; 20.1-6; Jer 37.3-10; 42.1-22. Nesse último caso, passaram-se dez dias antes que a resposta viesse.

O predomínio de referências a Jeremias nesta conexão deve-se, em parte, ao fato de que os registros de seu ministério são mais extensos e íntimos do que os de qualquer outro profeta e, em parte, ao fato de que intercessão era algo particularmente congenial a uma pessoa de espírito sensível e compreensivo como Jeremias. Pois a investidura de um profeta não lhe obliterava o fator humano e pessoal. A ternura e a natureza sensível de Jeremias e Oséias contrasta com o puritanismo austero e viril de Miquéias e Amós e com a confiante dignidade de Isaías, o aristocrata. Mesmo quando pronunciavam o que era essencialmente a mesma mensagem ou quando condenavam a injustiça social, sua maneira de fazê-lo e é característica de sua individualidade (23). Isso quer dizer, simplesmente, que a palavra divina encontrava expressão pela instrumentalidade de mentes humanas e da linguagem natural.

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O Poder da Palavra

Até as palavras da linguagem cotidiana, consoante a maneira de os hebreus pensarem, eram mais do que simples sons transmitindo idéias. «Falar» não era «fôlego». Sentia-se que as palavras estavam impregnadas da fôrça da pessoa que falava e, uma vez pronunciadas, continuavam sua expressão eficaz, mesmo na ausência de quem as pronunciara, ou depois de sua morte.

A maldição ou bênção pronunciada no leito de morte era especialmente poderosa; as palavras de Isaque, Jacó e Moisés moribundos (24), são apresentadas como fator determinante na subseqüente história das tribos israelitas. O nome próprio era manifestação da pessoa designada por ele: «Disse Davi aos dez moços: Ide a Nabal, saudai-o com meu nome» (25). Mencionar o nome de um deus era invocar sua presença, e isso não devia ser feito levianamente (26).

Assim a palavra pronunciada por meio do profeta tinha em si o poder de Javé, como uma tocha acendida num fogo central. «Javé enviou uma palavra contra Jacó, e ela caiu sôbre Israel»; «A palavra que sair da minha boca... fará o que me apraz, e prosperará naquilo para que a designei»; «Por isso os abati por meio dos profetas; pela palavra da minha boca os matei» (27). Quando soou a palavra de Deus: «Haja luz», houve luz. Foi em completa harmonia com essa concepção que o centurião disse a Jesus: «Apenas manda com uma palavra, e o meu rapaz será curado» (28).

A potência inerente da palavra profética é particularmente significativa quando se relaciona com acontecimentos futuros. Esses eram buscados mais que previstos. Os profetas da côrte de Acabe pronunciaram vitória em Ramote-Gileade a fim de garantir a vitória (29). Quando as palavras de Javé foram colocadas na boca de Jeremias, este foi, ipso, facto,, constituído «sôbre as nações e sôbre os reinos», como fator poderoso na determinação do curso de sua história (30). Isaías e Oséias articularam a palavra divina nos nomes de seus filhos, a fim de influenciarem um futuro em que o propósito divino encontrasse sua realização (31).

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A consciência de que o profeta tinha dentro em si uma palavra que expressava a vontade divina, mostra-se no sentimento de compulsão debaixo do qual trabalhava. Sua missão era não a de sua própria escolha. Amós clama: «Falou o Senhor Javé, quem não profetizará?» E ainda mais: «Eu não sou profeta... mas Javé me disse: Vai e profetiza». A prudência humana guardaria silêncio, mas a palavra divina deve encontrar expressão (32). Isaías sentiu-se enviado para uma tarefa sem esperança e impossível, e as histórias de Elias e Jonas servem para ilustrar como alguns profetas gostariam de ter escapado à vontade de ferro que os compelia. Desde o princípio, Jeremias protestara em vão contra o encargo que lhe era impôsto; num excesso de agonia, amaldiçoou o dia em que nascera para o trabalho, a angústia e a vergonha. Contendia com Deus, o dono do destino dele, e reconhecia a derrota de sua própria vontade como vitória de Javé: «Mais forte fôste do que eu, e prevaleceste» (33).

Diante de tal convicção, nada valiam os anátemas dos sacerdotes, as denúncias dos profetas profissionais e a mão pesada das autoridades civis. Até o mais doloroso de todos os golpes, o abandono por parte dos amigos íntimos, atingiu a Jeremias diretamente no coração, mas não matou sua fé: «Porque ouvi a murmuração de muitos... Denunciai e o denunciaremos, dizem todos os meus íntimos amigos... Mas Javé está comigo como um poderoso guerreiro» (34).


A Autenticação da Palavra

Visto que o fenômeno de «falsa profecia» era bem conhecido dos profetas clássicos (35), surge esta pergunta: Como estariam eles mesmos tão seguros de que sua mensagem vinha de Deus, e não era simples projeção de suas próprias opiniões e desejos? Pois suas vozes não eram nenhuma trombeta de som incerto. Só ocasionalmente há qualquer sugestão de que uma declaração é provisória, como quando Amós admite a possibilidade de que Javé se compadeça do restante de José, e Jeremias encontra a confirmação de seu pressentimento numa experiência subseqüente. Diz este último: «Então entendi que isso era a palavra de Javé» (36).

Em primeiro lugar, os critérios do profeta eram psicológicos. A natureza de seu êstase era claramente diferente

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da fala delirante dos homens do espírito. A clareza e decisão da mensagem que os possuía e o impulso irresistível de pronunciá-la produziam a convicção de que a palavra tinha vindo ao profeta de além de si mesmo. Uma repentina visualização das realidades espirituais implícitas numa dada situação, era como a solução de um problema ou a queda do véu de um mistério: «Certamente o Senhor Javé não fará coisa alguma sem primeiro revelar seu segrêdo aos seus servos, os profetas» (37). Era a resposta adequada e inevitável, o corolário inelutável (38). Era uma experiência que não poderia ter outra interpretação que não a de um destino divino (39).

E aquilo que lhe causava uma agonia íntima tal que ele mal conseguia suportar e não podia evitar, dificilmente poderia ser atribuído a uma projeção do ego. Até o servo Amós tremia do juízo divino que fôra chamado a pronunciar. Isaías clamava: «Até quando, Senhor?» e Jeremias não podia dominar-se, quando ouvia o alarma de guerra e sentia que sua própria alma era o campo de batalha da ira de Deus (40).

De fato, o impulso para falar não só era independente da volição do próprio profeta, mas algumas vezes era até contrário a ela; como quando Jeremias disse «Amém» à predição de Ananias a respeito de uma rápida libertação dos exilados, mas depois passou a declarar que a verdadeira palavra de Javé era exatamente o oposto (41). A palavra de juízo era tão desagradável de falar quanto desagradável de ouvir. O próprio fato de que esses homens se sentiam compelidos a declarar que o dia de Javé seria trevas e não luz, indo assim, de encontro a uma expectação religiosa tão acarinhada, era para eles uma autenticação dessa mensagem (42). E, ainda, o fato de que Jeremias e Habacuque chegaram até a questionar a justiça das ações de Javé (43, mostra quão vividamente estavam conscientes de uma outra vontade que não a deles.

A clareza e exatidão da palavra e sua urgência moral eram uma confirmação para a mente do profeta; esta era ainda corroborada pelo poder da declaração que acompanha-

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va seu estado exaltado. A tradição a respeito de Moisés diz que ele não era eloqüente mas de palavra vagarosa, de modo que Javé teve de prometer ajudá-lo a falar e a dizer-lhe o que falar. Assim diz Javé a Jeremias, que também tinha protestado que não sabia falar: «Tudo quanto eu te mandar, falarás» (44).

O oráculo profético é uma forma distinta nos registros da literatura hebraica, alcançando, muitas vezes, grande elevação como poesia ou retórica. Sugere, algumas vezes a solenidade de uma proclamação real, a gravidade de um pronunciamento judicial, ou as diferentes notas de autoridade do comandante, do mestre, ou do presidente de assembléias. O dom de tal linguagem é para os profetas um dom de fato, e dom por Javé de um instrumento para expressar sua palavra. Eles vêem uma palavra que outros homens não vêem, mas falam palavras que os outros homens podem ouvir, e de um modo que atrai a atenção, embora possa não produzir obediência.

Não é coisa fácil agüentar tal ministério, sempre difícil, muitas vezes cheio de perplexidades e desapontamentos, e algumas vezes perigoso. Mas os profetas tinham consciência de ter dentro de si um poder que os habilitava, o qual era em si mesmo uma garantia de que sua investidura era genuína. Diz Miquéias: «Estou cheio do poder... para declarar a Jacó a sua transgressão»; e Jeremias se sente transbordante da ira de Javé (45). Este último, o mais manso e sensível de todos os porta-vozes de Javé, se tornou como uma muralha fortificada contra a qual os ataques furiosos dos homens se quebravam. Era Javé, ele o sabia bem, sua fôrça, fortaleza e refúgio no tempo da angústia (46). O poder dinamizador da religião era, então, como ainda hoje, a melhor evidência de sua realidade.

O segundo critério do profeta era racional. Esse era o teste da coerência com os termos de sua comissão original na experiência radical de seu chamado; da coerência, além disso, com a vontade de Javé tornada conhecida na história passada de Israel e por meio da profecia mais antiga.

Os juízos e «ais» de Amós são ecos do rugido medonho e do comburente sôpro com que Javé lhe havia falado

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no princípio; também apontam a intensificação das aflições e desastres que não tinham conseguido fazer Israel retroceder de seu mau caminho (47). Como a espôsa de Oséias era impura assim o era Israel, e seu amor era «como a nuvem da manhã, e como o orvalho da madrugada que cedo passa». Mas Javé era constante; quando Israel era menino ele o amara, e chamara do Egito o seu filho (48). Os chamados de Isaías e Jeremias determinam o ensino subseqüente deles e são uma chave para interpretar esse ensino (49).

O terceiro critério para o profeta era o valor moral e a relevância imediata de sua mensagem. No meio da confusão moral, ele era capaz de distinguir o bem do mal, e de defini-lo como justiça, humanidade, fidelidade e verdade (50). «O meu povo está sendo destruído porque lhe falta o conhecimento», diz Oséias; «Javé tem uma contenda com os habitantes da terra; porque nela não há verdade, nem amor, nem o conhecimento de Deus» (51). É esse verdadeiro conhecimento de Deus e essa compreensão de seus caminhos que os profetas proclamariam por meio de suas censuras e exortações. Dão testemunho, transmitem conhecimento, explicam sua mensagem «preceito sôbre preceito, preceito e mais preceito; regra sôbre regra, regra e mais regra; um pouco aqui, um pouco ali» (como os escarnecedores descreviam a incansável reiteração do tema profético: Is 28.10). Tal palavra clara e constante autenticava-se a si mesma; adaptava-se à situação como uma chave à fechadura. «Javé enviou uma palavra contra Jacó, e ela caiu sôbre Israel, e todo o povo a reconhecerá». Assim também acontecia com o próprio profeta: «Javé me fêz saber, e eu o soube». Um pacto posterior deverá substituir o antigo, dizia Jeremias, e então as injunções divinas serão escritas em todos os corações como já estavam escritas no seu próprio; um homem não ensinará mais a seu próximo a conhecer a Javé, pois todos o conhecerão como Jeremias já o conhece (52).

A importância urgente e imediata da palavra para os homens, na situação em que se encontrava, ajudava a produzir nesses porta-vozes de Javé a certeza de que ela lhes viera dele. Ela desvendava os fatos reais, as condições morais e espirituais implícitas; explicava a situação e determi-

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naria suas conseqüências (caso não houvesse radical alteração nessas condições, como resultado de genuíno arrependimento). De fato, as possibilidades divinas de tal mudança de coração eram parte do quadro total da situação espiritual. É vontade de Javé, diz Oséias, desposar consigo a Israel, em justiça e em juizo, em amor e misericórdia e fidelidade. Isso era «conhecer a Javé» (53), como Oséias e Jeremias o conheciam, como o fato final nas alturas e nas profundezas da experiência humana.

Já que os ouvintes do profeta não partilhavam de sua experiência, a autenticação de sua mensagem era aceita por eles (quando era aceita) por razões diferentes. Êxtase ou qualquer outro comportamento extraordinário tinha sido geralmente atribuído à influência do espírito; isso predispunha os homens a darem atenção. Mas não fornecia um meio para distinguir entre vozes discordantes que professavam pronunciar a palavra divina. Quando, como acontecia algumas vezes, os profetas se contradiziam uns aos outros, cara a cara, um teste era que o verdadeiro profeta falava o que seu auditório não desejava ouvir (54). Uma promessa de boa sorte era suspeita, caso pronunciada muito facilmente, pois o profeta que clamava «Paz» a fim de ter pão para comer tornara-se uma figura familiar (55). Jeremias afirma, com razão, que seu próprio anúncio constrangido de juízo estava em harmonia com a tradição profética, que tinha sido justificada pela história. A mensagem de paz e bem-estar de seu oponente Ananias não devia ser aceita, sugere ele, até que tais oráculos tivessem confirmação semelhante. E isso era ainda moralmente impossível, visto que a condição espiritual de Judá não mudara, e o juizo inevitável num mundo controlado por um deus como Javé, não tinha sido cumprido ainda (56).

De Deuteronômio 14.1: «quando profeta... te anunciar um sinal ou prodígio», pareceria que tais portentos eram comumente oferecidos com o fito de conseguir crédito. Eram apresentados pelos profetas aos seus ouvintes, em nome de Javé, como, segundo a tradição, o próprio Deus oferecera a Moisés um sinal para confirmar a validez de seu chamado. Igualmente, a íntima associação, com o chamado de Jere-

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mias, das «intuições de significado» a respeito da amendoeira e da panela em ebulição, sugere que elas foram tomadas por Jeremias como sinais comprobatórios (57).

Só excepcionalmente esses sinais são apresentados como miraculosos. A sombra que voltou dez graus no relógio de sol de Acaz é o único exemplo do período da profecia clássica, que exibe esse caráter junto com a história do punhado de lã de Gideão e do fogo divino que consumiu sua oferenda; e sua única analogia é a de outra lenda primitiva, a parada do sol por ordem de Josué (58). As maravilhas que precederam e acompanharam o Êxodo foram consideradas, primariamente, como manifestações naturais do poder do Deus que se tinha empenhado em libertar a Israel. Mas, no princípio, um «sinal» profético era um penhor presente de um futuro cuja realização se iniciara pela palavra profética. Tratava-se, algumas vezes, de uma ocorrência preliminar indicadora de que o futuro predito estava iminente: Saul encontraria três homens e um rancho de profetas, em seu caminho para a realeza; a morte de seus dois filhos no mesmo dia seria o sinal do fim da casa de Eli; uma colheita próxima testemunharia a Ezequias um livramento certo, porém mais distante; a captura de um faraó indicaria o desastre próximo dos judeus que tinham procurado refúgio em seus domínios (59). Em outros casos, esse «sinal» era um fato dramático único que evidenciava o cumprimento do propósito de Javé. Diz ele a Moisés: «E este será o sinal que eu te enviei: depois de haveres tirado o povo do Egito, servireis a Deus neste monte» (60). Finalmente, o «sinal» era uma expressão do profeta no presente, pela palavra ou pela ação, de um aspecto significativo do futuro que predizia. A ação do próprio profeta, ou os nomes dados por ele a seus filhos, tornavam esse futuro uma realidade presente para os seus ouvintes (61).

Em última análise, a palavra era autenticada por seu inerente valor e pêso mais do que pelos sinais ou poder pes-

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soal dos homens que a pronunciavam. Ela era estranha, desacostumada e, até mesmo, surpreendente. Vinha como um elemento novo, perturbador e criador, em dada situação, e confrontava os homens com a necessidade de uma decisão moral. Os proclamadores eram os homens cheios daquela apaixonada convicção que divide os homens em duas alas, fazendo discípulos de alguns e, de outros, inimigos. Arriscavam sua reputação e sua vida com declarações que penetravam até aos fundamentos das situações estabelecidas e dos tabus e costumes encanecidos. Suas palavras ameaçavam as prerrogativas daqueles que detinham o poder eclesiástico, político e econômico. Constituíam uma fôrça ponderável dentro da comunidade, reconhecidos como um poder em luta pela retidão e desafiando os padrões e métodos aceitos pela sociedade. Apesar de todas as diferenças pessoais, havia em todos os profetas uma qualidade comum característica, uma vitalidade criadora, que se harmonizava com sua convicção de pronunciarem a palavra de Deus.


As Formas da Palavra

O oráculo assumia muitas formas diferentes. Podia ser uma insistência (Jr 35.15); uma acusação judicial (Is 1.2, 3); uma pergunta retórica (Is 1.18); uma exortação, pessoal (Jr 1.17); uma expostulação (Mq. 3.1); um debate lógico (Am 3.1-8); uma visão (Am 7.1ss); um pronunciamento de juízo (Mq 2. 1ss); um convite irônico (Am 4.4-5); um decreto de condenação (Is 2.12-21); um juramento (Is 14.24-27); um enigma (Am 6.12); uma parábola (Is 5.1, 2); um ato simbólico (Is 20.2); um oráculo sapiencial (Is. 28.23-29); uma proclamação (Jr 11.6-8); um solilóquio (Jr 8.18ss); um sarcasmo (Is 22.17-18; Am 5.26-27).

Uma aparência de ordem pode ser introduzida nessa miscelânea, reconhecendo-se que os tipos peculiares de oráculos proféticos são cinco: declaração das realidades espirituais do passado, e das condições atuais; exprobração ou exortação dirigida aos homens, no presente; a ameaça ou pro-

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messa com relação à atividade de Javé, no futuro imediato ou mais distante (62). A esses acrescentam-se os oráculos particulares dirigidos ao próprio profeta, suas experiências visionárias e colóquios íntimos com Deus. Acrescenta-se também o uso ocasional de outras formas literárias não peculiares à profecia, como a parábola, a elegia, o lamento, a cantiga de desdém, a oração, a epístola, e o discurso «sapiencial» ou provérbio (63).

As cinco formas fundamentais de oráculo profético aparecem em grupos relacionados e em diferentes combinações. Como era de esperar-se, uma exprobração é seguida freqüentemente de uma ameaça, como em Is 10.14; Os 4.1-3; Am 2.6-16; Mq 3.9-18; ou de uma ameaça e uma promessa, como em Is 1.21-26 e Jr 23.1-4. Algumas vezes, uma ameaça e uma promessa são apresentadas como alternativas, dependentes da atitude diante de uma exprobração ou uma exortação; por exemplo, Am 5.10-15; Jr 7.3-15; Is 1.18-20. A seqüência de exortação, declaração (ou promessa) e ameaça condicional encontra-se num só oráculo, em Is 7.4-9, que é seguido por outro em que aparece a combinação de exprobração e promessa, em Is. 7.13-16.

É impossível determinar até onde os profetas foram responsáveis pela reunião desses oráculos isolados em agrupamentos e composições mais amplos em que agora se encontram. Grande parte desse trabalho deve-se indubitavelmente a discípulos que coligiram e preservaram suas declarações e a editores posteriores que construíram livros proféticos. Em alguns casos, porém, como Am 1.3; 2.3, 6-16; 7.1-9; e Is 9.8-10 com 5.25-30, o efeito da mensagem do profeta é obtido, em parte, mediante a seqüência de oráculos isolados semelhantes colocados numa composição mais extensa; e não há razão para supor que isso não se deva ao próprio orador. Por outro lado, um oráculo completo podia ser muito breve mesmo; em Is 6.9, temos apenas seis palavras; e quatro palavras, em Is 8.1. Êste último tem a forma de um discurso enigmático, que exige o oráculo esclarecedor de 8.4. Outras sentenças curtas, pejadas de significado incor-

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poradas agora em composições mais longas, mas que têm aparência de serem completas em si mesmas, o que sugere sua independência original, são Is 7.9: «Se o não crerdes, certamente não permanecereis»; e Is 28.16: «Aquele que crê não foge».

Não é sempre fácil traçar o limite entre a declaração, a exprobração e a exortação, e grande número de oráculos são uma mistura ou combinação de duas ou de todas essas três. Exemplos de declaração encontramos em Am 3.1-8, começando com: «Ouvi esta palavra»; Am 9.7 (seguida por uma ameaça); Mq 6.6-8; Is 1.10-17 (seguida por uma exortação). A exprobração é a mais comum das três; sua palavra inicial característica é «Ai» (cf. Is 1.4; 5.8; 28.1; Am 6.1; Mq 2.1; Hc 2.6, etc.). Muitas vezes, ela aparece na forma de uma queixa apresentada diante de um tribunal cósmico, por exemplo, em Is 1.2: «Ouvi, ó céus, e dá ouvidos, ó terra»; e Mq 1.2: «Ouvi, todos os povos, prestai atenção, ó terra e tudo o que ela contém». Outras vezes, a palavra é dirigida diretamente aos acusados e seus crimes denunciados, como preliminar de um decreto de condenação, por exemplo: Am. 8.4-10; Jr 19.3-9; Os 5.1-7. A exortação é, naturalmente, caracterizada pelos verbos no imperativo: «Lavai-vos, purificai-vos» (Is 1.16); «Buscai-me, e vivei» (Am 5.4); algumas vezes é introduzida com um «pelo que» seguido por uma promessa (como em Is 10.24), ou com um «agora pois», e uma negativa seguidos de uma ameaça (Is 28.22).

A ameaça, após uma exprobração, começa, de maneira característica, com as palavras: «Portanto, assim diz Javé» (por exemplo: Am 5.16; Is 1.24), ou com «portanto», «eis que», «verdadeiramente», «então», seguidos por um verbo que expressa a ação que Javé pretende executar (por exemplo: Is 3.17; 5.9; 29.2; Jr 11.22). A promessa começa normalmente assim: «Naquele dia», «eis que vêm dias», «naqueles dias e naquele tempo», «mas nos últimos dias» (Os 2.21; Jr 23.5; 33.15; Mq 4. 1).

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A Substância da Palavra

O elemento comum a esses cinco tipos de oráculos é cada um ser a expressão ou formulação da vontade pessoal e moral de Javé. Ele está presente e confronta seu povo com uma realidade viva, não absolutamente como os objetos religiosos no padrão estático do ritual e do mito, dominante nas religiões contemporâneas e influente no javismo oficial. Os oráculos proféticos injetavam constantemente, na situação religiosa, as exigências morais clamantes de uma divindade ativa e interessada. Eles contribuíram para a vitalidade étieca, exigindo resposta e decisão, e relacionando o presente ao futuro em termos do propósito histórico de Javé e de seu govêrno moral do mundo. Como diz Eissfeldt, o conteúdo da declaração profética é uma comunicação da vontade de Javé a um presente que não pode ser separado do futuro; o futuro não é determinado pelo acaso, mas pela mesma vontade que apresenta essas exigências morais no presente, de modo que o anúncio profético do futuro é um ato justo da vontade de Javé no presente (64).

A comunicação da vontade divina é, ao mesmo tempo, um desvendamento da natureza divina. Javé é santo, terrível, verdadeiro e justo. É zeloso de seu nome e de seu povo, e ciumento, porque não é apenas um entre muitos deuses, mas um diferente tipo de deus. É poderoso, não só como possuidor de misterioso poder sôbre-humano, mas como autor de juízos e livramentos históricos, que são reconhecíveis como atos divinos e não simplesmente como acontecimentos casuais. É livre no decidir e no agir, mas não é caprichoso. No juízo e na misericórdia é coerentemente fiel a si mesmo e ao significado de seu pacto com Israel.

Pronunciar a palavra de tal Deus era, para seu representante, declarar os fatos inexoráveis de qualquer situação dada. O profeta revela a realidade moral e espiritual que há por detrás das aparências, o que é em oposição ao que parece, ao que é perceptível ao nível dos sentidos, ao que é desejado ou temido. Interpreta a experiência presente de seus ouvintes à luz de uma experiência mais ampla; a de seu próprio chamado e comunhão com Javé e a história religiosa de

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seu povo. A natureza, propósito e atividade divinos dão sentido ao passado, importância radical ao presente e significação última ao futuro. Nessas circunstâncias, o oráculo profético é, ao mesmo tempo, uma revelação e um imperativo categórico, uma acusação e um juízo presente, uma palavra de condenação e uma palavra de promessa.

 


 

NOTAS E CITAÇÕES BÍBLICAS

CAPITULO V


(1) Is 6.9.
(2) Am. 7.15, 16.
(3) Jr 1. 7, 9.
(4) 16 6.8.
(5) Jr 1.10.
(6) Num importante artigo no «Journal of Biblical Literature», vol. LIII, pp 199-227.
(7) Cf. II Rs 9.11: «Por que veio a ti este louco?» Os 9.7: «o homem de espirito é um louco».
(8) Gn 41.38; Êx 31.2, 3; Jz 6.34; 15.14; I Sm 19.23, 24; 16.14; Jz 9.23; II Rs 2.16; I Rs . 22.23.
(9) Os 9.7; Jr 5.13; este versículo, tem um trocadilho zombeteiro sôbre a palavra «vento», em hebraico, que também significa «espírito».
(10) Dt 18.15-18. Ver acima, cap. I, p 20.
(11) Cf. Êx 33.11.
(12) Is 1.1ss; 2.1ss; Hc 1.lss. A palavra «ver» significa, aqui «perceber nitidamente», e é, sem dúvida, uma forma tradicional de expressão dos antigos videntes.
(13) Is 6.1,ss; Am 7.1ss.
(14) Is 9.11; Am 7.1, 4, 7; 8.1; Jr 1.9; 23.9; Mq 3.8.
(15) I Rs 19.14.
(16) Em «Pathways to the Reality of God», p 41.
(17) Op. cit., p 214.
(18) Jr 18.21.
(19) Am 7.14, 15; Is 6.1, 8; Os 3.1; Mq 3.8; Jr 1.1-10.
(20) Jr 1.5.
(21) Am 7.2, 5; Jr 27.18; 18.20; 37.3; Is 37.1-4.
(22) Jr 17.15.
(23) Cf. Jr 5.1-9; Os 6.4-7.7; Mq 3.9-12; Am 8.4-10; Is 5.8-16.
(24) Gn 27.27-40; 49.1ss; Dt 33.1ss.
(25) I Sm 25.5. Tradução do autor.
(26) Am 6.10; Os 2.16, 17; Dt 5.11.
(27) Is 9.8; 55.11; Os 6.5.
(28) Mt 8.8.
(29) I Rs 22.6.
(30) Jr 1.9, 10.
(31) Is 7.3; 8.3; Os 1.4, 6, 9.
(32) Am 3.8; 7.14, 15; 5.13.
(33) Jr 20.7.
(34) Jr 20.10.
(35) Cf. Is 9.15; 28.7; Jr 5.31; 14.14; 29.8; Os 9.7; Mq 3.5, 11.
(36) Am 5.15; Jr 32.8.
(37) Am 3. 7.
(38) Cf. Is 30.16; 10.5-17; Am 2.6; 3.2.
(39) Os 1.2; 11.8, 9; Jr 1.5; 15.10-21; Hc 1.12; 2.1-4.
(40) Am 7.2, 5; Is 6.11; Jr 4.19, 20.
(41) Jr 28.5-14.
(42) Am 5.18; 8.9, 10; Sf 1.14-16; J1 2.11.
(43) Jr 12.1-4; He 1.4; 13, 14.
(44) Êx 4.10-12; Jr 1. 7.
(45) Mq 3.8; Jr 6.11.
(46) Jr 16.19.
(47) Cf. Am 1.2; 2.6-8, 13-16; 4.6-12; 5.16-18.
(48) Os 3.1; 6.4; 11.1.
(49) Is 1.2, 26; 30.9-17; Jr 7.2-15, 21-28.
(50) Is 5.20; 1.16, 17, 26; Am 5.14, 15; Os 4.1, 2, 6; 6.6.
(51) Os 4.6, 1.
(52) Is 9.8, 9; Jr 11.18; 31.31-34.
(53) Os 2.19, 20.
(54) I Rs 22.8ss; Jr 26.8, 9, 16-19 Cf. Mq 3.5; Jr 6.14.
(56) Jr 28.
(57) Êx 4.1-9, 17; Jz 6.17-22, 36-40; Jr 1.11-16.
(58) Is 38.7, 8; Js 10.12-14.
(59) I Sm 10.3-7; 2.34; Is 37.30-35; Jr 44.29, 30.
(60) Êx 3.12; cf. Is 7.10-16; Dt 28.45, 46.
(61) Cf. Is 20.1-4; 7.3; 8.3.
(62) Eissfeldt: «Einleitung in das Alte Testament», p 96, não reconhece o primeiro desses tipos, mas ele pode ser nitidamente diferençado dos outros quatro.
(63) Exemplo de parábola temos em Is 5.19 2 (3-7); de elegia, em Is 1.21-23; de lamento, em Am 5.1-3; de cantiga de desdém, em Is 37.22-29; de oração, em Jr 14.7-9, 19-22; de epístola, em Jr 29; de discurso «sapiencial», em Is 28.23-29.
(64) Eissfeldt, op. cit., pp 84, 85.



CAPITULO VI


A TEOLOGIA DOS PROFETAS


Os profetas não eram teólogos. Eram, antes instrumentos conscientes de uma imediata e divina comissão e exigência. Seu Deus era primariamente um subjectum da experiência antes que um objectum do pensamento. Por essa razão pode-se pôr em dúvida se é justo falar de teologia profética. Duas razões podem, no entanto, ser apresentadas a favor de tal posição. A primeira é que poderia ser feita objeção semelhante à discussão da teologia do Novo Testamento, pois os livros do Novo Testamento não são principalmente documentos teológicos, e é impossível derivar deles um sistema de doutrinas completamente consistente e ao mesmo tempo exaustivo. Mas tentar relacionar as idéias religiosas significativas do Novo Testamento numa exposição coerente não fica invalidado pelo fato de os escritores diferirem em ponto de vista e ênfase, e apresentarem evidências de desenvolvimento em teologia e experiência (1).

A segunda consideração é esta: em qualquer afirmação pro-religiosa séria há sempre uma teologia implícita. Se os profetas não apresentam um sistema doutrinário acabado, isso se deve ao fato de receberem sua mensagem em lampejos de revelação. Não são mestres mas, antes, mensageiros que esperam uma resposta. Seus oráculos, porém, não são simplesmente fragmentos confusos e desconexos. Brotando, como brotam, de intensa experiência pessoal da tensão entre a realidade viva de Javé e o mundo da vida humana cotidiana, esses oráculos expressam, em termos do momento, as convicções centrais do profeta quanto à natureza e relação de Deus e do homem. E isso é a essência da teologia. Além disso,

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essas convicções estão quase sempre em tão evidente contraste com a cosmovisão dos contemporâneos do profeta que a teologia implícita tem tal nitidez que só exige coordenação.


Herança e Cumprimento

Os profetas partilhavam com outros israelitas a crença em Javé como o Deus da nação. Javé entrara numa relação peculiar com esse povo, num instante definido do passado; seus atos poderosos tinham dado orientação e sentido à sua história subseqüente, e ele era ainda universalmente reconhecido como a única divindade peculiarmente israelita (2). Não há, nos profetas, em conseqüência, argumentos para provar a existência de Javé, nem quanto a seus atributos de poder e justiça, misericórdia e verdade. Isso era parte de uma tradição religiosa comum (3), embora nunca se tenha tornado tão claro anteriormente. E outras coisas não originárias dela tinham penetrado na tradição, coisas que os profetas foram os primeiros a perceber serem incompatíveis com ela. Contudo, os profetas apelavam para essa tradição comum em suas denúncias e em suas acusações. Israel conhecia de sobra a respeito de Javé. Reconhecia a participação de Javé em seu passado histórico, e professava servi-lo agora no culto dos diferentes santuários. Mas, realmente, não o conhecia como o filho conhece a seu pai, e uma espôsa seu marido, na constante consciência de uma relação íntima, em que correspondesse livre e naturalmente à sua orientação (4). Não o conhecia no presente tanto quanto conhecia a respeito do que ele fizera no passado. Javé tornara-se um personagem da tradição, mais do que um fator na vida, um postulado teológico mais do que uma realidade divina.

Assim, o que encontramos nos profetas é tanto um novo e mais completo ensino acêrca da natureza de Deus, como um novo testemunho da tremenda realidade não reconhecida de sua presença e participação ativa nos assuntos humanos. Os atributos divinos são reafirmados em termos dinâmicos. Javé é ainda o Deus dos pais, conhecido por seu nome, a Rocha e Santo de Israel. É um Deus de glória e terrível poder nos fenômenos naturais e sôbre a humanidade; de propósito inescrutável e firme, onisciente, sábio e justo;

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verdadeiro e fiel, e desejoso de manifestar graça ao povo escolhido para esfera de sua revelação; vigilante e ativo nos momentos cruciais de sua história social. Seu imperativo de obediência é peremptório, e é terrível quando reage contra qualquer resistência à sua vontade. Embora sua presença continue a ser associada de modo especial com Sião e até com Sinai, não mais é uma divindade localizada ou territorial, mas podia mostrar-se a seu povo em qualquer lugar, e sua preocupação ética e poder estendiam-se a outras nações (5).


Deus, o Senhor

Costuma-se dizer que o monoteísmo ético teve sua primeira expressão na religião israelita através dos profetas do oitavo século. Mas isso é mais uma conseqüência do que o conteúdo de sua mensagem; pois o monoteísmo torna-se explícito pela primeira vez na profecia escrita do Segundo Isaías, profeta pó-exílico (6). O caráter incomparável de Javé e sua relação especial com o povo do pacto, somados à vivida experiência que o próprio profeta tinha dele como uma pessoa viva, eram fatos religiosos. Conduziram, inevitavelmente, ao monoteísmo ético, quando, mais tarde, se tornaram o princípio organizador do pensamento religioso. Mas foi a grandeza e gravidade da realidade de Deus, que envolve e dirige a vida e exige uma decisão, a realidade que ardia como fogo nas almas desses homens, como uma luz nas trevas e, ao mesmo tempo, como uma labareda que ameaçava tudo consumir. A palavra «deus» adquiriu novo conteúdo, porque a experiência dos profetas foi tão tremenda e tão íntima que a relação convencional por meio do culto e no santuário, como o culto dos outros deuses, caiu numa categoria completamente diferente. Javé já era formalmente, para Israel, um Deus especial, por causa de sua posição característica como sua divindade peculiar, e por causa dos acontecimentos históricos especiais através dos quais essa relação fôra estabelecida no princípio. De igual modo, pelo menos até certo ponto, Quemôs era o deus único de Moabe. Mas o desafio de Elias: «Se Javé é Deus segui-o; se Baal, segui-o» (7), exigia uma decisão a respeito de algo mais do que uma simples demanda de obediência de deuses rivais. Importava numa decisão quanto ao próprio sentido da palavra

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«deus»; pois Javé não era simplesmente o mais poderoso e o melhor de dois deuses da mesma espécie. Não se lhe fazia honra chamando-o de «deus». Se ele devia ser, em realidade, o «Deus de Israel», o conteúdo do nome tinha que ser redefinido pelo que ele era; e, nesse contexto, Baal não era, absolutamente, deus. Os profetas conheciam a Javé como o Incomparável, que se tornara o Deus de Israel, antes que como uma divindade nacional superior aos outros sêres divinos, mas não essencialmente diferente deles.

O fato único e todo-inclusivo de Deus possuía os profetas em sua experiência do chamado para exercerem a obra de sua vida. Disso derivavam eles seu sentimento urgente de missão. O fato divino era para eles uma presença pessoal com um nome, alguém que defrontava com seu chamado, seu instrumento escolhido. O profeta enchia-se de temor diante da majestade e da consciência de um poder irresistível. Não ficava, porém, apavorado pelo ministério extraterreno ou esmagado pelo poder. Era uma vontade pessoal a exigir sua própria submissão e obediência. Justiça verdade e misericórdia não eram, portanto, conceitos abstratos, mas elementos constitutivos do caráter de Javé e de seu propósito soberano, reclamando a lealdade do profeta como um rei reclama os serviços de seu embaixador (8). Ele conhecia a Javé como uma vontade pessoal que exigia a obediência de Israel, como havia exigido a sua, fator determinante da situação histórica da nação, mesmo quando esta ardia como um fogo na mente do profeta. Era essa mesma vontade que determinava o curso da História, não predeterminando os acontecimentos, mas colocando diante dos homens um estilo de vida que podia ser escolhido ou rejeitado. Javé estava ansioso por derramar bênçãos sôbre um povo que fôsse submisso a seu propósito; e estava também pronto a resistir com inevitável destruição sua recusa e orgulho contumaz.

É com essa vontade apaixonada e reta que o ajuste final deve ser feito, quando os homens ordenam suas vidas e formulam seus planos. Pois não podem aplacar essa vontade com sacrifícios, nem sujeitá-la ao seu contrôle por meios mágicos, pelo mecanismo do culto ou pelo poder político (9). É a vontade de retidão e misericórdia sem a qual o homem não pode viver (10).

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O segundo elemento característico da consciência profética de Deus é a intensidade do sentimento associado com a percepção da presença divina. O «amor» de Deus não é uma idéia que derive seu significado do fato de Deus bondosamente prover em a natureza recursos para a necessidade humana, nem de sua misericordiosa Providência pessoal, embora ambas as coisas estejam incluídas nele . O amor divino é terrível em sua profundidade e tortura. Só nas alturas e profundezas da existência humana pode-se ter um vislumbre do seu significado, como na agonia da devoção não correspondida de um espôso, no sentimento de um pai por seu filho pequeno e por esse mesmo filho quando, já homem feito, se torna um transviado (11). A ira de Javé contra o pecado não é a ira de um juiz defendendo a lei, mas a ira apaixonada de um rei cuja bondade tenha sido ultrajada, de um guardião cujos protegidos inermes tenham sido maltratados. Por isso, o culto formal, que não leva em conta a natureza real de Javé e não agita as profundezas da vida, é rejeitado por Deus, não com indiferente desdém, mas com a repulsa de alguém cujo ser é ultrajado. Não há angústia comparável à sua angústia, pois indignação e piedade se digladiam no coração de Deus. A execução de seus juizos signifíca a morte da esperança. Sentimento tão intenso pode, por um instante, até desviar a operação da vontade de Javé, de modo que ele muda de propósito em resultado da intercessão do profeta com respeito a um juizo particular (12). Mas, no fim, sua vontade reta prevalecerá a qualquer custo pois ela nada mais é que Ele mesmo.

O terceiro elemento importante na apreensão profética de Deus está intimamente relacionado com os outros dois primeiros. Javé é um ser de tal natureza que se torna participante ativo e interessado em tudo que acontece entre os homens. Embora seja ele o Senhor da natureza, é como Senhor da História e da experiência comum que sua natureza pode ser mais nitidamente distinguida e mais claramente compreendida. Ele não é uma estrutura cósmica estática de beleza, verdade e bondade, nem uma fôrça impessoal que favorece a retidão através da imposição mecânica da lei moral. Primeiro, e antes de tudo, Javé é caracterizado por qualidades pessoais dinâmicas, é um participante na vida. É conhe-

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cido por meio de seus atos e neles. É um «Agente» antes que um «Ente» estático (13). É a retidão em ação. Contudo, sua retidão não pode ser compreendida a não ser no comportamento e nas relações dos homens, por intermédio da escolha consciente deles. Por isso é que Ele se revela, realmente, não em palavras santas, êxtase místico ou fenômenos materiais, mas no fundamento moral da experiência. Os homens discernem a presença de Deus nas escolhas e decisões éticas que devem fazer, e em virtude das quais ele é uma pessoa moralmente consciente e responsável. E desde que a experiência consciente é para o indivíduo o que a História é para a nação, isto é, a esfera das decisões morais, Javé torna-se conhecido na experiência pessoal e na História de um modo como não pode ser conhecido claramente por nenhum outro meio. Aqui Ele é único, sozinho em sua exaltação, universal em sua manifestação (14).

Daí, a importância suprema para os profetas do chamado que lhes veio individualmente, e da tradição da história do povo do pacto, à qual aludem constantemente (15). Na relação do homem com Deus, o caráter e comportamento de ambas as partes é o fator fundamental. Nenhum conhecimento especializado do sacerdote pode sanar a brecha em outro ponto; nenhum culto pode aproximar Deus e povo em termos impessoais; nenhuma oferenda amoral pode servir como substituto para tornar desnecessário sanar a brecha. Javé é alguém que quer, sente, conhece, fala e age, aqui e agora. É só com Ele, e com Ele como Ele é, realmente, que o homem tem de avir-se. «Acaso sou Deus apenas de perto, diz o Senhor, e não também de longe? Ocultar-se-ia alguém em esconderijos, de modo que eu não o veja? diz o Senhor; porventura não encho eu os céus e a terra? diz o Senhor» (16).

Deus está perto, mas está também longe, imensuravelmente exaltado, inexprimivelmente diferente. Ele é o rei que não morre (17). O fato de relacionar-se com os homens, como se fôsse um homem, e a linguagem da experiência humana usada para descrever isso são, provavelmente, necessários para a apreensão humana da divindade. Mas, «Eu sou Deus e não homem, o Santo no meio de ti» (18). A pala-

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vra «santo» mostra o abismo entre o homem e Deus, entre o fraco e o poderoso, entre o familiar e o misterioso, entre o efêmero e o eterno. Mas a «santidade» de Javé tem a peculiaridade de seu próprio caráter. É a glória e majestade moral de sua pessoa, cuja vontade justa se fêz conhecida, e cujo poder abarca a totalidade da vida no cumprimento de seus propósitos. «Javé dos Exércitos é exaltado em juízo; e Deus, o Santo, mostra sua divindade pela justiça» (19). O fato divino apequena todos os outros fatos com que os homens se preocupam. É uma glória tremenda, terrível, que só uma cegueira moral total pode esconder dos homens, e da qual, quando a vêem, não lhe podem escapar. A terra está cheia da glória de sua presença; os fins da terra tremem à repreensão de Javé. Ele é o Deus de toda carne, pois é o Criador e o Senhor de tudo (20).

Diante desse Senhor da Vida, desse «Outro», que é soberano, o orgulho do homem deve ser abatido, a vacuidade de suas pretensões reveladas, suas satisfações morais devem ser dissolvidas como fumo, seus impérios cair em ruínas. Pois o próprio Javé é a única fôrça e vitalidade de seu povo, a realidade da justiça social que mantém a estrutura da sociedade, o cerne da vida pessoal, seu princípio espiritual, seu arcabouço moral (21). Só ele é grande, sábio, santo. Sua divindade soberana ele não a divide com nenhuns outros deuses, nem mesmo quando sejam considerados inferiores. «Ela não soube que eu aqui lhe dei o grão, e o vinho, e o alho, e lhe multipliquei a prata e o ouro, que eles usaram para Baal» (22). Javé é sozinho porque é único, e é um porque abarca a vida em seu contexto total. Maravilhas e desastres são seus feitos, pois é Ele quem tudo controla. Só ele pode exigir a obediência do homem, que significa conformar-se à sua realidade. Javé é Senhor.


O Homem e Seu Mundo

O pensamento dos profetas centraliza-se em Deus a tal ponto que o que têm para dizer sôbre a natureza do homem é, em grande parte, por meio de contraste. Assim como Javé é «Deus e não homem», o homem é «carne e não espírito» (23). A vida da carne é a vida da experiência ordi-

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nária e das satisfações físicas; inerentemente fraca, e sujeita à corrupção e morte (24). O «Espírito», por outro lado, não é um elemento constitutivo da natureza humana; é uma fonte misteriosa de poder que se intromete na experiência humana vindo do lado divino. Nesse ponto, os profetas falavam a linguagem de seu tempo. Sua própria contribuição foi mostrar que Deus tinha de ser distinguido do homem, não só como o Espírito Supremo, mas como o eticamente exaltado. A experiência de Isaías no templo foi, indubitavelmente, o que Otto chamava uma experiência «numinosa», mas culminou numa percepção da absoluta diferença qualitativa, de uma brecha que só Deus podia sanar, e isso em termos morais.

Os hebreus consideravam o homem como um corpo animado antes que como uma alma encarnada. A vida é um sôpro vital, e quando o fôlego deixa o corpo, o homem real não existe mais. Pois na sepultura, ou Sheol, em que ele é congregado a seus pais, sua sombra continua um pouco mais do que o eco e memória de um homem cuja imortalidade real está em sua posteridade (25). A própria vida é um dom de Javé, e é intenção de Javé que o homem, prestando-lhe obediência, encontre satisfação nessa vida e coma «o melhor da terra» (26). A vida consciente do homem é um complexo de sentimento, vontade e entendimento. Ele tem «rins e coração» (27), isto é, emoções e volições conscientes. Pode planejar e executar seus propósitos, embora sempre sujeito à imprevisibilidade do futuro e possível intervenção de Deus (28). Não há distinção abstrata entre pensar e fazer. Ambos são expressões do intento do coracão do homem, e por suas maneiras e atos ele mostra o que é em si mesmo (29). O mais alto poder humano é a capacidade de distinguir o bem do mal, e de conhecer a Deus, confiar nele e obedecer-lhe (30). Essa capacidade pode ser atrofiada por desvirtuamento ou falta de uso, de modo que o homem torna-se eticamente moribundo e céptico, cego e surdo e empedernido, até que a verdade e a realidade de Deus não possam mais encontrar qualquer meio de entrar em sua experiência (31).

O sentimento tradicional de família e de solidariedade tribal persistiu também no pensamento dos profetas, embora

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fôsse através de experiências individuais intensas, como as de Oséias e de Jeremias, que uma compreensão da integridade, liberdade e responsabilidade do indivíduo iria emergir ao lado da consciência social. O homem é o que é dentro de um complexo de relações sociais. É filho, irmão, marido, pai, vizinho; mas a importância do grupo continua essencial. A nação em sua estrutura interna é idealmente uma família. Em relação com outras nações e com seu Deus, ela é um «povo», ou unidade corporativa, com uma personalidade corporativa própria (32). Não era uma simples metáfora poética de Isaías falar da «filha de Sião», nem atacavam os profetas uma abstração quando repreendiam a nação por seus pecados. A nação, como tal, tinha recebido a revelação de Javé, e tinha entrado no pacto com ele; a nação, como tal, tinha adotado um modo de vida que expressava a orientação central de sua vida tão claramente quanto os hábitos de um indivíduo. Isaías sentiu-se impuro como membro de um povo impuro; Miquéias lamentava a desgraça do povo como sua própria. Jeremias ouvia e juntava-se ao lamento de Raquel, a mãe tribal, por seus filhos que estavam unidos em sua vida que continuava (33).

A condição moral do homem como os profetas o conheciam era vista no «objetivo da vida», definido pelo padrão e pelos métodos da sociedade em que ele vivia. Esse objetivo, como eles ouviam, era a continuação por todos os meios, da vida da carne, o incremento das suas satisfações, e o escape ou adiamento de seu fim na morte do indivíduo e na dissolução da sociedade. O homem comprazia-se nas satisfações materiais e sensuais da vida; desejava sua plenitude expressa em idade, honra, prosperidade e descendência. Procura por meio de rituais aumentar a fertilidade de sua família, de suas terras e rebanhos, e assegurar-se da ajuda divina para prosperidade de seus empreendimentos. Procurava, além disso, tornar sua própria vida segura apropriando-se de um quinhão tão grande quanto possível da abundância da natureza e da riqueza produzida pela comunidade. Por sua força, sua astúcia e sua avidez, o homem exaltava-se no mundo, tornava-se vaidoso de sua auto-suficiência e media a vida somente por seus desejos. Não reconhecia a Javé como o é,

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doador de todas as boas dádivas, nem se afligia com a dor de Javé por causa do sofrimento de seu semelhante (34).

O que era verdade a respeito do indivíduo era-o também a respeito da nação. A figura da sociedade israelita tão claramente pintada nos livros proféticos é a de um povo entregue ao seu modo pagão de vida, porque na realidade seu objetivo era um objetivo pagão. A nação tinha seu coração pôsto na riqueza e nos grandes edifícios de suas cidades, em seu poder militar e alianças políticas, no luxo de seus cortesãos e no complicado de seus santuários. Rei e príncipes, juizes e oficiais militares, sacerdotes e profetas oficiais, formavam juntos a tessitura humana da estrutura social -- seus sustentáculos, como pão e água os sustentáculos da vida (35). A comunidade não via que participava da instabilidade dos líderes que estavam mais preocupados com os privilégios do que com as responsabilidades; visto que os fundamentos da sociedade tinham sido minados pela corrupção da justiça e o abandono da verdade e misericórdia, essa estrutura humana deveria ruir como uma estrutura de cêra diante do fogo (36). As instituições sociais que eram consideradas necessárias à existência e bom nome nacionais não eram de fato o que produzia, de um aglomerado de homens, um povo. Só quando elas fôssem retiradas eles aprenderiam que os elementos de família e uma ética de solidariedade radicada na religião são indispensáveis a um povo.

A atitude básica do homem era, assim, de confiança otimista em si mesmo e no modo de vida que tinha organizado para garantir suas satisfações. Sentia-se autônomo. Estava certo de que o exercício do poder social segundo a maneira das outras nações, somado ao favor divino garantido por muitos e custosos sacrifícios, eram bastantes para alcançar seus fins. Recusava-se a enfrentar os fatos do sofrimento humano e da degeneração social, ou crer que as calamidades que vinham fôssem prenúncios de uma desgraça final. Punha no mundo de sua própria construção a confiança devida exclusivamente a Javé, o Criador do céu, da terra e dos homens. Pois no mais íntimo do seu ser acreditava que quem estava no controle era ele, não Javé. Os outros deuses que ele reconhecia como divindades reais embora subordinadas a

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Javé, eram símbolos adequados de sua auto-suficiência. Esses deuses também tinham sido feitos pelas suas mãos, assim como as cidades em que seus santuários orgulhosos eram construidos. «Os teus deuses, ó Judá, são tantos como as tuas cidades» (37).


Revelação e Mandamento

Os profetas reconheciam que a confiança do homem em seu modo de vida é necessária à sua vitalidade, e que a perda de confiança pode provocar colapso e dissolução. O devotamento do homem devia, portanto, ser alguma coisa segura e permanente. Os profetas não se contentavam, por conseguinte, em denunciar pecados particulares contra o pacto de Javé; lutavam também pelo reconhecimento da instabilidade inerente de uma sociedade antropocêntrica e pela transferência da confiança a um novo centro -- a revelação pessoal e o mandamento de Javé. A religião para a qual Javé fôsse apenas um nome ou uma tradição era ineficaz. Estava mundos de distância da esmagadora apreensão profética de Deus como um partidário presente ativo na vida. Embora não fossem capazes de levar seus auditórios (exceto, talvez, pequenos grupos de discípulos) a partilharem esse modo de ver, apelavam continuamente para os fatos reconhecidos da tradição religiosa nacional, para as obrigações morais do pacto, para o que significava para um povo pecaminoso as calamidades que já lhe tinham sobrevindo (38).

A possibilidade de revelação não é demonstrada; é tomada como um pressuposto. Os mensageiros de Javé pisavam em terreno comum com seus ouvintes quando se referiam a ele como um Deus que se revelara supremamente a Israel em certas grandes ocasiões do passado, e que de tempo em tempo comunicava ainda sua vontade por meio do oráculo sacerdotal e da palavra profética. A questão em foco era se profetas particulares, em ocasiões particulares, tinham uma palavra autêntica, ou falavam apenas «as visões de seu coração, não o que vem da boca do Senhor». Se o profeta Ananias tinha uma revelação genuína, Jeremias se enganara; e

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certo de que aqueles que negavam que a desgraça a estava iminente eram falsos profetas. Pois ele mesmo repetiria com gosto a negação deles; não o podia fazer, pois o confrontava uma vontade mais forte do que seu desejo. O poder que compelia um profeta a falar o que não desejaria, o enchia com a certeza absoluta quando apontava para o pecado que estava destruindo seu povo, clarificava sua percepção espiritual de modo que ele discernisse o desdobramento de um propósito moral consistente, e lhe dava um senso de missão que nem a indiferença nem a oposição podiam destruir -- era um poder semelhante a um fogo interior, tão real quanto sua própria existência (40).

Sua mensagem brotava espontaneamente como de um cadinho onde sua vida estava fundida com a vida de seu povo, pela poderosa chama da santa vontade de Deus. Um clarão de discernimento desvendava, ocasionalmente, em acontecimentos de outro modo triviais um significado coincidente com o propósito de Javé, de modo que estes se tornavam «sinais» (41). O propósito de Javé estava evidente na conexão, visível à consciência moral, entre os pecados da comunidade e as calamidades que ela experimentava. Sua presença era sentida na compulsão de falar, mesmo contra o desejo do próprio profeta, e seu conteúdo era conhecido por meio da tradição «profética» das características éticas de Javé.

A revelação era, assim, parte experiência presente, parte elemento objetivo na tradição histórica. Encontrava seu lugar até no culto (42). O nome de Moisés é, de fato, citado só por Jeremias (a menos que Mq 6.4 seja original), entre os profetas pré-exílicos. Mas há alusões bem numerosas ao período do Êxodo, da peregrinação no deserto e da Conquista, como a época em que Israel foi constituído o povo de Javé numa relação especial de obrigação mútua (43). Por causa desse conhecimento adquirido na revelação e experiência passadas, Israel dizia conhecer seu Deus e gozar privilégios especiais. O que Oséias enfatizou é que Israel não conhece a Javé como realidade presente e como fator vital em sua crença e comportamento. O significado não se liga às palavras que já haviam perdido sua relevância. A promessa

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de Isaías de que Javé defenderia Jerusalém tornara-se um fetiche, uma palavra, enganosa, quando citada, um século mais tarde, nas circunstâncias modificadas do tempo de Jeremias. Além do mais, a confiança em tal promessa de Javé perde seu sentido, já que suas exigências éticas primárias estão sendo desprezadas: «Furtais e matais, cometeis adultério e jurais falsamente, queimais incenso a Baal e andais após outros deuses que não conheceis, e depois vindes e vos pondes diante de mim nesta casa, que se chama pelo meu nome, e dizeis: estamos salvos» (44).

A referência aqui ao Decálogo de Êx 20 e Dt 5 é clara. O que quer que se afirme quanto à antiguidade de qualquer das diferentes formas do Decálogo (45), tal sumário semelhante ao das exigências primárias do culto de Javé parece ter sido parte do ritual do templo desde os tempos primitivos, provavelmente na forma de uma liturgia de acesso (46). Seja como fôr, o culto de Javé tinha certas associações éticas definidas que eram aceitas como derivadas de antigas revelações.

Em adição a isso, havia a lembrança de uma sucessão de líderes nacionais e testemunhas proféticas que tinham mantido a continuidade da tradição religiosa nacional até o presente (47). Os representantes dessa sucessão no tempo de Jeremias eram os profetas populares. Constituíam um elemento aceito na sociedade, e seu direito de serem ouvidos pressupõe um reconhecimento de seus precursores como se encontra em Jr 26.17ss. Que Javé se tinha revelado no princípio e repetidas vezes desde então, era geralmente aceito como fato. Contudo, não foi somente por meio da palavra profética, que se acreditava haver vindo essa revelação. Os sacerdotes declaravam a vontade de Javé pelo uso da sorte sagrada (48) e nas toroth (decisões, ensinos), dadas em respostas a consultas particulares. «Os Sábios» formulavam suas reflexões religiosas na base da experiência. O teste pragmático aplicável até ao ensino profético habilitava a que se aceitasse emergente verdade como revelação, visto que o próprio Javé iluminava a mente do homem, e era a fonte de toda a verdade (49).

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Há esta distinção, porém, entre a revelação por intermédio dos profetas e a revelação por intermédio dos sacerdotes e mestres sapienciais. No primeiro caso, a iniciativa estava com Javé e a essência da revelação era o chamado e um mandamento (50). Estamos falando aqui dos profetas cujas palavras se tornaram canônicas porque foram validadas na experiência e pela História. O mesmo critério distingue-os dos «falsos profetas», que não chamavam os homens à obediência, mas procuravam expressar com poder mântico o desejo humano de vitória e bem-estar e garantir, assim, que isso aconteceria (51). Na mais famosa das afirmações proféticas, Miquéias declara as exigências essenciais do javismo serem ação justa e misericordiosa para com os homens e obediência humilde a Deus. Exige-se confiança em Javé e, para ouvir e aceitar a própria exigência, é preciso fé. Além isso, conformidade com o caminho reto exige arrependimeno do mau caminho do orgulho e da gratificação pessoal. A religião torna-se correspondência dentro de uma relação divino-humana, pessoal em seus termos (53). Isso aponta para um alto nível de revelação não dantes atingido, quando a vontade de Javé estiver escrita na mente dos homens como uma lei sôbre tábuas de pedra. Então, a obediência a ele será uma resposta espontânea à realidade divina cuja natureza é conhecida imediata e claramente, de modo que não haverá mais necessidade de ensino externo a respeito de Javé e de seus mandamentos (53).

Uma segunda diferença importante entre a revelação por intermédio das palavras proféticas e a revelação por intermédio dos sacerdotes e dos sábios é esta: a última era uma ampliação do corpo do conhecimento religioso numa situação relativamente estática, permanente; a primeira, era uma mensagem momentosa que exigia ação, e dava sentido e importância especiais ao tempo e situação em que era proferida. Para os sacerdotes e os sábios, Deus era o Eterno e Imutável; para os profetas ele manifestava a sua vontade pessoal de maneira especial, num momento particular. Os primeiros podem ser considerados meios de uma «revelação geral», os últimos, meios de uma automanifestação específica e única à luz da qual o contexto total da vida deve ser com-

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preendido. «Javé, que é o tema da profecia hebraica, é primariamente o Senhor da História. Ele é o Senhor da Natureza, também, mas... o interesse na atividade criadora de Javé é subordinado ao interesse em sua obra redentora. Deus não é descrito em termos metafísicos, como ele é em si mesmo. Os profetas dão testemunho dele como o grande Invasor dos assuntos humanos» (54).


Eleição e Pacto

A doutrina de que Israel era um povo escolhido de Deus, como Eichrodt aponta (55), deve ser compreendida como uma expressão da relação historicamente condicionada de Javé com sua comunidade. Essa relação é deliberadamente distinguida de qualquer vínculo natural ou físico, que, sendo permanente, não daria nenhum significado especial ao tempo. Fé no ato divino de escolha num momento particular da história, por outro lado, dá ao tempo significado especial, como o contexto da ação divina e da resposta moral humana. Isso imprime também comêço e direção à História. A revelação é, assim, particularizada e tornada concreta sem limitar de nenhum modo sua universalidade e validez permanente. A insistência de Israel com respeito à sua eleição afirma o fato de uma revelação dentro da história real de uma comunidade permanente A manifestação pessoal de Deus a homens vivos começa, necessariamente, num ponto do espaço e do tempo. Isso empresta importância real a lugares (Sinai, Sião e as encostas de Técoa) e a ocasiões. Mas essa importância é condicionada pela resposta permanente à revelação. Fora da resposta moral presente, os tempos e lugares de revelação relembrados na tradição já não têm qualquer significação real. O povo, também, pelo simples fato de serem filhos de seus pais não tem qualquer «status» especial: «Destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão» (55a).

A doutrina vétero-testamentária da eleição e do pacto é, portanto, uma afirmação histórica de fato, embora seja um fato que deve ser aceito pela fé, e que de outra maneira não tem sentido. Ela declara que aconteceu a Israel uma experiência histórica real de livramento divino, associada com

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uma manifestação pessoal de Deus e um chamado à obediência a Ele. Isso é uma filosofia da História (ou antes, uma teologia da História), que encontra seus elementos constitutivos nas experiências dos clãs israelitas ao tempo do Êxodo como essas experiências vieram a ser interpretadas pela intuição religiosa. Não se pode provar que ela se originou com Moisés, pois o Pentateuco não nos fornece documentos históricos primários. Mas parece não haver outra causa suficiente para explicar sua existência antes do oitavo século. E os escritos dos profetas são evidência de que eles não deram origem à doutrina. Falam de uma sucessão de testemunhas, como eles mesmos, que tinham dado continuação a uma tradição que se originara no período criador do Êxodo, da peregrinação no deserto e da entrada na terra de Javé (56).

Nessa conexão, falam de Javé como Criador e Salvador da nação. No Sinai, Israel tornou-se o povo de Javé e ele tornou-se seu Deus. Por meio das experiências definitivas daquele período as tribos foram constituídas em um povo, uma só «família», cuja unidade surgiu de uma nova e especial relação com essa divindade com seu caráter peculiar. Tendo sua origem num tempo e lugar particulares, essa era uma revelação de escolha e resposta deliberadas por ambas as partes ao pacto em que ela foi formulada. Os termos do pacto (que era o vínculo de união), especificavam uma norma ética de vida comunitária correspondendo às características de Javé profundamente distintivas. As obrigações primárias aceitas por Israel foram as de lealdade e obediência. Essas se expressariam em culto exclusivo desse Deus único da nação, na atenção aos seus mensageiros e na fiel encarnação de seus padrões éticos na vida social.

Que essa era a doutrina profética do pacto é evidente de suas repetidas denúncias do culto sincretista e da corrupção social como desvios de uma obrigação ético-religiosa teoricamente reconhecida. Esses são vistos como perversões grotescas e antinaturais de relação com Javé. A orgulhosa auto-suficiência daqueles que detinham o poder e da própria política nacional, era rebelião, não obediência; assinalava a escolha do caminho do mundo em vez do caminho do pacto. Não existia aquele genuíno conhecimento íntimo de Javé, que

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era essencial. O pacto exigia uma vida de real comunhão, e não podia ser considerado simplesmente como um contrato formal, conferindo a Israel um «status» e uma reivindicação sôbre Deus. Se é que havia de permanecer em vigor, e consciente da vida do povo. Mesmo a experiência cumulativa da história, em que castigo e restauração testificavam a paciência de Javé tanto quanto de sua justiça, não oferecia garantia de que ele continuaria indefinidamente a tolerar as violações do pacto. Chegou-se a um ponto em que a relação já não era real. Só os vínculos da tradição e do culto não poderiam mantê-la viva, pois ela constava de uma relação vital e não simplesmente formal.

Viesse Israel a deixar de servir ao propósito divino, nada haveria, em conseqüência, de necessário ou final a respeito de sua eleição. Ela não poderia ser transformada num dogma teológico. A divindade única, Javé, em sua liberdade soberana tinha escolhido a Israel para ser instrumento de sua auto-revelação. Israel tinha recebido o privilégio e tinha sido preservado nos momentos decisivos a fim de ser o instrumento de seu propósito. Mas esse propósito não estava irrevogavelmente prêso à sobrevivência histórica dessa nação. «Não sois vós para mim, ó filhos de Israel, como os filhos dos etíopes? diz o Senhor. Não fiz eu subir a Israel da terra do Egito, e de Caftor os filisteus, e de Quir os sírios?» (57). A eleição de Israel poderia ser anulada por seu próprio ato. Javé poderia mostrar sua natureza e vontade tanto pela rejeição de seu povo agora quanto pela escolha original dele para apreender sua natureza e obedecer à sua vontade. A nação pecadora seria destruída sem exceção; ela se destruiria a si mesma. Pois, a falsa noção de privilégio incondicional tinha-se transformado em orgulho nacionalista, alimentado por uma rememoração superficial dos anteriores livramentos de Javé, a qual ignorava o propósito ético deles.

O fato de Israel ter repetidas vezes violado o pacto no passado sem ter sido abandonado por seu Deus, é atribuído pelos profetas à misericórdia dele, à sua paciência e persistência. Ser longânimo é da natureza dele. Seu propósito de manifestar sua bondade e completar a criação de um povo fiel não pode ser frustrado. Mas sua integridade não pode

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ser ultrajada para sempre. A persistência de Israel em seus maus caminhos levou o povo a uma condição em que não era mais capaz de corresponder. Estava à beira da desgraça, que a infidelidade final tornara inevitável.

O castigo da nação, porem, não era a destruição do pacto. De duas maneiras notáveis os profetas afirmam sua certeza de que o propósito que Javé tinha era de criar um povo para si mesmo e como ele mesmo haveria de triunfar no final. O ensino de Isaías a respeito do «Remanescente» e a proclamação do Novo Pacto por Jeremias são doutrinas escatológicas (58). Esse reconhecimento genuíno e espontâneo de Javé na vida comum que deveria de ter sido a essência do Velho Pacto, e do qual a nação empírica tinha-se demonstrado incapaz, deve no fim ser realizado, porque Javé é Deus. Isaías viu o comêço disso no pequeno círculo de seus discípulos. Jeremias, aparentemente em resultado de sua experiênria desapontadora com a reforma de Josias, aprendeu como Paulo que, o que a Lei não poderia fazer, Deus poderia e portanto havia de fazer. O Novo Pacto era o cumprimento do pacto mosaico tal como os profetas entendiam seu significado central: o conhecimento real e experimental de Deus, que se tornara o poder criador e a norma da vida humana.


Pecado e Julgamento

Uma das contribuições de maior importância dos grandes profetas é sua redefinição de pecado, e, o sentido de tremenda realidade de que eles o investem. A natureza do pecado é definida pela natureza da divindade contra a qual se peca. Sua seriedade é medida pela sua importancia real no pensamento e na vida dos seus adoradores professos. O pecado pertence à área da experiência que é o ponto de encontro do homem com Deus. Se a natureza de Deus for concebida por tal maneira que ele seja considerado suficiente satisfeito com oferendas e honras litúrgicas meticulosamente executadas, então uma falha aqui destrói a relação normal, e é pecado. Esse é o estágio e tipo de religião representado nestas palavras de Davi a Saul: «Se é o Senhor que te incita contra mim, aceite ele a oferta de manjares» (59). É um estágio do qual as religiões do Antigo Oriente, exceto Israel, nunca saíram realmente.

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Mas se religião for essencialmente uma relação entre um Deus que fala e age e uma comunidade cujo papel é ouvir e obedecer com confiança e lealdade, pecado será, então, qualquer ato ou atitude (ou qualquer falha) do homem que rompe essa relação. Pode ser uma transgressão com respeito a obrigações culturais, se por ela se der deliberada expressão a deslealdade para com a divindade; notemos que o sentido do primeiro mandamento é, provavelmente, o seguinte: «Não terás imagens de outro deus em meu santuário». Mas o culto no santuário é para os profetas apenas um dos aspectos, e não o mais importante, da relação entre Javé e seu povo. Contar exclusivamente com ele é conceber errôneamente a natureza de Javé e a conseqüente qualidade pessoal e histórica da relação. O próprio culto pode tornar-se, assim, um pecado, se deixa de expressar a genuína lealdade a Javé somente, a qual é a exigência fundamental. Essa se demonstra pela lealdade ao seu pacto característico com suas obrigações sociais, e sagradas, pela confiança nele e pela obediência à palavra de seus mensageiros. Pecado é deslealdade, infidelidade, desconfiança, orgulho auto-suficiente, desobediência. Sua raiz é um cepticismo total a respeito da realidade da presença e do poder de Javé, ou numa concepção totalmente errônea de sua natureza, que torna impossível qualquer comunhão e associação efetiva com ele.

É digno de nota que no longo catálogo de pecados atribuídos a seu povo, os profetas pré-exílicos poucas vezes, se é que jamais o fazem, descrevem pecados contra lugares santos, pessoas santas e coisas santas como pecados contra o Deus de quem derivam seu caráter sagrado. Em vez disso, as observâncias religiosas são julgadas pelos padrões morais aplicados em todas as outras áreas da vida do povo, pois os padrões morais são os padrões religiosos. O único pecado
especificamente dirigido contra Javé é a idolatria, a idolatria franca do politeísmo e seu culto de imagens e a idolatria disfarçada que usava o nome de Javé num culto. cuja forma e qualidade faziam dele, na realidade, o culto de Baal. Quanto ao resto, os pecados contra os quais os profetas investem são pecados contra os homens. Mas eles são pecados contra Deus também, porque os homens estão dentro do seu pacto.

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os pecados particulares mencionados constituem uma deplorável lista característica das sociedades humanas não regeneradas, em geral: traição, exploração, opressão, crueldade, luta odienta, cobiça de dinheiro, luxúria e poder, desonestidade, justiça venal, mentira, violência, assassínio. O princípio que lhes subjaz é repetidas vezes definido como desobediência, rebelião, alienação de Deus, amor ao mal. A condição espiritual resultante é corrupção, perversão, instabilidade, endurecimento, degeneração. O pecado é uma maneira de vida concreta. Os termos usados são sugestivos: «ra» e «resha» denotam um estado de iniqüidade habitual; «awon», culpa, mal inerente; «resha» transgressão deliberada de um mandamento ou padrão moral conhecidos, «hattath», apostasia do bem. Todos são usados a respeito dessa condição de culpa e alienação de Deus, que se expressa no estado mental ou numa maneira de viver: «O 'hattath' de Judá está escrito na tábua do seu coração»; «Estou cheio do poder do espírito do Senhor para declarar a Jacó a sua 'pesha' e a Israel o seu 'hattath'» (60). O mau propósito e suas conseqüências concretas vão sempre juntos (61).

O pecado era, assim, nítida e profundamente distinguido das faltas cultuais. A impureza ritual podia ser resultado de atos de comissão ou de omissão, ser conseqüência de inadvertência ou de certos acontecimentos naturais que introduzem a pessoa na área do tabu. Meios rituais eram prescritos para remover a condição e o estigma que impediam o acesso às coisas ritualmente «santas». Embora o pecado fôsse considerado pelos profetas de um ponto de vista radicalmente ético, havia esta analogia entre ele e a falta ritual: era também uma condição do homem contrário à «santidade» de Javé. Pois a «santidade» dele tinha-se tornado para eles algo mais do que o simples poder misterioso e perigoso da divindade. Tinha adquirido a qualidade da personalidade ética de Javé. Pecado é mais, portanto, do que a soma de atos errados. É um estado de impureza moral que resulta de tais atos e que os produz.

Nada que o homem faça alterará automaticamente essa condição, embora o voltar-se ele arrependido para Deus abra

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o caminho para o perdão divino. Mas Deus deve agir, seja punindo seja restaurando. Sem isso nenhum sacerdote pode absolver o pecador, nem elaborados atos rituais de penitência da comunidade -- jejum, sacrifícios e oração -- podem compensar, perante Javé, a desobediência da comunidade, ou produzir mudança no conceito que Ele faz dela. E, ainda menos, podem riqueza, poder, ou alianças militares prover uma segurança substitutiva contra a deletéria corrupção do pecado. É certo que falso arrependimento, confiança num dogma formal da eleição do qual qualquer realidade se tenha evaporado, são inúteis no trato com a terrível realidade do pecado (62).

O pleno horror dessa realidade é simbolizado na linguagem profética pela revolta da própria natureza contra a impureza do homem: «Até quando estará de luto a terra?... Por causa da maldade dos que habitam nela perecem os animais e as aves» (63). «Espantai-vos disto ó céus, e horrorizaivos!» A perversidade antinatural de Israel coloca-o na escala moral abaixo dos animais irracionais: «O boi conhece o seu possuidor, e o jumento o dono da sua manjedoura; mas Israel não tem conhecimento, e o meu povo não entende» (64). As nações pagãs, cujos deuses não poderiam ser comparados com Javé, não tinham agido como Israel: «Houve alguma nação que trocasse os seus deuses, posto que não eram deuses? Todavia o meu povo trocou a sua glória por aquilo que é de nenhum proveito» (65). As mais elementares distinções morais tornaram-se indistintas. Os homens chamam o mal bem e o bem, mal. A perversão da justiça é tão fantástica e antinatural como se os homens tivessem decidido arar o mar com bois (66). É um puro horror para o profeta compreender que o povo gosta desse estado de coisas. Tão submersos estão no torpor espiritual que perderam a capacidade de reação espiritual e de responsabilidade moral. Estão decrépitos de velhice, incuravelmente enfermos, transviados, perdidos. Com o apodrecimento do vínculo social da confiança mútua, na vida, e em Deus, a nação se desintegra (67).

Por quê? Porque, no mundo governado por Javé, eles provocaram inevitável punição sôbre si mesmos. Foram eles que o fizeram, mas trata-se também de um ato dele, efeito

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de sua presença não reconhecida: «Eis que eu os acrisolarei e os provarei; porque de que outra maneira procederia eu com a filha de meu povo?» «Portanto para Efraim serei como a traça» (68). Deve vir um juizo que há de ser não só justo mas adequado: «Antes dizeis: Não, sôbre cavalos ligeiros cavalgaremos; sim, ligeiros serão os vossos perseguidores»; «Sim, levastes Sicute, vosso rei, Quium, vossa imagem, e o vosso Deus estrêla; por isto vos desterrarei para além de Damasco»; «Será que em lugar de perfume haverá podridão, e por cinta, corda, em lugar de encrespadura de cabelos, calvície, e em lugar de vestes suntuosas, cilício»; «Porque semeiam ventos e segarão tormentas» (69).

Somente a tremenda seriedade do pecado aos olhos de Javé pode explicar a terrível violência de sua reação contra ele. Sua indignação é um sentimento de ira provocada e revoltada: «como ursa, roubada de seus filhos, eu os atacarei». Javé julgará e recompensará. Os israelitas não precisam esperar nenhuma compaixão especial; seu Deus estará surdo não só às orações deles, mas até à intercessão dos profetas a seu favor (70). O grande terror do dia do juizo é descrito em linguagem inesquecível: «Então os homens se meterão nas cavernas das rochas e nos buracos da terra, ante o terror do Senhor e a glória da sua majestade»; «E o mais corajoso entre os valentes fugirá nu naquele dia»; «Aquele dia é dia de indignação, dia de angústia, e dia de alvorôço e desolação. dia de escuridão e negrume, dia de nuvens e densas trevas, dia de trombeta e de rebate porque certamente fará destruição total e repentina de todos os moradores da terra» (71).

Não pode haver escapatória, exceto por uma misericórdia acima do pacto, desse destino que Israel cavou para si mesmo. O povo de Javé foi reunido perante as nações, e o céu e a terra foram chamados para testemunhar que o juízo contra ele é justo. Javé envia-lhes suas testemunhas, mas há pouca esperança de que o povo se arrependerá antes que a desgraça sobrevenha. Já está demasiado endurecido e a mensagem só pode confirmá-lo em seu caminho de rebeldia e colocar em alto relêvo sua persistente rejeição da vontade de Javé. A desolação, o exílio e a quase extinção devem vir para

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acrisolar e separar a ganga. Antes que o mundo de Deus possa vir a ser, o mundo dos homens deve acabar (72).


Salvação e Escatologia

«O dia do Senhor é dia de trevas e não de luz» (73). O «dia do Senhor» é aqui um conceito escatológico. Deriva, aparentemente, da associação de duas idéias: a de um dia de vitória na batalha (em que o poder de um deus era demonstrado) e a de um grande dia ou festival litúrgico (em que o poder do deus era celebrado) (74). Ambas eram ocasiões críticas na experiência comum do povo. A expectação popular, que Amós rejeitou, era evidentemente a de um dia, que se aproximava, em que os inimigos de Israel seriam derrotados e garantida a paz e prosperidade dele. Essa vitória manifestaria o poder de Javé, como este já se manifestara na vitória sôbre as fôrças do caos primordial que precedeu sua criação beneficente. Isso era um elemento importante na mitologia de Israel, celebrado anualmente, com toda probabilidade no «Dia» do festival do Ano Novo (75).

Não há suficiente evidência para demonstrar se, na expectação popular, o «Dia» estava próximo. Os profetas proclamaram, certamente, sua iminência, após terem revisado seu significado. Sentiram que Javé devia manifestar-se logo, porque a situação moral e religiosa o exigia, e aflições inesperadas davam aviso da aproximação da catástrofe final. Javé estava para manifestar-se, pela ação em seu caráter inconfundível. Israel seria levado a defrontar-se com a terrível realidade de sua justiça e, aí, sua condição pecaminosa, e não seus privilégios passados, determinaria as conseqüências. No mínimo, seria castigado e sua impureza expurgada, como por fogo de ourives (76). Mas a vinda de Javé significava a presença de sua misericórdia tanto quanto de sua justiça;- ela apuraria toda certeza, o bem, como haveria de apurar o mal: «Naquele dia o Senhor dos Exércitos será a coroa de glória e o formoso diadema para os restantes de seu povo; será o espírito de justiça para o que se assenta a julgar, e fortaleza para os que fazem recuar o assalto contra as portas» (Is 28.5, 6). Será um dia de salvação bem como de perplexidade, de misericór-

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dia pronta a triunfar do juizo: «Naquele dia eu... lhe falarei ao coração» (77).

Deve-se reconhecer que em certos profetas, por exemplo, Amós e Sofonias, há pouca sugestão de misericórdia, talvez porque sentissem ser necessário o mais violento tipo de contraste com a expectação popular. Mas mesmo em Amós aparece a sugestão de que a destruição toda podia ser ainda conjurada pela completa reorientação da vida da comunidade; embora isso seja, aparentemente, mais uma concessão lógica do que uma esperança. Sofonias também admite a possibilidade, mas só como possibilidade, de que os indivíduos fiéis pudessem escapar (78). Em Isaías, isso se torna a bem conhecida doutrina do Remanescente, a medula espiritual da nação, que tinha aos olhos de Javé um «valor de sobrevivência». Sua característica principal é a fidelidade e a espera paciente, que demonstram confiança inabalável. Somente nessas condições podem os homens juntar-se ao grupo daqueles que o desastre não pode esmagar. Em Oséias e Jeremias, a consciência da misericórdia de Deus é mais transparente, mas Oséias fala, também, de Javé afastar-se até que Israel se arrependa e Jeremias fala do castigo inevitável (79). Mas «o povo que se livrou da espada, logrou graça no deserto porque com amor eterno eu te amei». «Porque há recompensa para as tuas obras, pois os teus filhos voltarão da terra do inimigo». Pois a restauradora misericórdia de Javé estará presente mesmo em seu juizo; quando o orgulho da nação for quebrado, sua ira se desvanecerá, e seu amor será como o orvalho refrescante (80).

Na profecia anônima e escrita, do período pós-exílico posterior, acrescentada aos nossos livros proféticos, o tema de uma salvação nacional escatológica é muito desenvolvido e enfatizado. Usualmente, tais passagens podem ser identificadas por suas palavras iniciais (quando predizem bênção abundante em vez de castigo), por exemplo, «naquele dia», «eis que vêm dias», «depois» (literalmente, «no fim dos dias»), (81). A realização do propósito histórico de Javé exigirá a restauração da existência nacional numa vida de paz e segurança, sob um rei davídico, que será o elo de continuidade real com o antigo Israel. A própria face da na-

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tureza será transfigurada pela presença de Javé, que faz novas todas as coisas.

É provável, porém, ser do próprio Jeremias a famosa passagem a respeito do estabelecimento de um novo pacto (e em Jr 31.31, com estas palavras: «Eis aí vêm dias»); pois a substância da expectação ali concorda mais precisamente com seu ensino do que com o dos escatólogos posteriores. O pacto, cujo fracasso ele lamentara, será substituído por um pacto novo, porque feito com um povo renovado no coração e na mente. Deus será conhecido diretamente, como Jeremias o conhecia. Ele escreverá nos corações dos homens a lei que esses corações tinham recusado, quando lhes fôra imposta de fora para dentro. Seu perdão removerá, para sempre, o efeito do pecado que separara o homem do homem e o homem de Deus: «Todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles». Eis a consumação da salvação.



NOTAS E CITAÇÕES BÍBLICAS

CAPITULO VI

(1) Cf. as páginas iniciais de Moffatt: «The Theology of the Gospels».
(2) Am 9.7; Os 2.15; 8.2, 13, 14; Jr 2.6ss; cf. II Rs 5.17, 18. Cf. Êx 34.6ss; Jr 4.2.
(4) Os 4.6; 11.1ss; 2.2, 16.
(5) Am 1.2; I Rs 19.8, 9; Jr 29.7; Am 1.2ss.
(6) 43.10; 45.5, 6; cf. Jr 16.19, 20.
(7) I Rs 18.21.
(8) Am 7.15; Is 6; Jr 1.4ss.
(9) Am 5.21-24; Is 1.11-15; Jr 7.21ss; Is 2.6-21.
(10) Os 14.3; Is 1.9; Jr. 16.5ss.
(11) Is 1.2, 3; Os 2.2ss; 11.1-4, 8, 9.
(12) Am 7.1ss; Os 11.8, 9.
(13) Am 3.7; Is 5.12, 19; 28.1; Sf 1.12; 3.5.
(14) Am 5.4-7, 14, 15; 9.7, 8; Os 7.11-13; Is 5.16; 10.12ss.
(15) Is 6; Jr 1.4ss; Am 2.9, 10; 3.1, 2; Os 6.7; 8.1; 12-9, 13; Is 28.14ss. Mq 6.1-5; Jr 2.6, 7; 11.3-5.
(16) Jr 23.23, 24.
(17) Is 6.1.
(18) Os 11.9.
(19) Is 5.16. Tradução do autor.
(20) Is 2.10.ss; 6.3; Mq 1.25s; Jr 27.5.
(21) Is 1.26; 17.10; 28.5, 6; Os 13-4, 9; Sf 3.5; Jr 38.16.
(22) Os 2.8.
(23) Os 11.9; Is 31.3.
(24) Cf. Pedersen: «Israel», 1-111, pp 176-179.
(25) Cf. Wheeler Robinson: «Religious Ideas of the Old Testament», pp 9155.
(26) Is 1.19.
(27) Jr 11.20.
(28) Cf. Is 10. 7, 12.
(29) Cf. Pedersen, op. cit., pp 128-133.
(30) Am 3.10; 5.4, 14; Is 5.20; Os 4.1; Jr 9.23, 24.
(31) Is 6.10; Sf 1.12.
(32) Cf. Pedersen, op. cit., pp 54-57.
(33) Is 1.8; 2.1ss; 6.5; Mq 1.8ss; Jr 31.15ss
(34) Am 5. 1; 6.1-6; 8.4ss; Os 2.5; 7.3-7; Is 2.6ss; 10.13, 14.
(35) Is 3.1-7; 31.1; Mq 3.1; Am 6.1.
(36) Am 5.11; Os 3.4; Mq 3.9-12; Is 5.13, 14.
(37) Jr 2.28.
(38) Is 30-1ss, 12-15; Am 2.9-12; 4.6-12.
(39) Jr 23.16; cap. 28; 20.7. Jr 20.9.
(40) Jr 28.6ss; Mq 3.8; Am. 7.10ss; Jr 20.9.
(41) Is 7.14; Jr 1.11-14.
(42) Mq 3.11; Os 8.12; Jr 2.8; 18.18.
(43) Am 2.9, 10; 3.1; 5.25; Os 9.10; 11.1; 12.13; Jr 2.2, 3; 7.21-26; 11.7, 8, 10; 34.13.
(44) Os 8.2; 4.6; Jr 26.16-19; 7.9, 10.
(45) Êx 20.3-17; Dt 5.7-21; 27.15-26; Lv 19.3-18; Êx 34.14-26.
(46) Cf. Jr 7.2, 9, 10 com SI 15 e 24.
(47) Am 2.11, 12; Os 6.5; 12.10; Is 30.9, 10; Jr 7.25; 26.5.
(48) Cf. cap. III, p 51.
(49) Ml 2.4-7; Is 28.5-8.
(50) Por ex., Am 5.14, 15.
(51) Exemplos claros disso temos em II Rs 22.10, 11; Jr 28.10, 11. Uso semelhante de simbolismo profético, para encarnar uma Palavra de Javé, foi feito por Jeremias, na, mesma passagem, e por Isaías, em 20.2-4.
(52) Mq 6.8.
(53) Como em Jr 31.33, 34.
(54) Citado de N. W. Porteous, em «Record and Revelation», (ed. por Robinson), p 238.
(55) Eichrodt: «Theologie des Alten Testaments», vól. 1, p 195
(55a) Lc 3.8c.
(56) Ver nota 47, acima.
(57) Am 9. 7.
(58) Is 1.27; 6.13; 7.3; 8.15. Sôbre o «Novo Pacto» de Jeremias, ver o parágrafo final deste capítulo. I Sm 26.19. Por outro lado, «um ato podia ser universalmente
como vício ou crime; não se concluía, por isso, que era pecado». Oesterley & Robinson: «Hebrew Religion», p 166.
(60) Jr 17.1; Mq 3.8.
(61) Cf. Mq 2.1, 2.
(62) Is 1.10-15; Am 4.4, 5; 5.21-24; Os 5.13; 6.1-4; Jr 3.10.
(63) Jr 12.4; 2.12, 13.
(64) Is 1.3.
(65) Jr 2.11.
(66) Is 5.20; Am 6.12.
(67) Jr 5.30, 31; Os 7.9; Is 1.5; 3.8, 12; Jr 8.22; 10.20.
(68) Jr 9.7; Os 5.12.
(69) Is 30.16; Am. 5.26, 27; Is 3.24; Os 8.7.
(70) Os 13.8; Is 1.15; Jr 7.16.
(71) Is 2.19; Am 2.16; Sf 1.15-18.
(72) Am 3.9; Is 1.2; 6.9, 10; 1.21-26.
(73) Am 5.18.
(74) Êx 14.30; Js 10.12, 14; Jr 46.10; SI 81.13; 118.24; Os 9.5.
(75) Cf. Sellin: «Israelitisch-Jüdische Religionsgeschichte», pp 65, 66; Smith : «The Prophets and Their Times», ed. rev. por Irwin, pp 66ss.
(76) Com Am 5.8, 20 comparar Am 2.16; 3.14; 8.9; Is 2.11ss; Os 5.9; Mq 2.4; Sf 1.7-18; Jr 30.7.
(77) Is 28.5, 6; Os 2.14.
(78) Am 5.15; Sf 2.3.
(79) Ver nota 58, acima, e cf. Os 5.6; Jr 29.17ss.
(80) Jr 31.2, 3, 16; Os 14.4, 5.
(81) Por ex., Am 9.11, 13; Is 11.10; 12.1ss; Jr 2.28ss, etc.

Fim da terceira parte de «Profetas de Israel: Comunais, Acratas e Anticlericais».


Primeira parte: http://www.oocities.org/projetoperiferia5/profetas1.htm
Segunda parte: http://www.oocities.org/projetoperiferia5/profetas2.htm
Terceira parte: http://www.oocities.org/projetoperiferia5/profetas3.htm
Quarta parte: http://www.oocities.org/projetoperiferia5/profetas4.htm
Quinta parte: http://www.oocities.org/projetoperiferia5/profetas5.htm


 

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