OS LIVROS


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«História de Nossas Vidas»

"Eu tenho esperança de um dia ser feliz"

Peterson do Amaral

"Eu tenho esperança de um dia viver
com os meus pais, ter um lar para morar.
Eu preciso de abraço, alquém para me conduzir
Eu preciso de carinho pois me muito sozinho
Acordo de manhã cedo com os berros do dono da loja
porque não tenho onde dormir.

Eu tenho esperança de um dia ser feliz
Poder viver como uma criança
Ter brinquedos para poder brincar
Sem ser suspeito de roubar
Ser uma criança normal, sem apanhar de policiais
Que não tem sentimentos.

Eu quero poder andar olhando pra frente
E não correr porque roubei
Eu quero ser visto como um cidadão
que sou e poucos percebem

Eu tenho esperança de um dia ser feliz
Poder viver como uma criança
Ter brinquedos para poder brincar
Sem ser suspeito de roubar
Ser uma criança norma, sem apanhar de policiais
Que não tem sentimentos."

Epílogo

...  Muito obrigado, meu Pai do Céu, por essa mudança de vida, porque a vida eu estava eu não quero pra ninguém, todo aquele sofrimento. Usar drogas, no lugar da comida que eu não tinha, usar drogas pra me aquecer do frio da noite e da calçada; usar drogas pra criar coragem para roubar dinheiro para sustentar o meu vício de sobrevivência, que era só drogas.
    Que droga de vida que era essa! É a pior fase da minha vida passada, que ficou pra trás. Deus colocou em minha vida só pessoas de bem, que trabalham muito bem em grupos, me dando muito amor, muito carinho, muitas amizades. Uma família, um grupo de meninos que estavam na mesma vida, todos se respeitam, gostando uns dos outros como irmãos. Todo mundo junto procurando ganhar o amor que não havia na rua e muito menos carinho, a não ser "o carinho da polícia".
    Só Deus pode castigar a polícia pelo que eles fizeram a todos que freqüentam a rua. É muito sofrimento.
    Hoje, minha vida é diferente. Posso dizer, com toda certeza do mundo: eu sou feliz. Sou feliz por Deus me colocar num ótimo caminho, que foi a Chácara, a melhor coisa que aconteceu na minha vida ...
 
 

Jornal O Estado do Paraná - 16/10/99
"Hisórias de Nossas Vidas"
Adélia Maria Lopes
        Danilo, Jonathan, Nei, Evandro, Tatinho, Márcio, Ozélio, Luiz, Anjinho, Rogério, Tiarles, Dunga, Gavião, Anderson formam um time com mais uma dezena de colegas escritores. Têm por passado uma vida nas ruas, por presente a assistência da Fundação Educacional Meninos e Meninas de Rua Profeta Elias, por abrigo a Chácara de Quatro Pinheiros e por futuro, a esperança. Essas crianças, de sobrenomes protegidos, desnudam sua alma no livro Histórias de Nossas Vidas, lançado em Curitiba na última quinta-feira.
        É uma obra comovente, tanto que a cantora Daniela Mercury, embaixadora da Unicef, proclama: "Que este livro seja não só o livro da denúncia, mas seja também , e principalmente, o livro da vitória da esperança sobre a tristeza". Contém a história de 42 meninos que encontraram a esperança de dias melhores na Chácara Padre Eduardo Michelis, mais conhecida por Quatro Pinheiros, por ser o nome da sede da localidade em Mandirituba-PR.
        A entidade é dirigida por Fernando Francisco de Goes, para quem cada linha do livro "deve ser lida como a declaração de um guerreiro que venceu a luta contra o dragão da maldade, da brutalidade, da indiferença, do medo, da solidão, da fome, do frio e do abandono. São sobreviventes de um mundo que não desejamos. São uma pequena amostra do mundo que queremos".
        Editada pela jornalista Teresa Urban, o livro a comoveu a cada história, como também emocionou o fotógrafo Ricardo Almeida, cujas fotos ilustram a edição. Os textos, conta a jornalista, foram selecionados entre os que as crianças vêm escrevendo desde 1994. Com a preocupação de proteger os autores menores, foram suprimidas as denúncias muito específicas sobre a violência e a corrupção policial.
        Ela percebeu que a chácara abriga "meninos de olhar ativo, pisando em território seguro". Os menores "recebem o visitante com a liberdade de crianças em sua própria casa. Nenhuma cerimônia, nenhum ritual: apenas contato entre seres humanos, livres de rótulos e classificações. O futebol, a escola, o trabalho, tudo ali flui com simplicidade".
        Injusto o país que tem crianças vivendo nas ruas. "No dia que eu saí da rua, para mim foi uma alívio, porque eu vim direto para a chácara", relata um dos meninos. É que muitos deles passaram por outras experiências, como esta: "Tinha um projeto que se chamava projeto Piá, mas não adiantava nada, era como um hotel, os piás entravam, tomavam banho e jantavam, e já saíam atrás de drogas, eles saíam e já iam direto comprar cola". Ou então esta: "A prisão era o lugar que a gente não gostava, era muito ruim, passava fome, eles demoravam para dar comida, toda hora dava briga, mas só se eles pegassem brigando eles batiam".
        O livro começa com relatos das crianças ainda em suas casas. Conta uma delas: "Eu fui pra rua porque meu padrasto me batia". Outra diz: "Meu pai chegava em casa, sentia o bafo de pinga da minha mãe e começavam a discutir. Ou então: "Eu tinha treze irmãos e morava no Parolim. Minha vida na família era ruim, meu pai chegava bêbado batia na minha mãe".
        Depois passa a descrever a vida nas ruas e seu aprendizado. Segundo um dos meninos: "Aprendi a usar drogas com meus amigos, comecei a fumar maconha e cheirar cola". Outro lembra que "roubava de manha, chegava na hora do almoço comprava marmitex e refrigerante, descansava um pouco e ia comprar cola ou esmalte, pois cola dava mais coragem para roubar". A dor do lar violento junta-se a outros sofrimentos, como se verifica nesse testemunho: "Na rua, a gente tinha muitos problemas com os policias. Quando eles pegavam a gente, batiam muito,  pegavam nosso dinheiro, o que a gente tivesse, passavam cola no nosso cabelo, pediam gorgeta. Se a gente não desse dinheiro para eles, levavam pra o módulo e batiam muito".
        Na chácara, os meninos passaram a vislumbrar um futuro. E é com esse capítulo que o livro se encerra. "Espero gostar do que vem pela frente. Meu sonho de futuro é ser um jogador de futebol ou um caminhoneiro". Outro almeja "uma vida de paz, longe das drogas. quem sabe, até ir morar com a família. Ter educação também, para que o povo veja a gente como cidadão que somos, e não como marginal". Ou: "Quando crescer eu quero montar minha própria família e cuidar dela com muito carinho, como a minha não pode cuidar de mim". Em poemas, Peterson proclama: "Eu tenho esperança de um dia ser feliz".
        A venda do livro ajudará o sonho de futuro de muitas crianças que não puderam desfrutar nem mesmo de sua infância. Os pedidos poder ser feitos poloe (041)833-1159.

«A Vida na Rua & A Rua na Vida»

        "No caso da Fundação Educacional Meninos e Meninas de Rua Profeta Elias, a interação entre diversos domínios do conhecimento se dá de fato, pois se tem a humildade de, num primeiro momento, reconhecer uma realidade a partir de suas múltiplas expressões culturais, sociais, afetivas, motivacionais. Conta-se com uma rede de apoio aos meninos nessas frentes.
        Busca-se o conhecimento a partir das necessidades e não o inverso. Não é o conhecimento descontextualizado que é imposto, revertendo em necessidades assumidas pelo educador social, mas que não são as prioritárias do grupo com o qual ele atua.
        Isso faz, por exemplo, com que se considere de fato a necessidade do trabalho com as famílias dos meninos e do não-distanciamento destes com seu vínculos primeiros, visto ser essa uma necessidade real.
        Os teatros, outro exemplo, traduzem a necessidade de criar, de reelaborar a realidade vivida pelo grupo para poder superá-la, entendê-la.
        Do que conhecemos da proposta da Fundação que se origina do Grupo de Meninos e Meninas da Comunidade Profeta Elias, vemos esses três eixos, no trabalho com crianças e adolescentes em situação de risco e de rua. A partir desses eixos, podemos entender a Fundação como promovendo nos meninos ajustamento emocional, competência social e acadêmica para a superação de suas dificuldades e criação de um sentido de vida.
        A Fundação Educacional Meninos e Meninas de Rua Profeta Elias, seja em suas ações mais preventivas desde sua fundação, seja em suas ações específicadas na Chácara Pe. Eduardo Michelis, especificamente destinada a meninos e meninas que estableceram as rua como seu espaço de moradia e sobrevivência, tem norteado sua práxis a partir de alguns princípios bem demarcados para todos os envolvidos:

    - o caráter sócio-educativo da proposta, com a finalidade de dar assistência e educação integral a meninos e meninas das classes populares, principalmente os de rua, num processo participativo e libertador que os faça agentes de sua própria promoção;
    - solidariedade e respeito para com os meninos e entre eles, ou em processo de exclusão, sem contudo assumir-se nenhuma forma de paternalismo e assistencialismo;
    - investir na formação de educadores, objetivando formar um grupo de pessoas com clareza política, que tenham interesse em se dedicar ao trabalho de rua;
    - denúncias das injustiças e violências das quais são vítimas as crianças e adolescentes exluídos socialmente, com a construção de regras a partir da participação destes no seu processo de discussão;
    - desenvolvimento de um trabalho conjunto dos educadores, objetivando, num processo participativo de discussão contínua e permanente com meninos e meninas de rua, o resgate de sua cidadania e o aprimoramento da proposta da Chácara;
    - o trabalho como princípio educativo na atividade com a terra, com os animais, em contato com a natureza, resgatando as raízes dos meninos e meninas de rua, que, na sua grande maioria, advém da população imigrante da zona rural, caracterizada pela baixa renda, subemprego ou desemprego de suas famílias, concentrando-se na periferia dos aglomerados urbanos;
    - respeito à história desses meninos e meninas de rua, bem como à sua cultura, sua religiosidade, suas formas de expressão e organização social, utilizando-as como base de discussão e autoconhecimento no processo de resgate e superação de sua opressão;
    - preservação ou restabelecimento das relações dos meninos e meninas atendidos com suas famílias de origem;
    - sensibilização dos meninos e meninas envolvidos na proposta para que, após a maioridade, venham a desenvolver a função de educadores no resgate de outros jovens com história semelhante à sua;
    - utilização de todos os recursos da Comunidade para o benefício dos meninos envolvidos na proposta (escola, clínicas de drogadição, lazer, cultura, etc.), no entendimento de que a Fundação deve mediar a inserção social dos meninos e não suprir em seu interior todas as necessidades;
    - conscientização de todos os envolvido de que a proposta é um processo de construção permanente, alimentada pela visão de cada um e pelo ideal de todos.

(pgs. 126 - 129)
 


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Mais Informações:
Fundação Educacional Meninos e Meninas de Rua Profeta Elias
CP-13018, BR 116 KM 144, CEP 83800.000, Mandirituba/Pr, Brasil


Última alteração em 09 Dez. 1999 por Frank Holzmann