Capítulo 6: De Volta à Luz
Usagi piscou, acordando
subitamente.
Ela olhou ao redor do seu quarto, sonolentamente se perguntando o que
poderia ter despertado-a.
O quarto de Usagi era o maior do navio, mesmo que ela tenha protestado
quando Haruka informou-lhe disso. Mesmo assim, ninguém quis que ela saísse de
lá. Na verdade, Hino Rei insistiu que ela permanecesse no maior dos aposentos.
Ela era, afinal, a princesa, e era hora de começar a agir como tal.
- Princesa. - a loira murmurou para si mesma, fazendo a palavra soar como
um insulto. Ela nunca sonhara em ser uma princesa. Não quando criança, nem
quando uma adolescente. Ela sabia que era um sonho comum, mas nunca foi seu.
Talvez, ela pensou para si mesma, com um sorriso amargo, meu inconsciente
já soubesse quem eu era.
- Usagi-chan?
A princesa sorriu para Luna, que também estava acordada. A gata sempre
parecia saber quando Usagi estava preocupada. Quando questionada sobre isso, ela
apenas sorria e dizia que era seu dever.
Usagi levantou-se da sua cama, e caminhou até a janela, aparentemente sem
notar que vestia apenas uma camisola. Ela olhou para o relógio, e constatou que
eram aproximadamente três da manhã. Haruka sempre avisava quando era
necessário ajustar os relógios, e a loira sabia que o seu estava correto.
Voltando seus olhos azuis para a janela, ela se perguntou o que era o
brilho dourado que parecia se erguer no horizonte.
- Luna? - ela chamou, curiosa. - Por que o Sol está nascendo tão cedo?
A gata saltou até o parapeito da janela, e observou por alguns segundos.
Depois, ela balançou sua cabeça:
- Não é o Sol, Usagi-chan. - ela respondeu, aparentemente preocupada. -
Você está olhando para o oeste.
Usagi piscou, e olhou brevemente para Luna, retornando seu olhar para o
horizonte em seguida. A luz estava diminuindo, como se sua fonte estivesse
secando. Pouco depois, ela desapareceu.
- O que foi aquilo? - perguntou Usagi.
- Não sei, Usagi-chan. - Luna respondeu. - Realmente, eu não sei.
****
Dark Angel apenas olhava para a
esfera que permitia-o observar os acontecimentos do universo que suas tropas
invadiram. Ele sabia que teria que se acostumar com a cena diante dos seus
olhos, uma vez que era possível que tivesse que presenciá-la inúmeras vezes.
Afinal, nada garantia que seria este o universo que traria a solução para seus
problemas.
Haviam infinitos universos, e Dark Angel sabia disso. Se seus planos
falhassem dessa vez, ele tentaria de novo. E de novo. E quantas vezes fosse
necessário para alcançar seus objetivos.
Mesmo assim, Dark Angel sabia que iriam ser anos... talvez décadas...
até ele se acostumar com o que estava vendo.
- V-chan... - ele murmurou para si mesmo, seus olhos ficando um pouco
vagos enquanto ele se lembrava da sua própria V-chan, sua irmã. A morte dela
foi um golpe duro para ele, mesmo que ninguém tivesse notado isso. Afinal,
Apocalipse ainda estava em ascensão, e Dark Angel era seu braço direito.
Aquele definitivamente não teria sido o momento para deixar-se dominar pelos
seus sentimentos.
E dessa vez, ele pensou para si próprio, não é importante manter-se
tão frio quanto antes? Não é importante continuar com sua vida como se nada
fora do normal estivesse acontecendo?
Dark Angel fez que sim para si mesmo, olhando para a esfera na sua frente.
Numa imagem mostrada na superfície cristalina do objeto, partículas de energia
douradas como ouro flutuavam em direção à Lua.
Até onde você pretende ir? Quanto você pretende fazer outras pessoas
sofrerem para realizar seus planos?
Dark Angel balançou sua cabeça, sufocando a voz num canto escuro da sua
mente. Aquelas perguntas não vinham do que ele era, mas sim, do que ele foi um
dia. Ele não podia pensar como pensara antes de... sua mudança. Era perigoso
demais, tanto para ele quanto para seu mundo.
Mesmo assim, toda vez que Dark Angel pensava na morte de sua irmã, ele se
perguntava no que ele estava se tornando. No que ele se tornara.
- Olhe para a escuridão por muito tempo, e você se tornará parte dela.
- ele murmurou para si mesmo. Quando percebeu o que dissera, ergueu-se
bruscamente da sua poltrona, e caminhou até a porta, abrindo-a com mais força
que o necessário.
Ele jogou um breve olhar na direção da esfera, e ela apagou-se,
tornando-
se novamente um mero enfeite.
Sem olhar para trás de novo, Dark Angel saiu.
****
Ship lentamente levantou-se, usando
a parede como apoio. O seu corpo não queria responder, mas ele sabia que isso
passaria assim que ele ficasse em pé por alguns minutos. Não, é claro, que
ele fosse ter tempo para isso.
O segundo a se levantar foi Ryu, que simplesmente olhou para o cristal
onde sua espada estava, e chutou-o. Rachaduras apareceram na superfície do
material, e o Dragon Kishi repetiu seu ataque. No terceiro golpe, o cristal
quebrou-se, espalhando pedaços de si por toda a cela. Calmamente, Ryu pegou sua
espada.
- Não adianta, Ryu. - Ken falou. - A lâmina... - a voz do Dragon Kishi
da Terra desapareceu quando Ryu desembainhou a espada, revelando que o metal da
lâmina não fora tocado pela descarga que libertou-os pouco antes.
- Curioso. - Ship falou. - Eu achei que a lâmina ia se desintegrar.
Ryu mexeu os ombros:
- Nunca questione boa sorte. - e tirou o que restou da sua camiseta,
amarrando-a na bainha da espada, e pendurando-a nas suas costas.
Ship fez que sim:
- É verdade.
- Então, Shippu, estou esperando uma explicação. - Ryu falou. - O que
Minako fez?
Ken piscou. A voz de Ryu estava fria, muito mais fria que o normal.
- O que ela tinha que fazer. Assim como eu. - Ship respondeu, mexendo os
ombros. - Afastem-se, por favor.
Os dois Dragon Kishi recuaram um passo, os dois tocando a parede oposta
àquela em que Ship se apoiava.
- Nós achamos nossa essência. - Shippu explicou, como se fosse
esclarecer tudo. - E a libertamos. Ou, ao menos, é o que farei. - ele suspirou,
e balançou sua cabeça tristemente. - Ryu, mantenha os Dragon Kishi erguidos.
Sempre.
Os olhos vermelhos do Dragon Kishi da Lua se estreitaram, mas ele fez que
sim. Ken apenas olhava para Shippu, sem entender.
Então, Inazumano Shippu começou a brilhar, relâmpagos percorrendo seu
corpo como cobras. Seus olhos estavam fechados, mas ele se movia como se pudesse
ver tudo ao seu redor com uma clareza incrível.
Sem mais se apoiar na parede, ele caminhou até a quina da sala, e apoiou
sua mão na parede. Como se para responder ao seu chamado, Ken ouviu um estrondo
vir do lado de fora.
Um relâmpago, ele pensou.
- Ship... Seus poderes...?
Shippu não respondeu. Ele apenas respirou fundo, provavelmente mais por
hábito que por necessidade, e ficou imóvel.
Então, a eletricidade no corpo de Shippu explodiu.
Ken e Ryu foram prensados contra a parede pelo impacto, mas a eletricidade
não tocou seus corpos.
Os olhos vermelhos de Ryu estavam arregalados e vagos, como se ele tivesse
desligado-os. Ele murmurou, tão baixo que Ken quase não ouviu:
- Shippu...
****
Akai acabara de se levantar, e
estava caminhando para onde Minako estivera, pouco antes, quando a parede
explodiu. Uma luz branca avançou sobre ela, e, por um instante, ela pensou que
era obra de Ryu.
Então, ela notou que a luz não era o Elemento puro, mas sim, um efeito
colateral da energia que estava sendo usada. Era eletricidade, numa quantidade
quase que inimaginável.
Kyoko não reagiu. Ela apenas sorriu um sorriso cansado, e deixou a
eletricidade abraçá-la.
A energia manteve-se daquele jeito por menos que um segundo, mas por um
tempo que pareceu milênios. Tanto Akai quando Kyoko estavam sozinhas, isoladas
do resto do mundo, de suas dores e sofrimentos.
Então, a energia se foi, tão subitamente quanto veio.
****
Lethe xingou a si mesma pela
segunda vez na mesma noite, se perguntando, novamente, como não prevera o que
aconteceu. Ela estava, naquele momento, observando a parede formada por
relâmpagos no fim do corredor. Felizmente para ela, a energia parou de
avançar, estabilizando-se alguns metros à sua frente.
Um sorriso amargo formou-se no rosto dela, e a Guardiã do Tempo do
universo de Dark Angel balançou a sua cabeça:
- Isso não era possível.
Kokyu, que estava ao seu lado, piscou:
- Como assim, m'lady?
- Nenhum dos futuros são assim. Eles são como Dark Angel... - ela falou,
soando surpresa. - Em dois dias, irei para o Universo Matriz. - ela falou. -
Apocalipse-sama precisa ficar sabendo disso.
O cientista youma não questionou a ex-Senshi. Ninguém fazia isso. Ela
ainda era, afinal, um dos seres mais poderosos do universo. Mesmo que o
descontrole de sua Visão tenha tornado-a menos... estável.
Lethe olhou para Kokyu, franzindo a testa. O youma transpirou,
perguntando-se se, em algum futuro, ele foi louco o suficiente para vocalizar
seus pensamentos. A mulher observou-o por mais alguns instantes, depois virou o
rosto, como se dispensando-o como algo insignificante.
Um breve surto de ódio invadiu os pensamentos do youma, mas ele logo se
controlou. De nada adiantaria derrubar a mulher agora...
- Apenas quatro restaram. - Lethe falou, subitamente. - Dos oito que
vieram, quatro restaram. - ela riu para si mesma. - Quatro. Quatro não
conseguiriam alcançá-lo. Não, não.
Tentando ser o mais discreto possível, Kokyu recuou um passo. Lethe virou
para ele, seus olhos praticamente brilhando:
- Está esperando o quê?! - ela gritou. - A energia se dissipou! Traga
todos os soldados que conseguir para cá, e tente impedir que os Dragon Kishi
escapem!
Kokyu hesitou, mas saiu correndo em seguida. Lethe olhou para o youma por
alguns instantes, sua testa franzida, depois virou-se para o corredor. As
paredes estavam apenas queimadas, mas ela sabia que isso era uma consequência
da distância do centro da explosão. Se estivessem mais próximas, teriam sido
desintegradas.
- Quem diria, quem diria? - ela se perguntou, rindo. - Os quatro pequenos
dragões descobriram um jeito de escapar... Será que fugirão como cães
assustados, ou lutarão como lobos ferozes? Quem sabe? - a risada continuava, e
Lethe teve que se apoiar contra uma das paredes para não cair no chão. - Eu
não sei! Pela primeira vez em muito tempo, eu não sei! - a risada se tornou
uma gargalhada. - Isso não é maravilhoso?!
****
Ken ficou apenas olhando para o
lugar onde Shippu estivera pouco antes, sua mente recusando-se a funcionar:
- Ship...? - ele chamou.
- Ele se foi. - Ryu falou, erguendo-se do chão. - A explosão era ele.
- Ele...?
- Se tornou seu Elemento. Ou algo assim. - Ryu respondeu. - Vamos.
Ken finalmente examinou seus arredores, seus olhos se arregalando ao
observar o que antes fora uma cela. Ele não havia sentido uma queda, mas ele e
Ryu não mais estavam no alto de uma fortaleza. Na verdade, Ken pensou, não há
outro andar acima de nós. Tudo que ele podia ver, na verdade, era terra
queimada, e a metade do castelo que ainda estava em pé. O céu estava escuro e
nublado, sem estrelas ou a Lua enfeitando-o.
Ele voltou seus olhos na direção para onde Ryu foi, e piscou. O líder
dos Dragon Kishi estava ajoelhado no chão, com Akai ao seu lado. Sem hesitar,
Ken correu para lá.
- Akai! Você...? - Ken perguntou.
- Eu estou bem. - a ruiva respondeu, ainda soluçando.
Ryu se ergueu, silenciosamente, e caminhou até onde Kyoko estava caída.
A loira estava inconsciente, mas respirando. Ele se abaixou, e ergueu-a em seus
braços. Ele inclinou sua cabeça levemente para o lado, como se ouvindo algo, e
falou, virando-se para Ken e Akai:
- Temos que sair daqui.
No exato momento em que Ryu terminou sua ordem, um urro inumano veio da
direção do castelo. Ken e Akai olharam para lá, já sabendo o que veriam.
O grupo de youmas que corria em sua direção não era grande, mas seria,
sem dúvida, o suficiente para capturar os quatro Dragon Kishi, mesmo que Kyoko
estivesse acordada.
Sem repetir o comando, Ryu começou a correr na direção oposta à dos
youmas, ouvindo os passos de Akai e Ken seguirem-no.
Um relâmpago clareou a noite por um instante, seguido, segundos depois,
por outro.
Os três finalmente alcançaram a enorme barreira cristalina que separava
o castelo do resto da cidade. A estrutura era enorme, e Ryu sabia que seria
impossível para eles passarem por ela, mesmo que estivessem descansados e sem
ferimentos.
- Ryu! - Akai exclamou, apontando para trás. Os youmas estavam se
aproximando rápido, e os alcançariam em pouco tempo.
Os olhos vermelhos do Dragon Kishi da Luz examinavam a barreira
atentamente, procurando por algo que eles pudessem usar como apoio. Ele não
encontrou nada.
- Aqui! - Ken chamou, apontando.
Ryu e Akai olharam para onde Ken apontou. Havia uma tampa metálica no
chão, bem próximo à barreira. Obviamente, os youmas não haviam destruído
tudo naquela área para erguer o castelo deles.
Sem esperar pela resposta de Ryu, Ken agarrou a tampa metálica, e ergueu-
a, sentindo seus músculos protestarem. Ele não estava fora de forma, mas
ficara dias sem exercitá-los. Com um pouco de esforço, porém, ele conseguiu
tirar a tampa da entrada, e jogou-a na grama que cercava o túnel.
Akai foi a primeira a saltar, não se incomodando com a escada que havia
numa das paredes da passagem. Ryu fez o mesmo, segurando o corpo de Kyoko de tal
forma que ela não atingisse nada durante a descida. Ken olhou para trás por um
momento, vendo que os youmas não tinham visto por onde eles escaparam. Ele
desceu as escadas, parando apenas para puxar a tampa de volta para a entrada do
pequeno túnel, rezando para que isso ganhasse o tempo que eles precisavam.
****
Rei acordou com o som de alguém
correndo pelos corredores do barco. Na verdade, o sono dela já tinha sido
perturbado por uma... onda, era o melhor nome, que nasceu em Tóquio, mas sua
Ligação, mesmo tendo percebido o surto de energia, não classificou-a como
algo... errado. Apenas mais forte. Como se uma das cores da televisão estivesse
mais forte que as outras. Claro, isso se foi tão rapidamente quanto veio. A
Senshi do Fogo nem se incomodou em levantar-se para investigar.
Resignada, a sacerdotisa se levantou, tomando cuidado para não acordar
Chris. O Kishi de Saturno representava outro problema que ela tinha. Não
exatamente um problema, na verdade, mas algo deveras irritante. Ela tinha
Reconhecido o canadense.
Oh, Ami tinha assegurado-a que o Reconhecimento apenas a impediria de se
sentir sexualmente atraída por outra pessoa, mas Rei já percebera que era um
pouco mais profundo que isso. E ela passou a ter certeza que quem quer que
tivesse teorizado o amor à primeira vista era kalyriano. Ela não conseguia
imaginar-se com outro homem. Ela sentia seu coração disparar toda vez que
estava perto dele, e não conseguia manter-se distante dele sem que uma
angústia inexplicável dominasse-a.
Resumindo, Hino Rei fora forçada por seu próprio corpo a apaixonar-se
perdidamente por Chris.
Não que ela não tivesse gostado dele antes. Longe disso, na verdade. Mas
o que antes era uma atração mútua, um relacionamento adolescente e sem
compromissos, se tornou algo tão, ou mais, forte que casamento.
Mesmo assim, Rei não podia deixar de sentir um certo alívio. Ela podia
pensar numa lista monstruosa de pessoas piores para Reconhecer. Por um breve
momento, ela se perguntou o que teria acontecido se ela tivesse
"escolhido" Mamoru, e estremeceu. Aquilo teria gerado muitos
problemas.
Ela teria que ter uma conversa séria com Ryu num futuro próximo. E com
Ami. Se alguém podia descobrir um jeito de controlar o Reconhecimento, era ela.
Rei abriu a porta do seu quarto, já tendo colocado um roupão enquanto
pensava em seus problemas, e seguiu o som de passos. Julgando pela direção em
que estava indo, quem quer que ela estivesse perseguindo estava indo para os
quartos dos "hóspedes", aqueles que as Senshi e os Kishi trouxeram
consigo do Japão. Ou para a proa.
O perseguido passou pelas portas dos quartos sem hesitar, seus passos se
tornando mais apressados. Os olhos de Rei se estreitaram, e ela começou a
correr mais ainda. Ela não conseguia pensar em motivo algum para alguém querer
ir para a proa àquela hora.
Então, alguém escolheu aquele momento para atravessar uma das
intersecções de corredores que eram tão frequentes naquele navio. Rei tentou
desviar, mas acabou acertando a outra pessoa, as duas caindo no chão.
- Rei-chan? O que você está fazendo aqui a essa hora? - perguntou Usagi,
piscando. Ela não parecia atordoada pela queda. Ela está acostumada com esse
tipo de coisa, Rei pensou com um sorriso.
- Eu podia fazer a mesma pergunta. - Rei respondeu, se levantando e
apoiando-se numa das paredes.
- Eu vim dar uma volta aqui fora... - Usagi começou, mas Rei subitamente
se lembrou que estivera perseguindo alguém.
- Kuso! Tenho que ir até a proa! - a Senshi de Marte exclamou, voltando a
correr.
Usagi observou-a por alguns segundos, depois seguiu, sem perceber que
Luna, que presenciou toda a cena, também estava correndo naquela direção.
Rei finalmente passou pela porta metálica que levava à proa, e
cautelosamente olhou ao redor, sua extendendo-se e tentando localizar a pessoa
que a Senshi perseguia. Não foi tão difícil quanto ela achou que seria.
Uma figura claramente feminina estava apoiada no parapeito de metal, seu
rosto virado para a direção de Tóquio.
Caminhando silenciosamente, Rei se aproximou dela, pronta para defender-se
de qualquer ataque. Somente quando estava a menos de cinco passos, ela
reconheceu quem era.
- Mako-chan? - Rei chamou, colocando sua mão no ombro da Senshi de
Júpiter.
Makoto virou-se para Rei, surpresa. Ela abriu a boca para falar algo, mas
não teve chance.
- Mako-chan, o que houve?!
As Senshi de Marte e de Júpiter olharam na direção da porta ao mesmo
tempo, vendo uma figura loira aproximando-se, a camisola branca que vestia
movendo-se levemente graças ao vento, seu caminhar tão suave que os pés dela
pareciam não tocar o chão.
Rei sempre achou difícil acreditar que Usagi era Serenity. Quando a loira
se transformava na sua encarnação anterior, toda sua personalidade mudava. Ela
mostrava mais coragem que todas as Senshi juntas, mais graça que era possível
encontrar em um humano. Ela sempre acreditou firmemente que Usagi era Usagi, e
Serenity era Serenity. Que elas eram duas almas num só corpo. Ver Usagi se
movendo exatamente como Serenity, a imagem perfeita da nobreza da Lua, foi um
banho de água fria para ela. O choque foi tão grande que ela quase fez uma
cortesia para a líder das Senshi, antes de lembrar que Usagi ficaria sentida se
tratada com tanta formalidade.
- Usagi... - murmurou Makoto, claramente com pensamentos similares aos da
Senshi do Fogo.
Ouvir a voz da Senshi da Eletricidade foi o suficiente para lembrar Rei do
problema imediato dela:
- Mako-chan... O que...?
Makoto suspirou, e apontou na direção de Tóquio:
- Eu senti alguma coisa. - ela explicou.
- Uma onda? - perguntou Rei, se lembrando da sua própria experiência.
- Uma onda. - concordou Makoto. - Foi... estranho. Eu senti como se
alguém tivesse passado por mim. Eu SENTI a eletricidade por um momento... Como
quando eu sou Jupiter.
Rei ficou em silêncio. A sua própria experiência não foi tão
profunda, mas ela não tinha a afinidade de Makoto com a eletricidade. E ela
certamente não sentiu nada parecido com a percepção que ela tinha quando
Mars. Quando transformada, Rei podia apontar de olhos vendados um fósforo aceso
a metros de distância. Obviamente, ela não conseguia fazer isso logo que
começou sua carreira como Senshi, mas ela já tinha uma afinidade enorme com o
fogo quando ela e as outras Senshi enfrentaram Galaxia.
- Alguém passando por você?
Rei e Makoto instintivamente assumiram guardas defensivas ao ouvirem uma
voz inesperada, mas Usagi apenas se abaixou para pegar Luna em seus braços. A
gata sorriu agradecida para a princesa, depois voltou seu olhar para Makoto:
- Acreditava-se, no Milênio de Prata, que era possível que um Elemental
poderoso o suficiente se tornasse parte do seu Elemento.
- Como assim? - perguntou Makoto, um pouco confusa. - Você quer dizer que
Akai pode ficar feita de fogo?
- Não se transformar no seu Elemento, - Luna falou, seu tom de voz um
pouco impaciente. - se tornar PARTE do seu Elemento.
As três garotas olharam para Luna, claramente não entendendo o que ela
queria dizer.
- Imagine que todo o Fogo no mundo fosse parte de um só ser. - Luna
falou. As três fizeram que sim, Usagi um pouco mais hesitante que as outras
duas. - Agora, imagine que Akai podia se tornar PARTE desse ser.
- Ela controlaria todo o fogo do mundo? - Rei perguntou, um pouco
surpresa.
- Não. - Usagi falou, olhando para a Lua. - Ela seria engolida por ele.
Makoto e Rei olharam surpresas para a princesa, mas Luna fez que sim.
- A consciência de Akai se espalharia tanto que não estaria mais lá. -
Usagi continuou. - Ela não tornaria o Fogo parte dela, mas se tornaria parte
dele.
- Então... - Rei começou.
- Ship! - Makoto exclamou, voltando-se para a cidade.
- Se o que Makoto sentiu realmente é esse fenômeno, - Luna falou,
balançando a cabeça. - é correto assumir que ele...
- Ship morreu. - Makoto falou, soando surpresa.
Rei silenciosamente amaldiçoou Dark Angel. Primeiro Setsuna, depois
Maury, e finalmente, Ship. As coisas estavam indo de mal a pior. Ela fez uma
prece sileciosa ao Kami do Fogo para que os outros conseguissem recuperar pelo
menos o Ginzuishou.
****
Ryu examinou cuidadosamente seus
arredores, tomando cuidado para se mexer o mínimo possível. Com a pequena
quantidade de luz disponível, o que mais atrairia a atenção de um possível
inimigo seria movimento. Ken fungou, depois discretamente começou a respirar
pela boca. Akai cobriu seu nariz com sua mão, tentando evitar o cheiro.
A pouca luz presente era o suficiente para identificar os arredores. As
paredes, feitas de concreto, foram cinza um dia. Manchas de marrom e verde davam
um aspecto desagradável ao ambiente, assim como a corrente de água suja que
corria entre as duas calçadas, estas feitas do mesmo material que a parede.
Tubos metálicos despejavam mais água no pequeno rio artificial, mesmo que essa
não estivesse tão suja quanto aquela onde caía. Ratos fugiam dos quatro
Dragon Kishi, temerosos por suas vidas.
Sem falar nada, Ryu começou a seguir a corrente, ainda examinando
cuidadosamente seus arredores.
Ken suspirou, e começou a segui-lo. Ele não estava particularmente feliz
por ter que usar um dos muitos túneis de esgoto de Tóquio para escapar, mas
ainda achava que isso era melhor que a outra alternativa.
Akai, que estivera examinando cuidadosamente uma mancha particularmente
estranha em uma das paredes, teve que correr um pouco para alcançar os dois,
mas logo estava caminhando no mesmo ritmo que eles. Ela também examinava os
arredores, porém com uma intensidade menor que o líder dos Dragon Kishi.
Estava claro que a ruiva tentava manter sua mente ocupada.
Eles caminharam em silêncio por quase dez minutos.
- Ryu? - Ken chamou. - Qual é o plano?
- Nós seguimos os esgotos até sair em algum lugar.
- Simples assim? - perguntou Ken.
- Simples assim.
- E o Ginzuishou? - Ken questionou.
- O Ginzuishou espera. - Ryu respondeu, virando-se para Ken. O Dragon
Kishi da Terra quase parou ao ver os olhos do seu companheiro de equipe. Se os
olhos eram as janelas para a alma, o Dragon Kishi da Luz tinha fechado as
cortinas. - Nós precisamos sobreviver antes.
Eles caminharam mais dez minutos, mantendo-se novamente em silêncio. Não
era difícil, uma vez que nenhum deles realmente tinha algo para falar. Ken
mantinha seus olhos em movimento, tentando achar algo de interessante para
observar. Não era tão difícil quanto ele achou que seria. O Dragon Kishi
apenas fixava sua atenção em um ou outro fungo em particular, e tentava
lembrar do seu nome científico e de suas principais características. Mesmo
não sendo uma atividade interessante, era o suficiente para distraí-lo.
Então, subitamente, Ryu parou.
- Nani...? - Ken começou, mas um gesto do líder dos Dragon Kishi
silenciou-o.
Involuntariamente, Ken tentou identificar o que havia chamado a atenção
de Ryu. Sons, ele percebeu, olhando para trás. Barulho de pessoas correndo na
água. Ou youmas, sua mente rapidamente adicionou.
Sem falar nada, Ryu entregou Kyoko para o Kishi do Vento, e olhou ao seu
redor, procurando por algo. Ele pareceu brevemente considerar um dos canos que
jogavam água na corrente principal, mas rapidamente desistiu, procurando outras
opções. Então, seus olhos se fixaram em algo um pouco a diante.
Ainda em silêncio, o Dragon Kishi da Lua correu alguns metros, se
ajoelhando perto de uma das paredes. Ken se aproximou, não entendendo o que Ryu
estava fazendo. Então, ele entendeu. Havia uma grade naquele lugar. A abertura
era pequena, com menos que meio metro de altura, mas parecia levar para um lugar
mais espaçoso.
Ryu olhou na direção dos passos uma vez, depois segurou a grade,
puxando. Ken podia ver a tensão nos músculos do outro garoto, mas a expressão
dele não mudou. Akai, o Kishi da Terra percebeu, também não estava parecendo
incomodada. Sua expressão não havia mudado em nada desde que eles entraram nos
esgotos.
A grade arrebentou com um som que, para os ouvidos de Ken, era alto
demais. Ryu olhou de novo na direção dos youmas, e apontou para que Ken e Akai
entrassem.
Akai enfiou as pernas no buraco e, sem hesitar, jogou o resto do corpo num
só movimento. Pelo som que sua aterrissagem produziu, ela tinha caído em pé.
Ryu silenciosamente pegou Kyoko de Ken e esperou. Entendendo sua deixa, Ken
entrou no buraco de bruços ao invés de sentado como Akai, e segurou-se na
beirada antes de saltar. A queda fora mais curta que ele esperava, e ele não
chegou a perder o equilíbrio.
- Estou mandando Kyoko. - Ryu falou, sua voz baixa. Os youmas deviam estar
próximos.
Ryu cuidadosamente passou o corpo de Kyoko pelo estreito buraco,
segurando-a pelos pulsos até sentir que Ken ou Akai estavam segurando-a de onde
eles estavam. Ele soltou a loira, e ouviu uma breve exclamação do Dragon Kishi
do Vento. Mesmo assim, não parecia que Kyoko tinha caído.
Olhando uma última vez na direção dos seus perseguidores, Ryu pegou a
grade que arrancara, e habilmente desceu pelo buraco, soltando a grade na
entrada. Não seria difícil tirá-la de lá, mas os youmas dificilmente
notariam que alguém entrou por lá com a grade cobrindo a abertura.
Finalmente, o líder dos Dragon
Kishi se deu ao luxo de examinar os arredores.
Quase não havia luz, exceto aquela gerada por algumas lâmpadas velhas
que estavam penduradas nas paredes, com uma distância considerável entre elas.
As paredes eram de concreto, mas não tão cobertas por fungos quanto as do
esgoto. Finalmente, haviam dois trilhos no chão.
- Uma pista de metrô? - perguntou Ken. - Que eu saiba, nenhuma delas
passa por aqui.
- Deve estar abandonada. - Ryu falou, olhando para a grade por onde eles
entraram. O som de passos estava mais alto, e ele podia sentir que os youmas
estavam perto.
Corpos passaram na frente da grade, bloqueando a luz que entrava por lá,
mas não pararam. O som foi ficando mais fraco, e Ryu sentia os youmas se
distanciando.
- A pista parece correr paralelamente ao esgoto. - Ken observou, olhando
para os dois lados.
Ryu fez que sim, jogando um olhar na direção de Akai. A ruiva estava
mais quieta que antes, e não estava mais observando tudo ao seu redor, tendo
fixado seu olhar em uma das paredes. Ela estava entrando em choque, e Ryu sabia
que precisava levá-la para um lugar onde ela ficasse segura por alguns dias. E
com comida, de preferência. Ele olhou para Kyoko, e mentalmente adicionou
conforto à lista de necessidades.
A Clínica Nova Akasaka ficava no caminho para o Jardim Externo de
Jingu... Fazendo que sim para si mesmo, Ryu decidiu o que eles fariam.
****
- Muito bem, Usagi-chan, quais são
os dez Elementos?
A loira suspirou, se perguntando por que aquilo estava acontecendo
justamente com ela. A Senshi sabia a resposta tão bem quanto as suas duas
professoras, mas ainda não achava justo. Mesmo assim, ela era a princesa da
Lua, e tinha dado sua palavra para Luna que ia tentar aprender alguma coisa. A
palavra de alguém de sangue nobre devia ser honrada.
- Fogo, Água, Terra, Vento, Gelo, Metal, Eletricidade, Escuridão, Som e
Luz. - ela recitou.
Luna e Ami fizeram que sim numa sincronia quase perfeita, e a gata negra
fez outra pergunta:
- Qual foi o primeiro guardião dos selenitas?
Usagi abriu a boca para responder, mas uma leve batida na porta
interrompeu-a.
Luna e Ami trocaram olhares, e se prepararam para dar uma desculpa
qualquer ao visitante, quando Usagi se levantou, aproveitando a interrupção
para descansar um pouco:
- Entre.
A porta se abriu, e Kano Reika entrou, seguida por sua filha, Midori. O
nome da garota era uma cor, assim como o de Akai, e quando Ami mencionou isso
para a mãe das duas, ela apenas apontou que 'Akai' foi para o cabelo, enquanto
'Midori' foi para os olhos.
Reika, como suas filhas, tinha olhos verdes e cabelos ruivos, mesmo que o
seu já estivesse mostrando o branco da idade. Ela nasceu numa família rica, e
foi surpreendentemente compreensiva quando Akai revelou que teria que lutar
contra monstros. Usagi respeitava muito a mulher, especialmente porque ela sabia
como era ver a própria filha arriscar sua vida.
- Kano-san. - Usagi falou, se curvando. Ela deu um pequeno sorriso quando
olhou para a outra visitante. - Midori-san.
Midori retornou o sorriso.
- Serenity-hime. - a ruiva retornou o cumprimento, se curvando ainda mais.
Usagi ficou vermelha:
- Eu agradeceria se não me chamasse assim.
Reika sorriu amigavelmente:
- Apenas se você não me chamar mais de 'Kano-san'. Isso faz eu me sentir
velha.
A loira piscou, depois fez que sim, sorrindo.
- Então, Reika-san, posso saber o motivo da visita? - perguntou Ami, se
levantando da cadeira onde estava. - Nenhum dos outros passageiros expressou
interesse em manter-se em nossa companhia.
Reika fez que sim:
- É um tanto... desconfortável... interagir com pessoas que podem nos
destruir com um olhar.
- Destruir? - perguntou Usagi, um pouco irritada. - Nós não faríamos
isso nem que tivéssemos nossos poderes.
- Eu sei disso. - Reika falou.
- Mas a maioria das pessoas não sabe. - Midori explicou. - Além disso,
todo mundo parece acreditar que vocês estão fazendo coisas que só Senshi ou
Dragon Kishi deveriam fazer. - ela parou por um momento, depois sorriu
maliciosamente. - Pelos sons que vieram do quarto de Rei ontem, eu diria que
estão certos. Ninguém pode ter uma resistência tão...
- Midori. - Reika interrompeu, tentando soar irritada. O pequeno sorriso
que apareceu nos seus lábios, porém, tornava isso impossível.
Usagi ficou vermelha:
- Então, Reika-san, por que veio para cá?
- Nós viemos... pedir que você e as outras Senshi nos explicassem o que
vocês pretendem fazer, e exatamente o que está acontecendo. - Reika falou,
olhando nos olhos de Usagi. - A explicação que Satori-san deu foi bastante
vaga.
A princesa da Lua fez que sim, franzindo a testa. Ela não tinha realmente
pensado no futuro próximo. Nem no distante, para falar a verdade. Até o
momento, ela tinha assumido que Mamoru e os outros voltariam, todos com seus
poderes, e eles poderiam voltar a proteger a Terra como antes.
Ela não tinha realmente pensado nas consequências causadas pela
destruição de Tóquio. Ou melhor, do Japão. Usagi sabia que, mesmo com seus
poderes, as Senshi demorariam meses para limpar sua terra natal dos youmas que
agora a dominavam. Talvez anos.
- Usagi-chan? - chamou Midori, notando o olhar distante da loira.
Usagi suspirou:
- Eu vou conversar com os outros. Provavelmente, falaremos algo amanhã ou
depois. Com certeza, falaremos algo antes de chegarmos ao nosso destino.
Midori e Reika fizeram que sim. A mais nova das duas Kano saiu pela porta,
mas Reika ficou um segundo a mais:
- Deve ser difícil para vocês, Usagi-chan.
- Você não imagina o quanto. - a loira respondeu, sem olhar para Reika.
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