O Maia

Sou um menino. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino.E enquanto não me vem o homem a que a vida me designa todos os dias,deixo por cá umas linhas,entrelinhas,um pouco de erva daninha, de coisas que o tempo calcina,e os pensamentos alucina.E mesmo que toda autocrítica tenha a imodéstia de um necrológio redigido pelo próprio defunto,devo fazer com que A pareça B e C seja como um D, pra que não se encontre antes do tempo o que existe por debaixo de cada cobertor...

Ária amaríssima de um instante


No princípio, o fim.
Gosto de escrever, e acabei fazendo disso um hábito, talvez uma sina.. Não ! – uma sina seria algo forte demais e quem sabe pouco adequável ao meu verdadeiro conceito. No primário e ginásio, lembro que gostava de deixar perplexas e confusas as minhas professoras, divertia-me o modo como ficavam se questionando e olhando espantadas para a folha de caderno cheia de sopa de letrinhas, sem começo nem fim, pé nem cabeça, mas que no último parágrafo, começava a dar sentido e por em ordem, tudo o que fora dito antes. E mesmo com tudo isso, e todos aqueles anos, as aventuras e desventuras, as alegrias e tristezas, nada escrevi. Um dia desses indo para o trabalho, passei a observar as coisas mais minunciosamente que o normal, cheguei a conclusão, que se todos gostássemos de ler e escrever, independente do assunto, fosse sobre sua vida, sobre seus amores, sobre seu dia-a-dia, todos teríamos em vida, quem sabe, no mínimo um Best-Seller... meros devaneios. Ainda na adolescência (não faz muito tempo...) devo ter escrito um pequeno livreto, depois de algum tempo, consegui datilografá-lo, dei para uns poucos amigos, alguns gostaram, outros nada disseram, naqueles dias, eu ainda julgava que a opinião das pessoas sobre o que eu escrevia, mesmo não sabendo elas, o contexto e o momento da escrita, era por demais importante, hoje acho que não fará diferença alguma, o que cicrano, beltrano e talvez fulano, digam do que penso, escrevo e vivo. Mas voltemos ao livreto, e seu contexto de época, o conteúdo nada mais que poesias que falavam de amor, penso que “o ser romântico”, é um tesouro que se descobre na adolescência, que se empreende na juventude, e se aplica na idade adulta, e que na velhice, recebe-se como sendo a melhor das aposentadorias, eram poesias dedicadas a corações não conquistados da forma como me convinha, como sonhava. Gostava de debruçar-me sobre livros antigos, fazer novas interpretações, buscar a palavra certa e tentar expressar o que me doía n’ alma, “ todo grande amor, só bem grande se for triste...”, e assim o era, recolhia-me aos cantos, e me agradava ter ao lado a velha e companheira melancolia daqueles dias, e de outros vindouros, ainda a tenho do meu lado, vez em quando. Para alguns “amores”, tive coragem de me declarar, e dessas declarações, nada sobrou, senão umas poucas amizades que cultivo até hoje, outros preferiram o silêncio, o esquecimento, a distância, e assim o foi. Alguns anos se passaram, já não acredito no amor, e acredite, pra entender o que acabo de dizer, seria preciso conversarmos muito, muito mesmo, não por ser tão complexo assim, basta observar, quem sabe, um caso raro perto de você. Uma prova disso??? – acho que as melhores provas que podemos oferecer sobre o que pensamos e acreditamos, somos nós mesmos, nossas lutas, vitórias, derrotas, as lições, enfim, tudo. Ainda escrevo, agora, mais compassadamente, meu último “amor” se foi faz uma primavera, mais uma lição, ou talvez uma pausa da vida, pra continuar mais tarde, quando o tempo achar que lhe bem convir. Agradar a gregos e troianos, não, satisfaço a mim mesmo, e quando há um elogio, sim, é sempre bem-vindo, elogios as vezes são força motriz. Poesias de amor ? – não mais, mais tarde talvez, embora um certo rosto tenha se tornado uma freqüência, alvos de pequenos poemas, sem rimas, sem sonhos. O amanhã é a mesma incógnita que eu tinha ontem, sobre o que escreveria hoje.
Hélio Maia