Capítulo 9: Contornando as Crises

            Tsukino Usagi se encontrava, pela sexta vez, encostada na amurada do navio. O seu bom humor havia desaparecido completamente, dando lugar a uma seriedade que alarmava todos os passageiros do "Gin no Umi". Mais preocupante ainda, na opinião de Luna, era o tempo que a jovem princesa passava olhando na direção da cidade onde lutara pelos últimos três anos.
            Um suspiro escapou dos lábios da loira. Não um apaixonado ou um sonhador, como ela soltava com tanta frequência desde que conheceu Tuxedo Kamen, mas um triste e solitário.
            Silenciosamente se locomovendo pelo chão de madeira, a gata negra dirigiu-
se para os aposentos da segunda pessoa cujo comportamento realmente a preocupava. Usagi, Luna decidiu, merecia seus momentos de privacidade.
            A caminhada durou apenas alguns minutos, já que o percurso que a gata fez já fora percorrido por ela inúmeras vezes antes, e havia se tornado quase automático. Finalmente, Luna chegou a uma parede. Despreocupada, ela saltou, silenciosamente alcançando o parapeito da janela. Ela empurrou o vidro com sua cabeça, e entrou, seus olhos felinos se acostumando quase instantaneamente com a falta de luz.
            - Artemis? - ela chamou.
            - Aqui. - veio a resposta.
            Luna virou-se na direção da voz, visivelmente relaxando ao ver apenas um felino branco olhando para ela. Os olhos dele pareciam cansados, e a expressão em seu rosto deixava claro que o humor dele não havia melhorado no último dia.
            - Então, - o gato falou. - o que deseja com este cansado guardião?
            O humor era forçado, e Luna podia claramente perceber que seu companheiro estava usando-o para disfarçar seu estado emocional. Ela suspirou, e saltou na pequena cama que ficava em um dos cantos do quarto de Artemis, sentando-se com toda a dignidade de alguém que passou anos em uma corte:
            - Você não está bem, Artemis. - ela observou.
            - Não brinca. - foi a resposta.
            - Eu acho que seria beneficiente para você se conversasse com alguém. - ela continuou, ignorando o comentário do gato branco.
            Artemis piscou. Ele não via Luna em seu modo "Dama Esnobe da Corte Lunar" desde o Milênio de Prata. Ele casualmente levantou-se do seu leito improvisado no tapete do seu quarto, e caminhou para perto da cama, olhando com curiosidade para Luna:
            - Cê tá bem? - ele perguntou, sabendo que ele sempre irritava a gata negra quando falava incorretamente.
            - Eu estou ótima. - Luna respondeu, piscando. - Eu apenas achei que uma boa ouvinte ajudaria-o.
            - Ohhhh... - Artemis falou, sorrindo como o gato que comeu o canário. - Você está preocupada comigo! Por isso que tá falando com esse ar nobre!
            - Eu NÃO estou preocupada com você! - ela respondeu, se levantando.
            - Está sim! Eu te conheço! - Artemis respondeu, sorrindo vitoriosamente. - Quem diria? A nobre Luna, responsável pela família Real da Lua, preocupada com este simples diplomata!
            Luna abriu a boca para responder, mas Artemis interrompeu-a, sua voz perdendo a breve alegria que aparecera:
            - Mas por que não, não é? - ele perguntou com um suspiro, obviamente mais para si mesmo que para Luna. - Eu não sou mais um diplomata, e a sobrevivente da família Real não é mais especial que qualquer outra menina do mundo. - ele balançou sua cabeça tristemente. - Eu sou muito sensitivo, Luna. - ele confessou. - Um dos meus maiores potenciais ficava na minha intuição. Eu sei que posso confiar nela. - ele olhou para ela. - Algo aconteceu com Minako, Luna. Algo de muito ruim. Eu não sei se Ryu e os outros estão bem lá em Tóquio. - ele desviou seu olhar. - Algo está muito errado por lá.
            Luna ficou em silêncio, olhando pensativa para o gato branco na sua frente. Eles tiveram um caso no Milênio de Prata. Não terminou exatamente bem, pelo que ela lembrava. Eles tinham decidido que eram muito diferentes... Artemis era mais relaxado, de bem com a vida, enquanto ela própria era séria demais. Digna em todos meus momentos, Luna pensou com um sorriso.
            Eles haviam mudado, ela percebeu com certa surpresa. Mudado demais. Artemis aprendeu responsabilidade, tendo que guiar a primeira Senshi a acordar. Ele teve que ser um exemplo para Minako. Olhando para ele, deprimido porque sua protegida estava em perigo, ela percebeu o quanto ele mudou. O Artemis de antes não passaria mais que algumas horas pensando nos problemas da sua protegida.
            - Você mudou. - ela comentou, olhando para Artemis como se ele fosse outra pessoa.
            - Você também, Luna. - ele respondeu, olhando para ela com aquele olhar sério que ela tão raramente vira nele durante o Milênio de Prata.
            Era verdade, Luna percebeu. Usagi tinha passado para ela um pouco da sua... Felicidade. Ela não conseguiria servir, por exemplo, à rainha Serenity. Não conseguiria ficar tão séria ou manter-se tão distante dos outros com quem convivia. E ela gostava disso.
            - Mudei. - ela concordou, se deitando, e fechando seus olhos.
            Ela sentiu o colchão sob seu corpo se mover, indicando que Artemis tinha subido na cama. Mesmo assim, Luna manteve-se imóvel, decidindo que estava confortável demais para ser incomodada pela presença do outro gato.
            - Não te incomoda que nós mudamos tanto? - ela ouviu Artemis perguntar.
            - Não. - ela respondeu, sem se mexer. - Eu prefiro o que sou hoje.
            - E eu?
            - Você também. - ela assegurou-o. - Está mais responsável.
            - Acho que estou. - a voz dele estava mais próxima. - Você, por outro lado, está menos.
            Luna riu, ainda de olhos fechados:
            - Estou, não estou?
            - Está. - a voz dele estava vindo de bem próximo da orelha direita de Luna, e ela podia sentir a respiração dele.
            - Artemis... - ela começou, mas ele silenciou-a quando mordeu levemente o pescoço dela, acariciando-a com seu focinho.
            - Shhh.
            - Não vai dar certo. - ela falou lentamente, lutando para não ronronar.
            - Vai sim. - ele retrucou, parando de mordê-la por um momento.
            - Não deu antes.
            - Nós mudamos. - ele respondeu. - Eu sou mais responsável, e você, menos.
            Luna apenas ronronou, ainda imóvel.
            - Não temos nada a perder. - Artemis insistiu, tentando convencê-la a reagir.
            - Nós vamos acabar machucados. - Luna tentou, não colocando muita vontade no seu argumento.
            - Sem dor, não há vida. - Artemis respondeu.
            Luna não respondeu. Artemis considerou isso como uma resposta positiva, e abaixou mais sua cabeça, acariciando a parte debaixo do pescoço de Luna. Ela soltou uma exclamação, e abriu os olhos, rolando até ficar de barriga para cima, e olhando para o gato branco, um pouco hesitante.
            Artemis deu um meio sorriso para ela, e falou, seus olhos azuis praticamente brilhando:
            - Confie em mim, eu sei o que estou fazendo.

            ****

            - Usagi? - Rei chamou, seus olhos fixos nas costas da princesa. - É melhor você entrar. Está esfriando.
            Usagi não deu sinal de ter ouvido.
            Rei suspirou, cruzando seus braços. Ela era a única das Inner Senshi que ainda mantinha um relativo bom humor. Makoto ainda estava deprimida com a morte de Maury, e Ami estava passando grande parte do seu tempo trabalhando com sua mãe como médica para os passageiros do "Gin no Umi". E, em suas horas vagas, ela tinha começado a trabalhar em teorias para entender o funcionamento do portal de Dark Angel. Rei, por sua vez, passava a maior parte do seu tempo praticando com seu avô, Chris e Ranko.
            - Usagi, eu sei que você me ouviu. - ela falou, caminhando na direção da princesa.
            - Eu estou com um mau pressentimento, Rei-chan. - ela respondeu. - Mamo-
chan não está bem. Eu sei disso. Eles não deram notícia alguma desde que deixamos Tóquio...
            - Besteira. - Rei interrompeu-a. - Eles não têm como dar alguma notícia, e Mamoru-san sabe se cuidar. Além disso, você provavelmente ia sentir se algo acontecesse com ele.
            Usagi se virou para ela, fixando-a com seus olhos azuis:
            - Será? Eu não senti nada de errado quando Galaxia matou ele.
            - Aquilo foi um caso à parte, Usagi. - Rei falou, não acreditando, nem por um momento, nas palavras que falava. - E ele nunca ia se deixar derrotar. Ele ia lutar com unhas e dentes pra voltar pra você.
            Ainda um pouco incerta, Usagi fez que sim. Rei suspirou, e pegou a princesa pela mão, arrastando-a para longe do parapeito:
            - Sabe o que eu acho, Usagi? Que você precisa de um bom jantar, depois de um longo banho. - ela fez uma careta, olhando para o cabelo da loira. - E que você precisa lavar o seu cabelo.
            Usagi piscou, e pegou uma das suas tranças, examinando-a:
            - Meu cabelo não está sujo!
            - Só se ele for castanho naturalmente.
            - WAH! - Usagi chorou, arrancando sua mão da de Rei, e colocando seus punhos fechados contra seu peito. - Você está sendo chata comigo, Rei-chan!
            - Eu estou sendo sincera, sua idiota! - Rei retrucou, colocando suas mãos na cintura.
            Usagi apenas mostrou a língua. Rei quase sorriu antes de fazer o mesmo. As duas ficaram daquele jeito por um longo tempo.

            ****

            Ami suspirou, encostando-se na cadeira onde sentava e tirando seus óculos. Sua mão direita esfregou seus olhos por um momento, e a jovem Senshi forçou-se a relaxar. Ela não estava acostumada a trabalhar tanto. Muitas pessoas confundiam estudar com pesquisar e desenvolver, e Ami iria corrigir com palavras muito pouco educadas o próximo a cometer tal erro.
            Ela passara os últimos dois dias estudando os poucos dados que ela tinha dos portais que os youmas de Dark Angel usavam para aparecer em Tóquio. Duas vezes, ela teve que recomeçar todo seu trabalho por ter criado teorias enganadas no começo de suas pesquisas.
            Ela acabara de achar mais um erro fundamental, e teria que recomeçar pela terceira vez.
            Frustração dominou-a por um instante, e Ami largou os óculos na mesa com menos delicadeza que o recomendado para se manipular um objeto cujas lentes poderiam ser riscadas. Em seguida, a Senshi se levantou da cadeira, e caminhou até o banheiro do seu quarto.
            A água da pia estava gelada, o que ajudou Ami a relaxar um pouco. Ela sempre gostou de frio.
            Pouco depois, ela deixou o banheiro, e lançou um olhar na direção da sua mesa. O laptop de Chris, que era o computador onde ela estivera trabalhando, não fornecia uma visão atraente. Especialmente com a pilha de papéis amassados que repousava ao seu lado.
            Com mais um suspiro, ela desligou o computador e deixou seu quarto, disposta a permitir-se um intervalo de pelo menos uma hora. Depois de quase quarenta horas de trabalho seguido, ela julgava-se realmente merecedora de uma folga.
            Caminhando em direção à cozinha, ela desejou, não pela primeira vez, que alguém estivesse lá para ajudá-la. Michiru era inteligente, mas ela simplesmente não tinha o conhecimento profundo nas partes mais obscuras das ciências que Ami, Kazeno Ken ou Mizuno Ken possuiam. Ou Genkage.
            Sem completa consciência do que fazia, Ami abriu a geladeira e começou a montar um sanduíche, seus pensamentos longe de suas ações. Ela lembrava de tempos mais simples.
            - AMI. - uma voz chamou de trás dela.
            Ami virou-se bruscamente, quase derrubando sua comida no processo.
            - Você tá trabalhando demais, Ami-chan. - Ranko falou, cuidadosamente examinando a Senshi de Mercúrio. - Eu te chamei três vezes e você nem notou!
            - Gomen. - Ami falou, mais por reflexo que por remorso.
            - Sem problemas. - a Dragon Kishi respondeu, voltando sua atenção para dentro da geladeira. - Ei, aquilo é uma torta de limão?
            Ami fez que sim:
            - Mako-chan está cuidando das refeições. - ela explicou. - Ajuda ela a se distrair, e esquecer o... incidente.
            - Que saco, né? - Ranko falou, cortando uma fatia generosa do doce e colocando em um prato que estava segurando. - Quer dizer, eu não conhecia ele direito, mas ele parecia um cara legal.
            A Senshi de Mercúrio fez que sim, dando uma mordida no seu sanduíche.
            - Na verdade, eu não conheço ninguém por aqui. - Ranko continuou, sentando-se em um balcão próximo. - Só Ryu-san e Kitsune-san.
            - Na verdade, nenhum de nós realmente se conhecia antes de ganhar nossos poderes. - Ami comentou, sentando-se em um dos bancos. - Com exceção de Ryu-san, que já parecia ter alguma amizade com Ken-chan e Kitsune-san, e Chris-san, que é irmão de Andrea-chan e era de amigo Maury-san, todos nós nos conhecemos de verdade porque somos um grupo.
            Ranko fez que sim, obviamente interessada.
            - É só uma questão de tempo até você se sentir mais confortável perto de nós. - Ami continuou. - Eu demorei semanas até me acostumar com as outras Senshi. Com exceção de Usagi-chan.
            - Usagi?
            - Usagi-chan conquistou minha confiança quase que imediatamente após nos conhecermos. - Ami elaborou. - Ela tem esse dom.
            - Eu não notei isso. - Ranko comentou, um pouco envergonhada.
            - Usagi-chan não vem agindo normalmente nos últimos dias. As mortes de Setsuna e Maury abalaram ela. - a Senshi explicou, dando mais uma mordida no seu sanduíche. - Acho que ela finalmente está decidindo parar de lutar com seu destino, e se tornar a princesa que ela é.
            Ranko piscou:
            - Ela estava lutando contra seu destino?
            - Ela parecia fazer de tudo para não se tornar Serenity. - Ami suspirou. - Depois que ela descobriu quem realmente era, ficou ainda mais preguiçosa... Passou a comer mais, chorar mais...
            - O destino dela não é se tornar o que ela era. - Ranko falou, sua boca se curvando levemente para baixo. - Ninguém é forçado a se tornar algo.
            Ami balançou sua cabeça:
            - Usagi-chan estava destinada a voltar a ser Serenity. Nós visitamos o futuro alguns anos atrás, e vimos ela como a rainha de Tóquio.
            - Futuro?
            - Século trinta, para ser exata. - Ami informou.
            A Dragon Kishi pareceu pensativa por um momento, depois cruzou os braço:
            - Mesmo assim, não é justo forçá-la a se tornar algo que ela não é.
            - Ela é Serenity. - Ami falou, com um tom que dizia que aquilo era óbvio e simples.
            - Ela FOI Serenity. - Ranko corrigiu. - Ela é Usagi. Outra pessoa. Eu não gostaria de ser confundida com a minha encarnação anterior.
            Ami abriu a boca para responder, mas fechou-a em seguida. Ela tinha que admitir que Ranko tinha certa razão. Logo depois que Usagi descobriu ser a princesa da Lua, ela ficou a gemer que não queria ser uma princesa. Tudo que ela sempre quis foi ser uma garota normal.
            Ranko viu a reação de Ami, e sorriu para si mesma. Talvez ainda houvesse esperança para a velha Usagi.
            Então, um relógio próximo tocou. Ranko olhou brevemente para ele, e sorriu para Ami:
            - Tenho que ir Ami-chan. Fiquei de encontrar Chris às oito.
            - Já são oito da noite? - perguntou Ami, um pouco surpresa.
            Ranko piscou:
            - Não. São oito da manhã. - e saiu.
            Ami ficou parada por um momento, depois bocejou. Ela realmente precisava dormir um pouco.

            ****

            - Quantos dias mais?
            - Poucos.
            Michiru suspirou, encolhendo-se contra o corpo de Haruka. A sua amante era a única que tinha alguma idéia da localização exata do "Gin no Umi" no oceano, mas ela era propositalmente vaga.
            - Você não pode estar fazendo o caminho mais curto. - reclamou Michiru.
            Haruka desviou seus olhos do teto, e virou sua cabeça para examinar o rosto de sua companheira. Elas estavam numa posição comum. O leito que compartilhavam naquele momento não era a espaçosa cama de casal que elas tinham em Tóquio, mas o efeito era o mesmo. Elas sempre terminavam deitadas lado a lado, Haruka examinando o teto enquanto Michiru ficaria aconchegada contra o corpo da piloto.
            - Estou certa, não estou? - a Senshi dos Oceanos insistiu.
            - Está certa. - Haruka admitiu. - Eu não sei como o Canadá vai receber um grupo de imigrantes. As reações podem ser bem ruins.
            Michiru fez que sim, mexendo-se um pouco para que sua cabeça ficasse apoiada no peito de sua amante.
            - Alguma notícia deles? - Michiru perguntou, depois de um longo silêncio.
            - Nada. - Haruka respondeu, balançando a cabeça de leve. - Eles não tentaram entrar em contato conosco desde o dia que saímos do Japão, nem apareceram em qualquer dos meios de comunicação populares.
            Com um suspiro, a Senshi de Netuno fechou seus olhos.
            ****

            - <...então, adicione duas colheres de sal, lembrando-se de não parar de misturar o...>*click*<...Jonas! Como você pôde...>*click*<...ligue já! Por apenas...>*click*<...e as autoridades ainda não puderam confirmar a história dos refugiados japoneses.>
            Andrea piscou, resistindo ao impulso de mudar novamente de canal. Aquilo poderia ser importante.
            - <Estimativas dizem que por volta de um milhão de japoneses já conseguiram abrigo em outros países. Segundo eles, Tóquio foi evacuada assim que o governo transmitiu a mensagem das até então lendárias Sailor Senshi.> - o apresentador da CNN falou, aparentemente desinteressado. - <Comunicações com o Japão foram cortadas exatamente dez horas após a transmissão, e ainda não foi confirmada a existência dos tais "youmas". Segundo o relato dos sobreviventes, se tratam de criaturas com aparência diversificada, vagamente humanóide na maioria das vezes, que possuem habilidades muito acima das humanas. Kathya Simmons, psiquiatra especializada em alucinações coletivas, vai comentar. Kathya.> - ele terminou, olhando para o lado.
            Uma mulher loira apareceu na tela da televisão, apoiando-se numa mesa.
            - <Enquanto a possibilidade de se tratar de um caso colossal de alucinação em massa ainda existe, é improvável que ele fosse durar tanto quanto a situação já tem durado. As comunicações com o Japão foram cortadas duas semanas atrás, e nenhum especialista foi enviado para investigar o fato. Fotos de satélite estão sendo bloqueadas, mas é seguro assumir que essa seja uma situação temporária. Roger.>
            O primeiro apresentador apareceu novamente, com uma folha de papel em suas mãos.
            - <Há poucos instantes, o governo dos Estados Unidos da América decidiu enviar um grupo de reconhecimento para o Japão. A possibilidade da existência de monstros ainda não é reconhecida, mas essa expedição contará com o apoio do exército. Nenhum outro detalhe foi divulgado até o momento.> - uma outra apresentadora apareceu, e começou a falar sobre outro assunto. Andrea desligou a televisão.
            - Isso não é bom, é? - uma voz perguntou, vinda de trás da Kishi.
            Andrea lentamente virou-se, e balançou a cabeça:
            - Não, Hotaru-chan. Não é bom.
            Tomoe Hotaru, Senshi de Saturno, suspirou:
            - Eu não sei inglês o suficiente para entender o que eles falaram, mas não parecia bom.
            - Eles ainda não estão convencidos de que o Japão foi destruído. - Andrea respondeu, olhando para o teto. Ter que dividir a televisão com metade do navio não a incomodava tanto quanto ter que fazê-lo em uma sala tão pequena.
            Hotaru fez que sim:
            - Eu não acreditaria.
            - Nem eu.
            Um silêncio esticou-se sobre as duas garotas, sem, porém, se tornar desconfortável ou opressivo. As duas permaneceram perdidas em seus próprios pensamentos, Andrea com os olhos fixos no teto, enquanto Hotaru olhava para a televisão desligada.
            - Eu queria que ela estivesse aqui. - Hotaru subitamente falou. - Ela saberia o que fazer.
            - Huh? - perguntou Andrea, piscando.
            - Puu. Ela sempre soube o que fazer pra arrumar a situação.
            Andrea balançou sua cabeça:
            - Não adianta ficar presa ao passado, Hotaru-chan. 'E se's são o jeito mais fácil de ficar deprimida.
            - Mas...
            - Setsuna-san sabia, melhor que nós, o que ela tinha a perder.
            Hotaru fez que sim, olhando com uma expressão estranha para Andrea. A Kishi não percebeu, e continuou:
            - Nós todos tomamos uma decisão fundamental ao nos tornarmos guerreiros. Sabe, de estarmos prontos pra morrer. - Andrea mexeu os ombros de leve. - Só que o que fazemos é necessário.
            A Senshi fez que sim, com um pequeno sorriso. Andrea piscou:
            - O que foi?
            - Nada, Andrea-chan. - Hotaru falou, balançando a cabeça. - Puu estaria orgulhosa de você.
            - Huh?
            - Não se preocupe. - Hotaru falou, caminhando em direção à porta. - Tudo que deve ser, será.

                        ****

            - Atenção, passageiros. - a voz vinda dos alto-falantes chamou, arrancando Makoto de seus pensamentos. Ela ergueu os olhos do tomate que cortava, virando-
se para o aparelho. - Aqui quem fala é Ten'ou Haruka, a capitã desse navio. Quero informar-lhes que estaremos chegando na cidade de Vancouver nas próximas doze horas, aproximadamente. Sugiro que descansem e arrumem tudo que precisam arrumar, porque a burocracia vai ser pesada e cansativa. Em onze horas, queremos que todos se reúnam na sala de jantar, para que expliquemos a situação e o que esperamos da nossa chegada. Obrigada. - Haruka parou por um momento, depois acrescentou. - Todos as Senshi e Kishi, por favor compareçam à sala de jantar.
            Um 'click' sinalizou o fim da mensagem. Makoto suspirou, olhando para o tomate à sua frente com certa pena.
            - Eu posso cuidar disso, se quiser.
            Makoto olhou para trás, e encontrou os olhos amigáveis da mãe de Usagi, Ikukko. Ela sorriu com gratidão sincera:
            - Domo.
            E colocou as mãos sob a pia, deixando que a água corrente lavassem-nas, correndo em direção à porta em seguida.

            ****

            Nenhum dos heróis parecia feliz com a chegada em Vancouver. Ao se instalarem no Canadá, afinal, estariam admitindo que o Japão não mais seria seu lar. Até mesmo Chris e Andrea, os dois canadenses, haviam deixado Tóquio com o coração pesado.
            Todos os presentes, então, estavam quietos, esperando pacientemente pela chegada de Tsukino Usagi, a líder do grupo. Apesar de atrasada como sempre, nem mesmo Rei conseguia imaginar que a sua demora fosse resultado de preguiça.
            A porta finalmente se abriu, e Usagi entrou, seguida por Luna e Artemis. Rei deixou sua surpresa aparecer brevemente em suas feições quando a princesa entrou. Era óbvio que ela estava sendo a mais afetada pela situação. A exaustão física era evidente em Usagi, mas o que mais assustou a sacerdotisa foi a sensação que sua Ligação passava para ela.
            Usagi estava em conflito consigo mesma. Rei sentia Usagi e Serenity convivendo juntas, tentando se unirem, ao mesmo tempo que queriam manter-se separadas. Os olhos da loira pareciam, de alguma forma, sérios e brincalhões. Seus movimentos eram desastrados e graciosos.
            Deuses, pensou Rei, olhando fixamente para a princesa.
            - Em breve, estaremos chegando no Canadá. - Usagi falou, chamando a atenção de todos. - Haruka-san já se certificou de que seremos bem vindos, ne?
            - Un. - Haruka respondeu.
            - Então, nós temos que decidir onde vamos nos estabelecer. - Usagi falou, sentando-se. - E se vamos entrar em contato com o governo.
            Haruka abriu a boca para falar algo, mas fechou-a em seguida, suspirando. Michiru olhou brevemente para sua amante, depois falou:
            - Eu não creio que seja uma boa idéia revelar ao mundo como um todo quem somos, Usagi-san.
            - Que diferença faz? - perguntou Chris, com a cabeça deitada sobre seus braços. - Não é como se nós fôssemos diferente do resto do mundo.
            - Isso pode ser uma situação temporária. - Ranko retrucou.
            - Não sei. - Michiru falou. - Minako-chan e os outros não têm como voltar do Japão.
            Um breve silêncio desceu sobre a sala.
            - Se alguém pode escapar de lá, são eles. - Usagi falou, cruzando os braços. - E pensamentos negativos não vão ajudar em nada!
            Michiru silenciosamente fez que sim.
            - Acho que nós estamos desviando do assunto inicial. - falou Artemis, saltando para cima da mesa onde todos estavam. - Não estou certo?
            Rei suspirou, relaxando contra o encosto da cadeira onde estava sentada, e lançando um breve olhar para cima. Seria um longo fim de viagem.

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