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ATUALIDADES

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O FRACASSO POLITICO DA OLP E AS ORIGENS DO HAMAS

Por Jean Sahoul

Artigo em três partes publicado no World Socialist Web Site

3a. parte - 08/07/02

O medo de que o movimento revolucionário das massas pudesse ficar fora de controle, fez Yasser Arafat e a OLP aceitarem formalmente, em dezembro de 1988, o estado de Israel e rejeitarem a luta armada.

Este anúncio deu partida a um processo de negociação prolongado para a solução do conflito israelo-palestino, que culminou nos Acordos de Oslo, em setembro e 1992, como a primeira etapa em direção à criação de um estado palestino independente. Este estado daria condições a que a burguesia palestina, que tinha acumulado consideráveis recursos no exílio, expandisse sua fortuna através da exploração do trabalho assalariado, garantido pelo aparelho de estado. Da perspectiva do imperialismo americano e do estado sionista, os capitalistas palestinos, através da OLP, deveriam vigiar a classe trabalhadora e garantir a segurança de Israel.

Daí resultou que, depois de dezembro de 1988, o Hamas enfrentou abertamente a OLP para decidir quem deveria dominar o processo político. O Hamas se voltou para ações terroristas contra o exército israelense e alvos civis, como forma de reforçar sua posição entre as massas. Em maio de 1989, as autoridades israelenses prenderam centenas de militantes do Hamas, inclusive Yasin, por seu envolvimento com o terrorismo. Cerca de dois anos depois do início do levante e um ano após Israel ter banido os comitês da OLP/UNLO, Israel finalmente declarou o movimento ilegal.

Por esta época, o Hamas tinha se tornado o principal partido de oposição. Quando a OLP, em outubro de 1991, concordou em participar das conversações patrocinadas pelos Estados Unidos, em Madri, para a criação de um estado palestino juntamente com Israel, o Hamas convocou "um retorno total à opção militar" e exigiu 50% da representação de todos os órgãos da OLP. Isto foi rejeitado em meio a acusações de que o Hamas era um brinquedo de Israel e dos Estados Unidos e que queria substituir a OLP na liderança do movimento palestino.

A cada etapa, o Hamas procurava minar as negociações com ataques terroristas contra alvos israelenses. Nada ilustra isto mais claramente do que o envio de seus quadros jovens, com bombas amarradas aos corpos, para explodir os alvos e a si mesmos como mártires de sua causa. Com o suposto pagamento US$30.000,00 aos familiares dos mártires, esses rapazes valiam mais mortos do que vivos.

Apesar da rejeição do Hamas ao estado de Israel, seu objetivo era menos sabotar as conversações e a solução dos dois estados do que um reduzir o passo de sua implementação. O Hamas raciocinava que quanto maior a demora maior a perda de apoio à OLP.

Em 1991, o Hamas organizou uma série de demonstrações e greves com o objetivo de minar o Fatah e a OLP. Da luta contra o estado sionista, cada vez mais a Intifada se transformava em uma luta entre grupos rivais de homens mascarados. Em julho de 1992, ela se degenerou em batalhas rápidas entre o Hamas e o Fatah nas ruas de Gaza, com um saldo de 300 mortos e 100 feridos.

A campanha de terror do Hamas contra Israel pretendia provocar a direita sionista e torpedear os planos do novo governo trabalhista a conseguir um acordo com a OLP. Na verdade, era o reflexo dos extremistas sionistas em sua ideologia e métodos. Enquanto os sionistas de direita reivindicavam toda a Palestina para o estado judeu, sem espaço para outros povos, o Hamas proclamava a necessidade de um estado islâmico sem judeus e cristãos. Ambos frequentemente mostravam sua vontade de usar o terror para alcançar estes objetivos.

Depois dos Acordos de Oslo

O Acordo de Oslo forneceu os preparativos para um estado completo: uma Autoridade Palestina eleita, cujo papel era substituir o exército israelense, garantir a segurança de Israel e enfraquecer o Hamas e outros grupos de oposição. Assim, o sucesso de Oslo dependia do grau pelo qual o Hamas e os outros grupos apoiariam a Autoridade Palestina. Se fracassasse, havia a ameaça de guerra civil entre o Fatah, dominado pela AP e qualquer outra oposição. O apoio continuado a Arafat dependia do grau de envolvimento da AP como precursora de um estado palestino e que trouxesse a paz e algum alívio à desesperada condição econômica dos palestinos. Tendo em vista que Oslo tinha trazido alguma credibilidade à OLP e recursos financeiros internacionais para sua rede administrativa e de segurança, que poderiam ser usados como uma fonte de patrocínio político, isto reduziu a margem de manobra do Hamas.

Por conseguinte, apesar de sua repetida rejeição a Oslo, a Fraternidade logo chegou a um acordo com a OLP.Os prisioneiros do Hamas e da OLP, na prisão de Gaza, assinaram um acordo banindo a violência como um meio de resolver suas diferenças políticas. Quando a OLP concordou em não conceder anistia aos colaboradores sionistas em troca de palestinos feitos prisioneiros por Israel, o Hamas não interveio. Mais tarde, na busca por uma conciliação com o Fatah, o Hamas concordou em acabar com as "campanhas difamatórias" e as convocações de greves em dias diferentes "para aliviar o peso econômico sobre nosso povo".

Publicamente, o Hamas também formou um bloco com 10 grupos de esquerda, uma coalizão com sede em Damasco, que incluia a FPLP e FDLP, que tinham rejeitado Oslo e a solução dos dois estados. O acordo amarrou o Hamas a nada. Mais importante,ao fazer o acordo com seus arqui-inimigos das facções de esquerda da OLP, o Hamas reforçou suas credenciais anti-imperialistas. Em troca, os Irmãos se comprometiam com o acordo da coalizão de Damasco quando lhes fosse conveniente. O Hamas se recusou a tomar parte das eleições nacionais para as instituições da AP, mas participou das eleições locais "porque", como supostamente teria dito Yasin, "queria exercer influëncia no cotidiano dos palestinos nos Territórios Ocupados". Em outras palavras, agiria como uma oposição leal até que estivesse pronto para atacar por conta própria.

Que o Hamas estivesse preparado para aceitar os princípios de Oslo, como uma medida de poder político, está evidenciado no fato de que ele se encontrou com o comandante das Forças de Defesa Israelenses para discutir o pacto. O trabalhista Shimon Peres, então secretário de Assuntos Estrangeiros, chegou a ventilar a idéia de que Israel libertaria os prisioneiros do Hamas se houvesse uma renúncia explícita ao terror. Sua posição em relação a força policial de 10.000 homens da AP, cuja função era refrear toda a oposição política, era "Nós receberemos as forças de segurança palestinas como irmãos".

A AP acabou com o Hamas quando ele iniciou três ataques separados, que mataram 25 israelenses e feriu 50, em apoio à exigência da libertação de prisioneiros, inclusive Shaikh Yasin, preso por Israel, e para que a AP parasse de fornecer informações sobre os militantes islâmicos às autoridades israelenses. Mais tarde, em 1994, a polícia da AP prendeu mais de 300 ativistas do Hamas, após o sequestro e morte de um soldado israelense. Nos dois anos seguintes, o Hamas perdeu apoio, enquanto a crença de que Oslo produziria resultados ia por água abaixo.

Em alguns anos, ficou patente que as negociações de paz não haviam produzido quaisquer benefícios tangíveis. As terríveis condições sociais da maiora dos palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza iam de mal a pior, enquanto Israel continuava sua ocupação de terra, supostamente proibida pelos acordos de Oslo, e intensificava o controle sobre a economia palestina. Sob constante pressão de Washington e Jerusalém, a OLP, dominada pela AP, foi forçada a acabar com o Hamas e outros grupos de oposição. Muitos chegaram a ver a AP como uma instituição corrupta e antidemocrática e que não passava de um fantoche de Israel, que beneficiava uma estreita camada de funcionários e empresários. Para todos os efeitos, as autoridades israelenses mantiveram o controle total sobre as chamadas áreas autônomas.

O Hamas se beneficiou não só da incapacidade da OLP de superar a opressão nacional dos palestinos mas, também, da inabilidade da AP para resolver as mais prementes questões sociais. Até as instituições sociais eram, em grande parte, fornecidas pelo Hamas, uma cortesia dos reinos árabes. O Hamas, assim, tornou-se mais agressivo em sua oposição à OLP e aumentou suas atividades contra Israel.

Na primavera de 1996, depois do assassinato do primeiro-ministro Yitzhak Rabin por sionistas de direita que se opunham a qualquer acordo com os palestinos, e um antes das eleições em Israel, o Hamas iniciou uma onda de ataques que matou 60 israelenses e feriu centenas. O objetivo era trazer o Likud ao poder e, assim, acabar com o processo de Oslo. Até aquele momento, o objetivo tinha sido provocar a direita israelense na crença de que uma inevitável e brutal retaliação levaria os palestinos a desertarem da OLP e abraçarem a perspectiva do Hamas. Como o jornalista do Ha'aretz, Danny Rubinstein, escreveu depois de Oslo, "As atividades terroristas do Hamas contêm duas mensagens políticas principais. A primeira é - para Arafat e a OLP - não ousem nos ignorar; a segunda - para o estado de Israel - que as negociações com a OLP não representam a palavra final e que o Hamas também precisa ser levado em conta." Na verdade, o próprio Yasin fez declarações onde ele demonstrava a vontade da Fraternidade em negociar com Israel a respeito do estado palestino.

Na medida em que o processo de Oslo ofereceu a perspectiva de alguns benefícios, a AP foi capaz de refrear o Hamas e outros grupos de militantes. O colapso de Camp David, em julho de 2000, mostrou a inabilidade de Arafat em conseguir tirar alguma coisa de Israel que pudesse ser oferecido a seu povo. Isto ele não conseguiu fazer. O fracasso do processo de paz significou, em troca, que as instituições políticas e os mecanismos criados depois de Oslo não sobreviveriam. A frustração reprimida dos palestinos finalmente explodiu em setembro de 2000, na provacadora visita aos locais sagrados dos muçulmanos na Cidade Velha de Jerusalém. Porém, o levante que se seguiu foi muito mais contra a AP do que propriamente contra Israel.

Pesquisas recentes sugerem que mais da metade dos palestinos consideram os ataques suicidas uma resposta adequada a Israel e que o Hamas teria 25% dos votos em qualquer eleição futura onde apresentasse candidatos.

A classe trabalhadora precisa de uma alternativa progressista ao nacionalismo

O aspecto mais impressionante da crise atual entre Israel e palestinos e em todo Oriente Médio onde existem tendências semelhantes, é a falta de uma verdadeira alternativa revolucionária para a classe trabalhadora, seja árabe ou israelense.

Sob tais condições, a raiva e frustração dos jovens e trabalhadores palestinos podem não encontrar um espaço progressista de luta. Os elementos mais reacionários e racistas do sionismo, por sua vez, exploram o desespero e ansiedade dos israelenses diante dos ataques suicidas para exigir medidas cada vez mais opressivas contra os palestinos, inclusive Bantustões cercados, que lembram a era do apartheid da África do Sul e as "transferências" da população, um eufemismo para limpeza étnica.

Numa análise final, o fenômeno dos grupos islâmicos políticos como o Hamas, e a sua contrapartida sionista, é o preço que a classe trabalhadora pagou por sua subordinação às várias organizações burguesas nacionais, ainda que radicais, que foram organicamente incapazes de liderar qualquer luta independente contra o imperialismo e criar um caminho progressista e democrárico. A libertação do povo palestino da opressão imperialista não pode ser realizada só pelos palestinos. O nacionalismo, seja secular ou religioso, serve apenas para dividir a classe trabalhadora das forças mais aptas a ajudá-las, seus irmãos e irmãs estrangeiros, e subordiná-la aos interesses do capitalismo.

Enquanto a elite política israelense continuar a encurralar a classe trabalhadora na defesa da "pátria judaica", e grupos reacionários como o Hamas canalizarem a luta independente da classe trabalhadora palestina para a via cega de um estado islâmico, este conflito assumirá cada vez mais formas trágicas e selvagens. O conflito está enraizado há quase um século de intrigas dos sucessivos poderes imperialistas para dividir e explorar a classe trabalhador em uma das mais importantes regiões do mundo, do ponto de vista estratégico. No fundo, a tragédia exposta hoje neste conflito representa o amargo legado de uma perspectiva nacionalista e uma confusão ideológica e uma desorientação política que impede a classe trabalhadora de adotar uma alternativa à exploração praticada por sua própria elite governante e pelo imperialismo.

A resposta está na luta para unificar os trabalhadores árabes e israelenses em uma luta combinada para defender seus interesses comuns contra a exploração capitalista e a opressão imperialista e criar os Estados Socialistas Unidos do Oriente Médio. Tal solução exige a construção de uma nova liderança revolucionária baseada no programa do internacionalismo socialista.

Fim

Ler Parte 1 (05/07/2002)

Ler Parte 2 (06/07/2002)

BIBLIOGRAFIA

Ziad Abu-Amr, Islamic Fundamentalism in the West Bank and Gaza: Muslim Brotherhood and Islamic Jihad, Indiana University Press, 1994.

Joel Beinin and Joe Stork, Political Islam, I.B. Tauris, London 1997.

Albert Hourani, A History of the Arab Peoples, Faber and Faber, London, 1991.

Shaul Mishal and Avraham Sela, The Palestinian Hamas: Vision, Violence and Co-existence, Columbia University Press, New York, 2000.

Ze’ev Schiff and Ehud Ya’ari, Intifada, the Palestinian Uprising

 

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